Login do usuário

Aramis

Alemão, aquela guitarra dos tempos de Marrocos

Foi uma época feliz. O gordo Paulo Wendt (1919-l966), uma espécie de god-father da noite curitibana no início dos anos 60, comandava uma cadeia de estabelecimentos noturnos e não se limitava trazer para sua principal casa, a Marrocos (Praça Zacarias), apenas as mais belas mulheres. Fazia questão de apresentar shows artísticos de nível, com gente famosa, "a altura do Rio e São Paulo" repetia sempre. Fez mais até! Acorajou-se a promover no então inacabado Guairão uma série de récitas operísticas que lhe deu altos prejuízos mas melhorou sua imagem de homem da noite. Wendt também entendia a importância de ter bons músicos regulares na casa. Assim quando um estabelecimento rival - o La Vie En Rose, - não renovou o contrato com um grupo gaúcho que havia chegado de Porto Alegre, comprou o passe e levou o quinteto de Breno Sauer para sua casa. Acertou na loteria musical! Breno inovava na MPB com um instrumento até então pouco usado, vibrafone, e sabendo inspirar-se num grande músico de jazz que também utilizava o mesmo instrumento - Art Van Dame - dava um som diferente ao seu conjunto, numa fase em que a MPB se renovava. Logo veio o convite para um disco na CBS e o quinteto de Breno Sauer marcou época - permanecendo quase dois anos em Curitiba. xxx Além de Breno, o grupo tinha outros bons músicos: Gabriel no baixo conseguia acordes marcantes; Pirata era o baterista e um jovem crooner, Fernando Colares, foi o primeiro dos cantores de nossa noite a incluir em seu repertório as canções de Sérgio Ricardo e Carlos Lyra que começavam a aparecer nos embalos da Bossa Nova. O guitarrista do conjunto era um gaúcho alto, loiro e que se orgulhava de sua família circense, de origens em Taquari. Tanto é que poucos sabiam de seu nome verdadeiro - Olmir Stocker, o chamavam de Alemão. O conjunto teve substituições - Pirata (Afonso Cid), deixou o conjunto e acabou se fixando em Curitiba. E mais tarde, com a ida de Breno Sauer para os EUA (onde mora até hoje) o conjunto se desfez. Fernando Colares fez concurso para a Caixa Econômica e está as vésperas da aposentadoria, em Porto Alegre, conforme aqui já contamos no ano passado. Alemão, o bom guitarrista, continuou no campo e batalha. Trabalhou com o conjunto de Roberto Carlos, foi um dos Wandecos na fase da Jovem Guarda, participou de outros conjuntos e garantiu o pão-nosso-de-cada-dia como músico de estúdio. Mas nunca deixou de compor e evoluir artisticamente. Há seis anos, finalmente fez seu primeiro lp-solo "Longe dos Olhos, Perto do Coração"), terceiro do catálogo Som da Gente e que está em sua quinta edição, onde já mostrava um painel diversificado das formas musicais encontradas Brasil afora. Agora, Alemão voltou com um novo disco, também pela Som da Gente, de seus amigos Walter Santos/Tereza Souza, que pretende vir lançar em Curitiba, de tantas memórias de sua juventude. O título define a proposta: "Bem Brasileiro". A exemplo de "Longe dos Olhos, Perto do Coração", um mergulho em nossas raízes sonoras, mas sem folclorismo. Ao contrário, uma música pura, com expressão e sentimento que flui com naturalidade. Para fazer sua música, Alemão formou um quarteto integrado por ele na guitarra, viola, violão e cavaquinho; João Parayba, na percussão; Paulo Oliveira no sax alto, soprano e flauta e Zezo, violão. Um grupo pequeno, portátil, e que pode inclusive viajar com facilidade. As músicas são inéditas e uma mais bonita do que a outra. Há uma sentida homenagem ao Paraná: "Araucárias". Há também "Nasce uma Mulher" (de Walter Santos, a única música do disco não assinada por Alemão), inédita, feita para o filme de Roberto Santos (1928-1987); uma "Milonga Violada" bem brasileira, com viola, violão e flauta; "Um chopinho em Ipanema", com um clima bem carioca; uma valsa ("Donzela"), "Aquarela Nordestina" - misturando ritmos; "Pagos" uma toada bem sulina e a "Suíte do Índio", com oito movimentos, que traça um perfil até fantasioso do índio brasileiro em seu ciclo de vida. Alemão, aquele guitarrista das noites iluminadas do La Vie En Rose e, depois, do Marrocos, na Curitiba do início dos anos 60, transmite emoção nesta sua maturidade de compositor e instrumentista - com um som belíssimo e que mereceria ser aplaudido ao vivo. Pena que falte em Curitiba-87 um empresário noturno como Paulo Wendt e um ambiente musical com shows ao vivo - pois assim teríamos chance de aplaudir a música de Alemão em pessoa - e não apenas em disco.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
21/11/1987
Eu era músico do Conjunto Melódico Mocambo em Porto Alegre, entre 1957 e 1959. Na então Revista do Globo (da Editora Globo de Porto Alegre) saiu uma reportagem sobre nós. Tenho a impressão que conheci o Alemão no final da década, tocando com o Wilson Ayala, um baixinho bom de gaita que era menor que o instrumento (120 baixos), com o qual toquei por algum tempo também. Creio que o Olmir tocou junto conosco também, algumas poucas vezes. Eu era tão novo (13 -14) que se isso ocorreu, provavelmente ele nem notou minha presença. Ou não lembra mais. Eu tocava contrabaixo. Você poderia confirmar se o alemão estava por lá nessa época?

Enviar novo comentário

O conteúdo deste campo é privado não será exibido publicamente.
CAPTCHA
Esta questão é para verificar se você é um humano e para prevenir dos spams automáticos.
Image CAPTCHA
Digite os caracteres que aparecem na imagem.
© 1996-2016. tabloide digital - 35 anos de jornalismo sob a ótica de Aramis Millarch - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Altermedia.com.br