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Aramis

Yes, nós temos jazz. O TJB gravou um lp.

Pode-se contar nos dedos os discos de jazz feitos por músicos brasileiros em nosso País. Com uma raquítica tradição jazzística em que mesmo as edições internacionais sempre se processaram de forma desorganizada e pouco promovida - defeito que só agora começa a ser corrigido, não pode se pretender que nossas gravadoras, voltadas aos lucros fáceis, se arrisquem a produzirem discos de jazz num País em que este gênero musical dispõe (isto é, dispunha, pois agora a coisa está mudando) de uma faixa tão pequena de admiradores. Mesmo os mais organizados estudiosos - como o nosso colaborador José Domingos Raffaelli, que semanalmente tem publicado em O ESTADO profundos estudos sobre os mais importantes jazzmen - não seriam capazes de relacionar mais do que 30 lps de jazz feitos em nosso País. O estilo "West Coast" de Dick Farney, com algumas jan-sessions nos auditórios de "O Globo" e das "Folhas", a série de 3 lps que o extraordinário Paulo Moura fez na Equipe, 2 discos de Victor Assis Brasil e cinco ou seis outros títulos mais expressivos é o que existe de importante no gênero, em termos de produção "made in Brasil". Por isto, quando a Chantecler em fase de reestruturação artística e comercial, se anima em lançar um lp com o Tradicional Jazz Band, grupo de músicos paulistas que se dedicam ao mais puro estilo New Orleans, o assunto não pode deixar de merecer os mais entusiásticos aplausos. Alberto Martino, 45 anos, engenheiro do setor de iluminação pública da Prefeitura de São Paulo, ligado ao jazz paulista há quase 20 anos, período no qual tomou parte em diversos grupos que tentaram difundir o estilo New Orleans - como o pianista e jornalista Edoardo Vidossich relatou em ingênuo mas válido historicamente "Jazz na Garoa (edição da Associação dos Amadores de Jazz Tradicional, São Paulo, 1966, 120 páginas). Há cerca de oito anos, aproximadamente, depois de passar por muitos conjuntos, Alberto "Tito" Martino conseguiu reunir um grupo de jovens instrumentistas de bom nível e formar o Traditional Jazz Band, que vem se mantendo até hoje, com poucas substituições. Inicialmente atuando no "Ponto de Encontro", misto de boite, galeria de artes e loja de discos, o Traditional Jazz Band passou depois por várias casas noturnas - Capitu, Otero etc. - até chegar agora ao "Opus 2020", na avenida Paulista, de propriedade do próprio Tito - e que vem fazendo de sua casa de concertos um dos ambientes musicais mais agradáveis da noite paulista. Foi ainda no "Ponto de Encontro" que o TJB fez o seu primeiro lp, editado pela antiga Codil (CDL 13.020) e hoje uma obra rara, pois com o desaparecimento daquela etiqueta o lp foi retirado de catalogo. Liderado por Tito, na clarineta, o TJB daquela época era formado por André Busic, na corneta, Onofre Cardoso, no trombone e Reynaldo Mayer, no banjo; Laurindo Godoy, no washboard; Alberto Siufi, na Tuba; Daniel Grisanti, no baixo e Sacha Kliass, no washboard - dos quais apenas os dois últimos integram o grupo atualmente. Tocando apenas nos fins de semana, os integrantes do TJB dedicam-se a outras profissões, o que tem limitado, profissionalmente, a carreira do grupo. Entretanto, eles tem feito concertos em outras cidades - na Guanabara, já apresentaram-se por 3 vezes, a última dos quais foi na Sala Cecília Meireles, e há um ano iriam a Buenos Aires, numa excursão com Porteña Jazz Band, cuja vinda a Rio São Paulo foi por eles patrocinada. A 12 e 13 de agosto de 1972, o Traditional Jazz Band fez duas notáveis apresentações no Teatro do Paiol, onde voltou, sem o mesmo sucesso, em outubro do ano passado. Para breve, anuncia-se uma nova temporada do grupo no Paraná. Dedicando-se exclusivamente ao estilo tradicional, dando as suas apresentações um sentido didático, procurando incentivar a formação de outros grupos - em São Paulo já existem três outros conjuntos na mesma linha, Tito e seus companheiros tem desenvolvido um extraordinário trabalho em favor da preservação e difusão do estilo New Orleans. Em janeiro deste ano estiveram nos EUA, fazendo concertos em New York, New Jersey, Tucson, Miame, Washington e New Orleans - onde o contrabaixista Daniel Grisanti "sepultou" seu velho instrumento nas águas do Mississipi, trazendo de volta um novo aparelho. Na terra do Jazz, no Preservation Hall, os rapazes do TJB agradaram bastante e em Nova York e Washington, após suas apresentações, mereceram simpáticas críticas. Como, por exemplo, do Washington Post, que na edição de 7 de janeiro de 1974, escreveu: "É como descobrir de repente que a cozinha da Embaixada Francesa é comandada por um cozinheiro indonésio. Algumas centenas de norte -americanos fanáticos por jazz foram surpreendidos por um conjunto brasileiro, de jazz tradicional - não Dixeland - que os manteve batendo palmas no ritmo e aplaudindo de pé. A banda era o Traditional Jazz Band, de São Paulo, domingo à noite, no costumeiro concerto, patrocinado pelo Potomac River Jazz Clube"(Dan Griffin). Já John S. Wilson, crítico de jazz do "The New York Times", escreveu: "Mr. Martino revelou sua afeição pelo estilo de George Lewis, o clarinetista de New Orleans, em uma interpretação com lindas nuances de "Burgundy Street Blues" de Mr. Lewis. Mas embora pudessem ser ouvidos, nas interpretações dos brasileiros, ocasionais reflexos de famosos jazzistas americanos -sugestões do timbre e fraseado de Louis Armstrong no pistão Mr.Roberts, ou a elegante austeridade de Jimmy Archey no trombone de Sergio Tamburri - [elas] estão baseadas em inúmeras fontes e apresentavam as coisas de uma forma pessoal, individual. O público todo balançava com os ritmos". Tão boas críticas, mais o fato de já terem um "tape" pronto, com gravações feitas nos Estúdios Reunidos, entre 8 de agosto a 31 de outubro de 1973, com produção orientada por Augusto Cezar de Aguiar, experte em jazz e amigo do grupo, fez com que a Chantecler se oferecesse em editar o lp, que está nas lojas embora a venda maior tenha sido até agora em São Paulo, onde o grupo é mais conhecido. Com destaque para Tito Martino no clarinete, Austin Roberts no pistão, Sergio Tamburri, no trombone; Cluchim Montoya, no piano; Eduardo Bugni, no banjo; Daniel Grisanti, no contrabaixo e Sacha Kliass, no wasboard -ou seja, permitindo que toda a banda, se destaque temos "Saint Louis Blues no 1, com um arranjo muito especial em torno do clássico de William Christopher Handy (1873-1958), composto em 1914 e o mais conhecido tema de jazz; "Everybody Loves My Baby", de Palmer/Willians;"Struttin'With Some Barbecue" de Hardin-Louis Armstrong e, encerrando o lp, um novo arranjo em torno de "Saint Louis Blues". Além do Hino da Batalha" - o clássico tema folclórico. Já com Tito Martino no sax alto e Daniel no violão - mantendo os demais suas posições e "Black And Blue" de Walter/Raza/Books. Austin Roberts ao pistão e Luchin Montoya, no piano, destacam-se e, "Nobody Knows when You're Doun And Out", de Cox. Finalmente apenas com Tito no clarinete, Dudu no Banjo; Daniel Grisanti no baixo e Sacha Kliass no washboard é "Lady, Be Good". Um dos mais belos temas de Cole Porter (1892-1964). Criativos, espontâneos e, pode-se até dizer, didáticos, Tito e seus companheiros do Traditional Jazz Band desenvolvem um trabalho único no Brasil e ao qual a edição deste bom álbum vem dar um grande impulso. Um disco importante para quem gosta de jazz e sabe como é difícil divulgá-lo entre nós. Maurício Quadrio, diretor de projetos especiais da Phonogram, ao mesmo tempo que lançado o volume 14 da série "Jazz History", com 2 lps com a orquestra de Count Bassie, promete seqüência a esta notável produção de Normam Granz, ainda para a Verve - com mais 6 álbuns-duplos programados até o final do ano, também confirma a edição no Brasil do primeiro suplemento da Pablo, nova etiqueta de jazz que Granz fundou e que começa com um suplemento extraordinário: "Duke's Big 4", uma das últimas gravações de Duke Ellington (1899-1974), feita em 1973, acompanhado apenas dos guitarristas Joe Pass, baixista Ray Brown e baterista Louis Bellson; "The Trio", gravado durante uma apresentação de Oscar Peterson - acompanhado por Niels Pedersen e Joe Bass, no London House, Chicago, no ano passado, mais um álbum de 3 lps, contendo os melhores momentos do Festival de Jazz de Monterey do ano passado, inclusive Ella Fitzgerald cantando "Madalena" de Ivan Lins/Ronaldo Monteiro de Souza. Outras gravações da Pablo aparecerão ainda este ano, numa prova de confiança da Phonogram no crescente mercado jazzístico brasileiro. A Top Tape, dirigida por José Rozemblit Sobrinho, com a representação para o Brasil da CTI, de Creed Taylor, continua a editar o que existe de mais contemporâneo no jazz americano- assunto que abordaremos com detalhes na próxima semana. A CBS e a Odeon, de produção jazzística mais irregular, embora começam a acreditar no mercado brasileiro de jazz e lançam lps com clássicos de obra de Duke Ellington, aproveitando a atenção despertada com a sua morte. O disco da CBS ainda não foi divulgado em Curitiba, mas a gravação da Odeon (Capitol, ST 1602, agosto/72) - "The Best Of Duke Ellington", se constitui numa excelente antologia para quem não dispõe de outros discos do notável compositor, pianista, arranjador e maestro. De diferentes fases de sua carreira - infelizmente não houve cuidados da produção em oferecer qualquer informação adicional - temos uma pequena demonstração de sua imensa obra: "Warn Valley", "Prelude To A Kiss", "In A Sentimental Mood","Black And Tan Fantasy", "Rockin'In Rhythm","Satin Doll","Passion Flower", "Bakiff","Caravan" e "Flamingo". A Tapecar também está entrando no mercado jazzístico: obtendo a representação de Mainstream passou a editar com intensidade no mercado brasileiro, mas até agora, infelizmente, seus discos não chegaram ao Paraná. A Victor, após uma primeira safra de 6 bons lps da Fantasy, promete para breve uma nova coleção de títulos expressivos. Finalmente a Companhia Industrial de Discos, fabrica pertencente a família Zunckmann e que com instalações próprias e se organizando artística e promocionalmente - Fernando Lobo assumiu o setor em julho último e ali já se encontrava a experiente Gaby Leib, uma das mais ativas empresárias especializadas na promoção de músicos de jazz - (foi ela quem trouxe ao Brasil o grupo de Horace Silver) - também está oferecendo novas opções aos fãs de jazz. Ao lado de lps com o jazz mais digestivo - como Ahmad Jamal ou Ransey Lewis - a CID assumiu para o Brasil a representação de Black Jazz Records, etiqueta que reúne alguns dos mais importantes nomes da última corrente do Jazz e por isto mesmo ainda desconhecidos no Brasil. Mas através de um trabalho inteligente que a CID poderá desenvolver há condições destes lançamentos alcançarem ao menos o público mais interessado. Os dois primeiros lançamentos da Black Jazz Records que a CID faz são do organista Chester Thompson ("Power house", BJ/6) e do baixista Henry franklin ("The Skipper", BJQD/7). Chester Thompson começou a tocar piano aos 5 anos, dentro de uma iniciação religiosa-musical levada pela família. Ao fazer o [curso] secundário em Oklahoma, formou o seu primeiro grupo musical. FOTO LEGENDA - O Traditional Jazz Band: Tito Martino, clarinete; Austin Roberts, pistão;Sérgio Tamburri, trombone; Luchin Montoya, piano; Eduardo Bugni, banjo; Daniel Grisanti, contrabaixo; Sacha Kliass, washboard.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
aqui, jazz
28
01/09/1974

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