Faltaram os músicos no Acorde Brasileiro
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 17 de dezembro de 1986
Tramandaí, RS
Considerando-se o número de profissionais ligados à música gaúcha, estimulada hoje com mais de 60 festivais (43 dos quais registram em discos as músicas finalistas), a participação dos principais interessados nos rumos musicais durante os quatro dias do Acorde foi ridícula. Tanto é que os jornais "Zero Hora", "Correio do Povo" - que voltou a circular há 40 dias - e o nascente "Diário do Rio Grande do Sul", pertencente ao grupo Gazeta Mercantil e em seu segundo mês de existência, fizeram críticas ao esvaziamento do evento.
A cantora e compositora Marlene Pastro, gaúcha de Alegrete, 32 anos, participante ativíssima do movimento artístico regional, chegou a formular em público suas críticas - das quais, o coordenador Edson Otto, defendeu-se explicando que "não poderia trazer no colo os músicos para aqui participarem".
Foi pena. Quem perdeu foram os músicos e compositores - deixando inclusive de terem oportunidade de um encontro direto com autoridades ligadas aos direitos autorais: o vice-presidente do CNDA, Hildebrando Pontes Neto; a diretora-executiva Henry Vanzan de Almeida e o conselheiro Jorge Ramos. Yakoff Sarkovas, diretor do Informa-Som - sistema de Pesquisa e Controle, empresa responsável pela verificação técnica de tudo que é executado no Brasil (ao vivo e gravado), fez uma didática exposição, de gráficos, índices, mapas, mostrando de como evoluiu a sistemática de controle arrecadação dos direitos autorais no Brasil. Maurício Tapajós e Hermínio Bello de Carvalho, fundadores e ex-diretores da Sombrás - entidade criada na década de 70 para lutar pela moralização dos direitos autorais, hoje reconhecem a seriedade do CNDA, embora denunciem que a distorção continue na forma da cobrança: enquanto uma rede nacional de televisão como a Globo paga apenas Cz$ 50 mil em direitos autorais, a proprietária de um salão de beleza, se quiser sintonizar seu aparelho de FM e oferecer som ambiente às clientes, terá que desembolsar Cz$ 3 mil ao mês.
Honeyde Bertussi, acordeonista, 63 anos, 21 lps gravados, foi o músico gaúcho mais participante do Seminário. Sempre ao lado de sua jovem e bela esposa, Flávia, não houve painel em que o gaiteiro não interviesse, muitas vezes com longas e até cansativas exposições - mas sempre interessado. Seu irmão, Adelar, 53 anos - lançando agora seu 10º disco-solo (interpretando "Clássicos no acordeom", Nova Copacabana) foi mais discreto. Telmo de Lima Freitas, 52 anos, a maior expressão do nativismo, sempre pilchado como bom gaúcho das margens do Itaqui, era outra presença de destaque. Interviu pouco mas objetivamente.
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Oficialmente, existem 22 mil músicos filiados à Ordem dos Músicos do Brasil no Rio Grande do Sul. Entretanto, em termos reais este número diminui bastante, pois a secção regional da OMB, como em (quase) todos os Estados, tem sua estrutura das mais viciadas. Quem denunciou os desmandos da OMB-RS, durante o painel em que a situação do músico profissional era analisada, foi Mauro Harff, 30 anos, músico e ex-funcionário da mesma - e que, em atitude de maior dignidade (que lhe tem custado muitos aborrecimentos), vem lutando para sanear a área. Um reflexo do que ocorre nacionalmente, conforme expôs em seu claro e corajoso depoimento o compositor e violonista Maurício Tapajós, 43 anos, que como presidente do Sindicato dos Músicos do Rio de Janeiro e da sociedade arrecadadora dos direitos autorais AMAR, vem se empenhando, nacionalmente, em criar uma consciência profissional junto aos músicos, no sentido de que possa existir uma renovação dos quadros diretivos das entidades de classe.
Com exceção do Rio de Janeiro e Bahia - Estados em que os Sindicatos dos Músicos conseguiram fortalecer a independência - a situação é desanimadora. No Maranhão, disse Maurício, "o sindicato está na gaveta de uma idealista pistonista que tenta organizar a categoria". No Amazonas, o sindicato foi desfeito. Em São Paulo, um músico-pelego perpetua-se no cargo, apesar de uma crescente oposição. Enfim, para que o músico possa, profissionalmente, ter melhores condições de vida e trabalho, há necessidade de muita união e luta. No Rio de Janeiro, em busca de tabelas mais justas o Sindicato já conseguiu algumas vitórias, mas a custa de greves - "e que só foram vitoriosas graças ao apoio de companheiros conscientes e que cerraram fileiras ao nosso lado".
Editando o jornal "O Megafone", publicação bimestral, 10 mil exemplares, com ótimo nível editorial (além de notícias do Sindicato, publica reportagens, artigos e até mesmo pequenos ensaios), o Sindicato dos Músicos Profissionais do Rio de Janeiro vem sendo um modelo nacional.
- "Pena que ainda nosso som esteja tão solitário" - queixa-se Maurício.
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Uma questão nova que também vem preocupando os músicos: a substituição de profissionais por computadores/sintetizadores de sons. O jornalista Roberto Moura, 38 anos, produtor fonográfico e sempre presente a movimentos musicais, lembrou que ainda recentemente ouviu uma gravação de estúdio em que o múltiplo Ugo Marotta, com sintetizadores, "conseguia fazer o som de sax e flauta, lembrando até Copinha". Independentemente da colocação artística, o fato é que no momento em que uma sessão de gravação substitui cinco ou dez profissionais pelo som produzido artificialmente, o músico está perdendo espaço. Este problema vem somar-se a vários outros que fazem com que o Sindicato dos Músicos Profissionais do Rio de Janeiro esteja cada vez mais atento nas relações com as gravadoras, especialmente as multinacionais que dominam o setor. Se há esquemas de estimulo a produção do disco como produto cultural, existe também a necessidade dos relacionamentos produção-trabalho serem mais justas, no entendimento de Maurício Tapajós que, ao ser indagado sobre a questão dos estímulos fiscais às gravadoras que se voltam a projetos culturais, criou uma ótima frase:
- "Em minha opinião a questão tem que ser dividida: o incentivo deve ir para o músico e o fiscal tem que ir é para a gravadora...
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