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Aramis

Discovisão, o Midem brasileiro

CANELA - junho - Seis dias em que compositores, cantores, músicos, maestros, arranjadores, produtores, capistas de discos, divulgadores, vendedores, executivos de todas as gravadoras brasileiras (com exceção da CBS) passam juntas, discutindo problemas ligados à música e, em consequência, ao produto que chega ao "consumidor", ou seja, o disco fazem da festa nacional do disco e, em sua terceira edição, realizada de 21 a 24 de junho no Hotel de Laje de Pedra, o mais importante evento de musicografia brasileira - no aspecto arte-indústria. A exemplo de Midem - Mercado do Disco e Edições Musicais, que as constitui na principal feira mundial da indústria fonográfica mundial, anualmente realizado em Cannes, França - o Discovisão idealizado por Fernando Vieira e José Além (o Salim) da Emprol amparados numa ágil equipe, e com promoção da empresa jornalística Caldas Júnior (Correio do Povo, Folha da Tarde, Rádio/TV Guaíra) mais uma vez alcançou grande sucesso, mesmo sem ter a cobertura publicitária suficiente para cobrir os elevados custos - é a quota nacional da Antarctica, permitiu um retorno financeiro para cobrir as passagens e [estadas] de mais de 150 convidados do eixo Rio-São Paulo mais a participação de centenas de artistas jornalistas etc, do Rio Grande do Sul - a promoção atingiu as suas metas - nos vários aspectos a que se propõe. Se de um lado há o aspecto do festival - com todas as mordomias permitidas, em apresentações artísticas, coquetéis, etc, ao longo de lançamentos de novos discos de artistas como Elba Ramalho (Coração Brasileiro) os regionais de artistas gaúchos como os excelentes Jaime Caetano Brauin, Luiz Carlos Borges e Cesar Passarinho, produzidos pela incansável Airton (Palinete) dos Anjos - há também eventos especiais por exemplo, um dos momentos de maior emoção foi na tarde de terça-feira, 21, quando a Polygram promoveu o Chá das 5, para o lançamento do álbum duplo "Antologia Poética de Mário Quintana" com a presença do maior poeta gaúcho - e um dos maiores do Brasil, que em março último, na última semana de administração de Jaime Lerner em Curitiba, havia sido homenageado pelo Bamerindus, com a confecção de milhares de posters de seus poemas espalhados pela cidade. Durante anos arredio à imprensa, Mário Quintana aceitou em fevereiro último, a idéia de gravar nos estúdios da Isaec, uma antologia de seus poemas - para um álbum duplo que vem completar uma triologia documental básica produzida na Polygram que começou com o álbum de Vinícius de Moraes e prosseguiu com o álbum de Carlos [Drummond] de Andrade. A importância de um poeta de dimensão de Mário Quintana registra para a posteridade a sua voz, num álbum produzido com o maior carinho pelo hispano-brasileiro Jesus Iglesias - primo do cantor Júlio, e publicitário em Porto Alegre, e o baiano Roberto Santana (responsável no passado, pelo lançamento de artistas como Quinteto Violado e Elomar, cantora Zizi Possi etc...), já fez a Discovisão-83, um acontecimento. Mário Quintana compareceu ao Chá em sua homenagem numa das salas do Hotel Laje de Pedra. Repleta de jornalistas, radialistas e homens de televisão, além de artistas como Diana Pequeno, Elba Ramalho, As Frenéticas, Bebeto (gaúcho de Uruguaiana[,] lançando agora seu segundo LP), Grupo, Grupo Caverá etc. Apesar de um misto de timidez, respeito a emoção pela presença de um dos maiores poetas vivos do Brasil, houve muitas perguntas. Com extraordinário bom humor, Mário dizia: - Me sinto como se tivesse dentro da polícia sendo interrogado. Falando da MPB afirmou que gosta da música em geral. Contando sobre o processo da gravação da antologia, disse: - Me fizeram sofrer bastante, mas a gente não chega à perfeição sem sofrer, estou numa suave escalada para a perfeição. Fazer poesia e falar no microfone são dois modos de se comunicar. Só que na primeira a gente cuida mais e no microfone pode dizer bobagens. A cantora Elba Ramalho - uma das presenças mais simpáticas do festival perguntou ao poeta se possuiu alguma forma especial de criar suas poesias e ele respondeu que o hábito de trabalhar na cama "Escrevo Deitado". Sua amiga e parceria Diana Pequeno (ela musicou um de seus poemas e o gravou em LP na RCA) quis saber porque sendo ele poeta, não gostava de escrever cartas. - "Dói muito e a gente sente saudade, ou raiva". Quintana observou que a nova geração de poetas realiza um trabalho mais solto: - "Não se enquadram em escolas, cada um segue seus passos, como um barco. A partida é igual para todos, a chegada é que difere[,] depende de cada um". Mais adiante disse: - "Não evoluí, sou sempre o mesmo. Vou fazendo um pouco de tudo. Publiquei sonetos por esperteza. Sonetos com ares de poemas, pois quando comecei era o que mais gostavam e continua até hoje". Apesar de Mário Quintana evitar, surgiu o assunto acadêmico ou melhor o assunto Academia Brasileira de Letras - foi candidato e perdeu, duas vezes, foi bem humorado: - "Tive a ilusão de que a Academia de Letras fosse de Letras mas é de política. Um amigo, que é imortal, havia me aconselhado só que agora é um assunto superado". A CAPA EM DISCUSSÃO A homenagem a Quintana foi repleta de emoções, muita poesia. Pela manhã de terça-feira 21, o debate que abordou o papel da indústria gráfica na evolução do disco foi em outro astral. No ano passado, houve uma primeira reunião de profissionais que atuam na arte de criação de capas - com críticas às gravadoras, e estas - através de seus dirigentes também fazendo colocações sobre o encarecimento que a sofisticação de certos trabalhos gráficos representam. Este ano, os capistas foram os maiores argumentos e, entre outros, coordenaram a mesa - o paranaense Elifas Andreatto (sem dúvida, hoje o mais conhecido artista plástico que atua na área). Tadeu Valério, da Odeon, Wilton Montenegro, fotógrafo e capista free-lancer, Ciro de Oliveira da Som Livre, Arthur Froes da RCA, J.C. Mello, da Ariola, além de Plínio Joe de Godoy da Laborgraf que imprime a maioria das capas de discos das grandes fábricas. A questão das capas de discos - que nos últimos anos se tornaram sofisticadas e que, segundo algumas gravadoras, prejudicaram inclusive nas vendas - teve, naturalmente, os aspectos de defesa dos artistas. Por exemplo, a interferência dos homens de marketing no processo de criação artística das capas foi amplamente debatido - inclusive com depoimentos de dois executivos estrangeiros, o svigo Guy Beluz, superintendente da Emi-Odeon, e o do holandês Peter Klaen, gerente geral da Ariola - além de muitos executivos brasileiros, a proposta já levantada no ano passado, a de que os autores das capas tenham uma participação nos direitos autorais da vendagem dos discos - mereceu uma promessa de Guy, - a de consultar colegas que dirigem a Emi-Odeon em 32 outros países e ver como, nestes países, se processa a relação entre os que criam a capa e a remuneração em forma de direito autoral. Afinal, argumentam capistas consagrados como Elias Andreatto, se um belo álbum vende milhares de cópias, o artista que criou graficamente, também merece uma participação - assim como tem o compositor, o autor e, mais recentemente passaram a ter [os] produtores e até os músicos (nos chamados direitos conexos). Na reunião dos capistas, houve também o depoimento de alguns dos lojistas - que afinal, vendem o produto ao consumidor - dando os seus pontos de vista a respeito. A simpática Anecy Rost, da Tuza Discos, cadeia de seis lojas que trabalham com discos populares, em São Paulo, apoiou a colocação dos artistas, de que não há justificativa para as capas de discos serem de mau gosto - reproduzindo quase sempre imagens estandartizadas - como, por exemplo, todos os discos, de Roberto Carlos trazerem apenas suas fotografias. Em compensação, houve também o caso de discos de artistas populares, de grande sucesso comercial, como Martinho da Vila, que venderam menos discos a partir do momento que seus discos passaram a ter capas sofisticadas. Enfim, um tema amplo - que no ano passado foi debatido, houve uma promessa de reuniões com a Associação dos Produtores de Discos do Brasil, mas que nunca se efetivou. NOVOS PRODUTOS A Polygram, que dividiu com a Ariola e a RCA a participação mais ampla na Festa Nacional do Disco, aproveitou todos os espaços para apresentar seus novos artistas e produtos. Assim, reuniu os novos contratados para uma apresentação denominada "Música Polygram Brasileira" - entre os quais os estreantes Paulo Maia, Waldir Luz, Feronimo, Lula e Lenine, ou artista em novas produções como Marco [Sabino], Raimundo Sodré, Altay Velloso, Tunai e a encantadora Elza Maria - em cujo novo disco gravou uma música do londrinense Arrigo Barnabé (este contratado pela Ariola, que vai inclusive relançar o seu vanguardístico "Clara Crocodilo". A Polygram/Phillips/Ariola, em três ocasiões, apresentam o seu compacto disco - o DAD (disco e leaser), assunto que detalharemos em próxima coluna - tal sua amplidão. Já numa sala vizinha dois jovens empresários gaúchos - Leo e Miguel Petri. Proprietários do Discoarte Vídeo (Rua Wenceslau Escobar, 2163, Porto Alegre) a primeira vídeo-disco da América Latina, exibiram, em tempo integral, vídeo-discos - em um grande telão. Nesta sala, se concentraram centenas de participantes, revezando-se para ver-ouvir a novidade, representada por imagens insinuantes de Olivia Newton John em seu "Physical". Se o vídeo-disco ainda não tem previsões de comercialização no Brasil, o compacto (laser) a partir de julho, começa a ser vendido, inicialmente na zona franca de Manaus, aparelho a US$ 550 e os discos entre US$ 17 a US$ 20, um dos quais produzido na Holanda é o primeiro a reunir músicas de 12 artistas brasileiros. Jessé, cantor revelado no MPB-Shell 81, apresentou um bonito show na noite de quarta-feira, com direção e cenários do paranaense Elifas Andreatto, seu amigo e que criou inclusive a capa de seu último LP pela RGE. No implúvio do hotel, no confortável cinema ou na boate do hotel Laje de Pedra, da segunda a quinta-feira todas as noites, madrugada adentro, shows com os diferentes participantes se sucederam - com maior ou menor voltagem.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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Tablóide
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25/06/1985

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