Índios e canoas deram o Tucano para Maria Luiza
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 01 de dezembro de 1987
Comparado a outros países do mundo, o Brasil tem uma liderança nos curta-metragens. Assim não é de estranhar que, a exemplo do ano passado o Tucano de Ouro nesta categoria tenha novamente ficado entre nós. "Cidadão Jatobá", de Maria Luiza Aboim, foi o grande vencedor, com sua linguagem simples, despojada - mas ao mesmo tempo fiel antropologicamente a cultura dos índios Iawalapiti, do Alto Xingu.
Loira, filha de europeus, com uma beleza plácida e suave que já levou o cineasta Pedro Jorge de Castro, de Fortaleza, convidá-la para interpretar uma personagem belga em seu próximo longa-metragem, Maria Luiza Aboim imaginou fazer um longa-metragem sobre a chegada do primeiro homem branco, há exatamente 100 anos, no Alto Xingu. O projeto esbarrou na limitação orçamentaria e assim fez apenas um curta sobre a construção de canoas a partir da casca de Jatobá, uma prática indígena em desaparecimento na região do Alto Xingu. Com uma perfeita fotografia de John Howard Szerman, seu curta de 14 minutos, passa uma dose de tanta ternura, que, no XX Festival do Cinema Brasileiro de Brasília levou o Candango, na categoria e agora repetiu a premiação - cabendo ao curta canadense, "A Hora dos Anjos", de Jacques Drouin e Brestilava Pojar, um troféu ex-aecqno.
Ao receber o Tucano de Prata, Maria Luiza disse:
- Espero que agora as portas se abram e possa fazer o longa sobre o mesmo tema.
Com o título de "Guerreiros do Tempo" (ou "Aunati"), o longa-metragem de Maria Luiza pretende ir a fundo na questão da extinção da cultura dos índios. Psicóloga atuante profissionalmente no Rio de Janeiro, anteriormente já fez curtas sobre candomblé ("Teu nome veio da Africa",1979) e problemas femininos ("Creche/Lar", 1978), mas agora quer fazer um filme sobre os índios Iawalapiti, "num registro antes que desapareçam".
Carla Camuratti, com "A Mulher Fatal Encontra o Homem Ideal" - que em Brasília já havia lhe rendido o Candango de melhor diretora - ganhou um dos prêmios paralelos do FestRio. Já Ana Maria Magalhães, com seu comunicativo "O Bebê" (que em Brasília conseguiu um prêmio especial do júri) agradou ao público mas não teve nenhuma premiação.
Filme de animação onde o canadense Jacques Drouin e o checo Brestislav Pojar misturam pela primeira vez duas diferentes técnicas - uma para animar bonecos e outra para efeitos e cenários - "A Hora dos Anjos" (L'huere des anges",18,41',1987) capta os momentos em que a noite começa, quando o mundo flutua entre a realidade e o sonho.
Ganhou o prêmio Ex-Aecquo, no setor de curtas-metragens. No ano passado, o júri de curta-metragem (do qual tivemos a honra de fazer parte) penou para dar premiação: por unanimidade, "Frankenstein Punk", de Cao Hamburger e Eliana Fonseca, foi o premiado - enquanto os demais concorrentes eram decepcionantes.
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Exibidos apenas nas sessões da noite e assim ficando praticamente ignorados pela imprensa - os curtas em competição no IV FestRio vieram do Canadá, Bulgária ("Romance sobre o vento", desenho animado de Pencho Kunchev, 5 minutos); Colômbia ("Leve Suspiro/Suave el aliento", 1986, 27 minutos, crônica dos anos 20: diretora de um colégio feminino recorda, num cemitério; os amores de uma adolescente e os choques com sua família conservadora); França ("A Deriva", 2,30", de Etienne Albrecht, sobre a solidão de um homem num veleiro); Noruega ("Brrr", 86, 5 minutos, de Martin Auspag/Philip Ogaard, sobre a agressividade e incomunicabilidade do homem na sociedade urbana); Checoslováquia ("Amor à Primeira Vista"/Laska no provni pohled", 87, 6 minutos, de Pavel Koutsku, desenho animado sobre um homem para conquistar a mulher amada); Venezuela ("Relevé", 87,11', de Oscar Lucien, ensaio de ballet por um grupo experimental). O curta-representante de Moçambique, "Não Mataram o Sonho de Patrícia , 5 minutos, preto e branco, de Camilo de Souza e Ismael Vuvo, recebeu menção honrosa do Centro Internacional do Filme Para a Infância e Juventude.
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