Poesia, com marketing, Hai-Kais e sentimentos
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 17 de dezembro de 1987
Uma inovação em termos de marketing poético: Gladys Gama França, 39 anos, Fluminense de Campos, há 15 anos em Curitiba, decidiu investir alguns milhões de cruzados num comercial na televisão para promover o seu quarto livro de poemas, "Afetos Sem Retoque" (Cz$ 300,00 o exemplar, lançamento na segunda-feira, 21, no Studio Kruguer).
Já a jornalista Nadyegge Almeida, editora do caderno feminino da "Gazeta do Povo", esposa do colunista Dino Almeida, também está tendo uma grande e natural cobertura em torno de seu primeiro livro, "Asilo Provisório" (lançamento dia 22, 19 horas, galeria Documenta). Profissional das mais bem relacionadas e simpáticas, Nadyegge tem um amplo circulo de amigos, que, por certo prestigiarão a sua tarde de autógrafos.
Gladys Gama França, mulher elegante, tem um bom esquema para garantir a absorção de seu livro e, desta vez, decidiu usar a força da televisão num vídeo em que convida para o lançamento de "Afetos Sem Retoque". Seus três livros anteriores, com boa sistemática promocional, tiveram suas edições esgotadas em alguns meses.
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Já o publicitário, ex-jornalista e poeta Carlos Verçosa, 40 anos, desde 1979 residindo em Salvador, adotou um sistema bem mais econômico para editar seus mais recentes trabalhos: em formato 15 x 31 centímetros, apenas 28 páginas reuniu seus "Hai-Kai-Sashimi" (edições Espaço Bleff, Salvador). Na estrada da poesia desde 1968, dez prêmios, com vários títulos no prelo, o bom Verçosa traz neste seu "Sashimi", HaiKais que falam em sua objetividade lírica.
Na ponta vaidosa do galho
desponta uma jóia preciosa
orvalho
O hai-kai pode ser lírico e bem humorado. Sempre em três linhas:
Olho demente
Alho por alho com dor
de dente
Ou então, desta forma:
Pacífico
um mar vermelho se agita em mim
olhar atlântico
Admirável a precisão das palavras e a força lírica que Verçosa extrai em seus versos:
uma folha
troca de ramo
borboleta
passando também para as cenas do quotidiano:
no 2º andar, netos e netas
filhos no 1º andar,
bonecas no térreo
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Geologia e poesia podem ter pontos em comum? Silvio Roberto de Oliveira acha que sim. Assim, consegue com as mesma precisão científica que o faz um pesquisador de pedras penetrar no mundo lírico e trazer livros como "Terrabalada'" (Livraria Francisco Alves Editora, 139 páginas, Cz$ 300,00). Com o mesmo talento que já havia mostrado em "Modo Nordeste" e "Auixotinadas", Silvio utiliza neste seu novo livro de uma linguagem única e particular. Uma linguagem "plena de sentido plástico", produzindo imagens entre o onirismo e realidade. Assim funde, ao final do livro, a estética do texto com seus símbolos lingüísticos. Uma viagem pela ilimitada criatividade de Silvio Roberto e por sua capacidade de expressão poética.
Por tudo que lhe é caro
poeta atenta à súplica
de quem precisa um verso
pra envenenar a angústia
Campo doentio/de estranho mal
Verso vazio:
ponto final
LEGENDA FOTO: Verçosa, londrinense-baiano, com seus hai-kais.
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