Login do usuário

Aramis

Réquiem ao Paiol (adeus boa MPB!)

Confirmado: Curitiba pode ficar fora do roteiro de espetáculos de música popular brasileira. Com exceção de superstars (?) com esquemas milionários, a nossa cidade não tem condições de público para absorver produções voltadas à MPB, com uma proposta cultural e trazendo artistas de expressão - mas que, por diferentes razões, não se encontram nas paradas de sucesso. Menos de 100 espectadores tiveram a felicidade de aplaudir, no Paiol, no último fim-de-semana, um belíssimo espetáculo da melhor MPB. Numa incrível prova de boa vontade, a divisão de música popular do Instituto Nacional de Música/Fundação Nacional das Artes, escolheu Curitiba para a estréia nacional do show produzido para homenagear Wilson Batista (1913-1968), reunindo um dos contemporâneos do grande compositor, o esplêndido cantor Roberto Silva, 65 anos, 48 de carreira, 35 Lps já gravados, a cantora Joyce e dois virtuoses do violão - Maurício Carrilho e João de Aquino. Um espetáculo com roteiro e direção de Tulio Feliciano, profissional dos mais experientes, construído em blocos, enriquecido com depoimentos gravados de Aracy de Almeida, Paulinho da Viola e o psicanalista Jeremias Lucenda, mostra a trajetória musical do autor de "Seo Oscar" (entre tantos outros êxitos), através de 28 belíssimas composições. Só isto já deveria fazer com que houvesse um grande público atento e interessado, já que há muito tempo não acontecem bons espetáculos de MPB, não só no Paiol, mas em todos os auditórios de Curitiba. O resultado foi melancólico: 27 pessoas na estréia, 60 no sábado e pouco mais de 20 no domingo. Em compensação, aplausos entusiásticos, a ponto de haver pedidos de bis. Ou seja: quem foi, extasiou-se com um esplêndido espetáculo musical - tanto na parte das músicas de Wilson Batista, interpretadas com graça e malícia por Roberto Silva e Joyce como na participação especial, em magníficos números de violão, de Carrilho e Aquino, dois virtuoses maiores deste instrumento e que estão lançando um esplêndido LP independente - por sinal, candidato forte a figurar como o melhor do ano no gênero. xxx Hoje, só mesmo por maldade alguém pode recomendar algum artista que não tenha um grande patrocínio privado ou oficial a programar temporada no Paiol. A sucessão de fracassos de público naquele teatro inaugurado há quase 15 anos passados e que, durante muito tempo foi o principal núcleo cultural da cidade, faz com que Curitiba adquira, cada vez mais, a fama de "cidade pé-frio" em termos de música popular. Claro que medíocres espetáculos de sub-roqueiros tupiniquins ou diluidores da música latino-americana (como o insuportável Tarancon) ali têm levado um público específico, mas cada vez que acontece um show com instrumentistas ou cantores realmente identificados a uma proposta séria (ou renovadora) da música popular, há um total - e inexplicável - desinteresse do público. Não custa lembrar que há dois anos, na temporada de aniversário do Paiol (dezembro/84), o mais respeitado tecladista, arranjador e compositor do Rio Grande do Sul, Geraldo Flach, sofreu a maior humilhação profissional de sua vida. Veio a Curitiba e, sem ter qualquer atenção da direção da Fundação Cultural (aliás, os seus diretores raramente aparecem nos eventos que acontecem nos espaços da instituição) teve que suspender duas das três apresentações previstas. Simplesmente não havia um único espectador. Luisinho Eça, 51 anos, pianista reconhecido internacionalmente, criador do Tamba Trio, ao lado do baixista Luís Alves e do baterista Robertinho Silve, saiu de Curitiba, após a temporada no Paiol, também em 1984, frustradíssimo: reduzidíssimo público para um show que, semanas depois, lotaria espaços nobres tanto em São Paulo como no Rio de Janeiro. A cantora Eliana Estevão e o cantor-compositor Passoca, dos mais importantes nomes da nova música paulista, não conseguiram cantar para mais do que 40 pessoas quando estiveram no Paiol. Apenas alguns de muitos exemplos de que, realmente, é perda de tempo estimular a vinda do que há de bom na MPB para temporadas em Curitiba, Ironicamente, têm razão os inimigos do Paiol: a casa deve ser desativada ou transformada em espaço para os sub-roqueiros tupiniquins, que, aliás, já ocupam o TUC e, pouco a pouco estão (contrariando inclusive determinação que existia anteriormente) invadindo também os auditórios do Guaíra. Por que trazer a Curitiba aqueles espetáculos musicais, com instrumentistas acústicos, bonitas vozes, bem dirigidos, que mostram a riqueza de nossa MPB? Não há razão, se não há público! O Projeto Pixinguinha, por culpa da incompetência da Secretaria da Cultura (sic, sic) aqui fracassou no ano passado - e Curitiba já ficou fora de qualquer novo roteiro. Agora, a Funarte deve estar convencida de que os espetáculos musicais que leva às salas de outros Estados, para Curitiba não justificam o investimento. A propósito: desde ontem, com bom público e enorme cobertura da imprensa, o espetáculo sobre Wilson Batista, está sendo apresentado na Sala Guiomar Novaes, em São Paulo. Depois irá ao Rio (15 dias na sala Sidney Miller) e Brasília. E para o Paiol, o que mesmo teremos no próximo fim-de-semana?
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
13
07/05/1986

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br