"Desde criança amei os pássaros, as palavras e as canções. Na adolescência, comecei a cantar meus sonhos em versos. De sonhos aprisionados em poemas inventei muitos livros. Dedico-me agora a aplaudir as novas gerações." (Helena Kolody, na apresentação de livro "Os Poetas"). xxx Havia o (grande) risco de se tornar apenas uma reunião insossa e irregular de poesias de amadores de várias tendências em mais uma publicação oficial destinada a ter distribuição dirigida e cair num precoce esquecimento. Felizmente isto não deverá acontecer: "Os Poetas - Antologia de Poetas: Contemporâneos do Paraná", reunindo os 90 trabalhos selecionados para o I Concurso "Helena Kolody"(edição da Secretaria da Cultura do Paraná, 148 páginas, lançamento nesta segunda-feira, 19 horas) se constitui num volume representativo de emoções & sentimentos de homens e mulheres que acreditam no poder da palavra. A inspiração da patrona do concurso - a poeta maior do Paraná e uma das grandes deste país, digna de ser comparada a Cora Coralina ou Cecília Meirelles - parece ter iluminado os responsáveis por esta promoção literária. A jornalista e escritora Regina Benitez, dona de muitas premiações e uma obra em escalada, responsável pelo setor de editoração da Secretaria da Cultura, num trabalho em equipe com Teresa Cristina Montecelli, coordenadora de Desenho Gráfico da Seec, realizou um projeto exemplar. Uma edição sem gastos supérfluos - afinal, a época é de economia - mas com excelente acabamento, cuidados em sua distribuição harmoniosa dos textos e sobretudo uma capa inspirada trabalhada sobre a fotografia da poeta Helena em seus verdes anos - fazem de "Os poetas" um livro que pode circular nacionalmente, sem complexos de inferioridade. Dos 700 autores inscritos para o concurso, 230 foram desclassificados porque eram de outros estados - e a promoção restringe-se aos paranaenses ou aqui radicados. Sobraram 470 - cada um com três poesias, que exigiu meses de trabalho a comissão julgadora presidida pelo professor e poeta gaúcho Ronaldo Schuller e da qual fizeram parte Clóvis Ribeiro, baiano de Vitória da Conquista e Milton Santos, paulista da Capital. No final, 12 horas ininterruptas para chegar a seleção dos 30 poetas que deveriam entrar na antologia - única premiação, já que a patrona do concurso, Helena Kolody, em sua sensibilidade e generosidade, só concordou em emprestar seu nome ao evento se não houvesse valores financeiros em disputa e nem classificação graduais. "Poeta é um todo e não pode ter este tipo de classificação" diz dona Helena, que só veio a receber os primeiros direitos autorais há 4 anos, quando Roberto Gomes, pela extinta Criar Edições, lançou um de seus livros. Receber dinheiro por sua poesia chegou a assustar dona Helena, que transformou os direitos autorais em exemplares de livros para distribuí-los às mãos cheias a amigos, bibliotecas e todos que a procuram... xxx Caberá a ensaístas e críticos como João Manoel Simões e Hélio Fileno Puglielli, entre nossos Scholars literários, análises maiores aos trabalhos dos 30 poetas - mulheres e homens - selecionados. Aliás, a superioridade masculina veio mostrar que apesar da poesia ser muitas vezes, preconceituosamente, identificada a sensibilidade da mulher, no caso desta grande seleção entre os paranaenses (ou poetas de outros estados aqui radicados) que se dedicam ao gênero, ocorre o contrário. Organizador de várias antologias de poetas gaúchos, Ronaldo Schuller bateu-se no julgamento para que do livro constasse exemplos de diferentes estilos e tendências, para dar ao volume uma ampla visão da diversidade que caracteriza esta produção. Também convivem desde poetas já com livros publicados - como é o caso de Eulalia Maria Radke, 45 anos, catarinense de Gaspar mas há 12 anos em Curitiba, e Adelia Maria Woellner, 50, - como autoras inéditos, entre jovens de 18 a 25 anos. O concurso também trouxe surpresas. Por exemplo, o advogado e professor Aldo Silva Júnior, quase sexagenário, líder acadêmico nos anos 50, já avô, revela-se como poeta múltiplo, dedicando até uma ode ao monza bordô, enquanto Alzeli Basseti, 52 anos, ex-esposa do médico Reginis Brochmann, 4 filhas, e que até agora sempre mostrou-se uma feroz feminista e líder de agremiações de esquerda, mostra seu lado lírico, falando do "poeta que sofre, geme e amaldiçoa/ a pérfida e inglória arte de amar". Identificada até hoje como elegante mulher da sociedade, esposa do empresário Manoel Rosenmann, ela própria atuante executiva, Maria Cecília do Leão Rosenmann mostra nos três poemas selecionados um aperitivo de seu aguardado "Traço" (edição gráfica de Miran, ilustrações de Juarez Machado, lançamento previsto para o final do ano), cujos originais mereceram enaltecimentos de muitos expertes e até justificaram que o maior dos poetas gaúchos, Mário Quintana, concordasse em fazer uma breve análise. Com sensibilidade enxuta, valorizando as palavras - méritos que a levaram o falecido Paulo Leminski, um dos primeiros a quem Maria Cecília acorajou-se a mostrar suas poesias - lhe fazer grandes elogios, consegue um misto de (en)canto e suavidade ao falar sobre "Sexo", num texto que poderia até ser musicado. xxx Cada um dos poetas incluídos nesta antologia tem sua visão do mundo e sensibilidade. O trabalho gráfico de Teresa Cristina Montecelli com apoio de Vera Andrion, responsável, inclusive, pelo feliz logotipo, contribuíram ainda mais para valorizar este volume cuja primeira edição (mil exemplares) deverá se esgotar rapidamente. Como a segunda edição do concurso tem suas inscrições encerradas no próximo dia 14, é de se esperar que haja recursos para agilizar a edição do novo volume ainda na atual administração - já que com a futura mudança do governo, um projeto como este corre o risco, como sempre, de ser interrompido - e os originais jogados nas gavetas da incompetência burocrática. LEGENDA FOTO - Maria Cecília Rosenmann: poesia enxuta na amostragem do primeiro livro

Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:

Veiculo: Estado do Paraná

Caderno ou Suplemento: Almanaque

Coluna ou Seção: Tablóide

Página: 3

Data: 10/06/1990

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