Assim falou Calado
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 13 de junho de 1987
Sinceridade, simpatia e o bom humor. Um tripé para definir o jornalista e escritor Antonio Calado, 69 anos, em seus dois encontros com o público que foi ouvi-lo na semana passada (quinta-feira, 5, na Biblioteca Pública e no auditório da PUC). O autor de "Quarup" falou sempre de forma franca, não se negando a responder as mais diversas perguntas - algumas bastante risíveis, outras pretenciosamente intelectuais.
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O melhor foi a abordagem que Calado fez sobre a política. Afinal, ele é, há mais de 40 anos, um jornalista político, tendo participado de importantes acontecimentos. Em 1964, aceitou o convite de Niomar Miniz Sodré para reassumir a chefia de redação do "Correio da Manhã" (que havia ocupado anteriormente, entre 1958/62), na fase mais dura da oposição ao governo militar. Ali, Calado deu uma mostra de coragem, apoiando o cronista Carlos Heitor Cony, quando este começou a fazer oposição aos militares a partir de sua história crônica "O Ato e o Fato". E quando Cony foi despedido, Calado, em solidariedade, também deixou o jornal.
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A oposição de Antonio Calado à ditadura militar foi tão corajosa que, em 1968, o governo lhe cassou os direitos políticos e baixou um decreto que o proibia de trabalhar em qualquer veículo de imprensa (inclusive rádio/ tv) no Brasil, cerceava a possibilidade de lecionar e exercer outras atividades intelectuais. "Era para me matar de fome, obrigando-me a sair do país. Mas não saí. Fiquei", diz.
O decreto foi tão violento e revoltou tanto a sociedade civil, que o presidente Arthur da Costa e Silva foi obrigado a reconsiderá-lo.
- "Até o Ibrahim Sued ficou do meu lado. E no dia 13 de maio de 1969 tive minha carta de alforria: pude voltar a trabalhar. Naquele período, Calado era redator do "Jornal do Brasil". A condessa Pereira Carneiro, pressionada a demití-lo o fez. Mas manteve, secretamente, o seu salário, "numa atitude humana e marcante", reconhece.
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Quando perguntaram sua opinião a respeito de José Sarney, se ele é melhor como escritor ou presidente, foi mineiro e lacônico:
- "Empatam".
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Também lacônico ao lhe indagarem sobre qual dos presidentes militares foi o pior.
- "Difícil dizer. Todos procuraram ser pior do que o outro."
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Calado aceitou participar do projeto "Encontro Marcado", promovido pela IBM e organizado pelo jornalista Arakem Távora, por acreditar na importância do escritor manter um contato com o público, especialmente os jovens. E em suas andanças, também têm revisto amigos. Em Recife, há três semanas, esteve com Miguel Arraes, sobre quem escreveu, em 1963, "Tempos de Arraes", lançado originalmente pela Civilização Brasileira e, quando da volta do político pernambucano ao Brasil, reeditado pela Paz & Terra, com prefácio do próprio Arraes.
Calado não esconde sua admiração por Arraes, embora reconheça que devido a idade, será difícil que ele possa a vir ser candidato a presidente do Brasil. Sobre uma dobradinha com Leonel Brizola, também não acredita:
- "Infelizmente, homens honestos, íntegros, fortes, mas não se entendem. Nem antes, nem agora, nem no exílio. Sobre uma eleição direta, acredita que existem, no momento, quatro nomes fortes, capazes de disputarem a presidência do Brasil com chances de terem vitória: Leonel Brizola, Arraes, Lula e Waldir Pires.
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Em relação ao Leonel Brizola, Calado não esconde sua admiração. Disse que gosta de Brizola, reconhece seus erros, mas sabe aplaudir suas virtudes, sua coragem. E destacou um fato:
- "No dia seguinte de Sarney ter anunciado o Plano Cruzado, Brizola foi a televisão e fez pesadas críticas. Até eu achei que era precipitação. No fundo, Leonel mostrava sua visão bem grande da questão."
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Quando se refiriu a políticos udenistas - e vendo que o público a que se dirigia era formado por jovens - foi didático:
- "Os udenistas eram bons homens, mas que achavam que o povo não sabia votar. E quando o povo ganhava, pediam ajuda dos militares. Só que os udenistas, embora preferissem também o cheiro de cavalos...de raça, ao do povo, jamais diziam isto. Isto, o único que disse foi o ex-presidente João Figueiredo."
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