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Aramis

Caymmi, som, imagem, magia

"Que são setenta anos, diante da melodia que não conta tempo, não envelhece, enquanto as modas de cantar se sucedem e quase nada de música existe mais do que uma estação? Não há dia seguinte para o cancioneiro de Caymmi. A flor que o vento joga no colo da morena de Itapoã não murchou ainda. Murchará um dia? Não creio. O que está na voz de Caymmi a gente guarda como faz com as coisas de estimação. E ao ouvi-la em casa, na rua, no ar, é sempre a emoção de um bom encontro. Incorporou-se ao patrimônio de arte e coração do Brasil. Ninguém o apaga ou destrói". (Carlos Drummond de Andrade, em crônica publicada no "Jornal do Brasil", quando dos 70 anos de Caymmi, em abril de 1984). Hermínio Bello de Carvalho, poeta e agitador cultural a quem a MPB tanto deve, pela sua credibilidade e competência, foi um dos poucos produtores culturais que conseguiram fazer Caymmi voltar ao palco, a propósito de seus 70 anos. E fez ainda mais: uma exposição de seus quadros e desenhos - afinal Caymmi é um artista plástico que, segundo seu amigo, Augusto Rodrigues, "não fosse a preguiça, chegaria a revelar com os pincéis a genialidade alcançada com as notas e os versos", foi realizada na galeria Rodrigo de Mello Franco, na Funarte-Rio. O grande artista gráfico Hermenegildo Sabat produziu uma série de desenhos inspirados em Caymmi - que deveriam ter se transformado num álbum - e, em edição limitada, saiu uma seleção de desenhos de Caymmi - 21 pranchas, dez das quais em preto e branco. Um recital que Caymmi fez no Teatro Castro Alves, Salvador, 30 de novembro de 1979 - numa das três vezes que Hermínio o dirigiu no palco - transformou-se num álbum duplo, editado pela Funarte com patrocínio da Petrobrás. Caymmi - Som/ Imagem/ Magia Em princípios de 1985, Jairo Severiano, 57 anos, pernambucano de Recife, bancário aposentado e um dos mais sérios pesquisadores da MPB, animou-se com um projeto: realizar um livro-disco sobre Caymmi. A idéia tomou corpo após conhecer a pesquisa que Vera de Alencar vinha fazendo há tempos sobre a vida e obra de Caymmi. Unindo-se a Marília T. Barbosa, uma das mais ativas garimpeiras de nossa MPB, já com premiadas monografias sobre Cartola, Paulo da Portela, Silas de Oliveira (sempre em colaboração com Arthur Oliveira Filho), Vera pôde levar adiante o seu projeto editorial. A complementação musical deste trabalho seria necessária e foi a própria diretoria da Norberto Odebrecht, uma das maiores construtoras do Brasil e que há anos vem desenvolvendo projetos culturais (especialmente a série "Nordeste Monumental", só interrompida devido à morte de seu coordenador, o crítico Clarival do Padre Valadares), quem propôs que fosse desenvolvido algo como uma superprodução. Nasceu assim a Sargaço Produções Artísticas, através da qual Jairo, Vera e Marília realizaram o mais belo, completo e significativo projeto cultural da história da música popular brasileira. Em edição bilíngüe (português - inglês) - o livro "Caymmi - Som/ Imagem/ Magia" (225 páginas, 26,5x18 cm), com 72 ilustrações - 12 das quais em cores - faz uma revisão completa, didática - mas numa linguagem extremamente agradável - sobre a vida e obra de Caymmi. A experiência de pesquisadora de Marília T. Barbosa, uma moça tão linda quanto competente, e o entusiasmo de Vera de Alencar (que trabalha, aliás, no levantamento da obra gravada de Antônio Carlos Jobim, a seu pedido) resultaram numa obra definitiva sobre Dorival Caymmi. Dificilmente alguém poderá fazer um volume mais completo do que este sobre o autor de "O Que é Que a Baiana Tem?". O documento sonoro O projeto não ficaria completo sem a parte auditiva. E nisto Jairo Severiano realizou um trabalho igualmente perfeito. Com os generosos recursos que a Fundação Emílio Odebrecht colocou à disposição, Jairo convenceu Caymmi a, acompanhando-se apenas ao violão, contar e cantar algumas de suas canções mais famosas, explicando rapidamente como surgiram: "É Doce Morrer no Mar", "A Preta do Acarajé", "...Das Rosas", "Dora" etc. Abrindo e encerrando as duas faces do lp, depoimentos de Jorge Amado, Caetano Veloso, Tom Jobim e Carybé. No segundo disco, uma abertura inédita: seu amigo Radamés Gnattali, 80 anos, acompanhado pela Camerata Carioca, apresenta a "Caymmiana", sobre temas de Caymmi. Em seguida, mais nove de suas canções - mas desta vez com acompanhamento de orquestra (exceto "Sargaço Mar", esta uma música inédita pela primeira vez incluída na gravação). Produção que atingiu a um bilhão de cruzeiros - inteiramente bancados pela Fundação Emílio Odebrecht, "Caymmi - Som/ Imagem/ Magia" destinou-se basicamente aos clientes e amigos da construtora Norberto Odebrecht, mas com uma distribuição incluindo o Exterior. Dificilmente haverá uma edição comercial - ao menos com o requinte deste projeto - mas seria justo que ao menos numa tiragem mais modesta em termos gráficos, mas com a mesma qualidade técnica, o livro de Marília e Vera pudesse chegar aos milhares de brasileiros que tanto admiram Caymmi.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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09/02/1986

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