As músicas do carnaval (IV)
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 20 de fevereiro de 1977
Na meia centena de músicas gravadas para este carnaval poucas foram as que refletiram fatos & coisas do ano, como acontecia no passado, quando as letras de marchas traduziam - sempre de uma forma irônica e descontraída aquilo que havia acontecido, de grande impacto popular, nos últimos meses. É bem verdade que o veterano João de Barros, 70 anos de idade e pelo menos 54 de carnavais (começou garoto, ao lado de Noel Rosa e Almirante, no Bando dos Tangarás), soube extrair da comercial viagem de Uri Geller a temática para uma das melhores marchas da "Convocação Geral", "Funciona Cocota" gravada por Chico Anísio.
xxx
O apresentador de televisão Silvio Santos ataca este ano com um marcha de Jota Júnior e Vicente Longo, de tema urbano: "O Metrô". A letra é de uma pobreza franciscana, semelhante aliás as marchas da mesma dupla que SS gravou em carnavais anteriores ("Compensou", 1975 e "Oi-tá-tá-tá", 1974). A televisão também inspirou a Beduíno e Orlando Criscuolo (?) a marcha "Bole Bole da Saramandaia", gravada por um desconhecido Hélio Sindô. A mulata é uma musa que mesmo com a restrição de composições não poderia deixar de ter suas músicas: afora a "Mulata Ponte Aérea" (Elzo Augusto), gravada por Francisco Egydio, temos "A Mulata", marcha-ranchos lançadas para o Carnaval-77. E, sem dúvida, uma das mais estranhas foi "Medo da Solidão", do maestro Coroa e Valentim Segovia, também infelizmente gravado pelo desconhecido Ademar Silvio, numa etiqueta fantasma (Artec-Som), que nem chegou as rádios de Curitiba.
Eu vi uma estrela correr no infinito
Meu amor de pavor deu um grito
Alguma coisa vai acontecer
Nem as estrelas que caem no espaço
Levarão você dos meus braços
Nem que eu tenha que morrer.
xxx
A falta de maior esclarecimento sobre atuação do recém-instalado Escritório Central do Direito Autoral, organismo estatal que vai tentar moralizar, o arenoso campo, acabou provocando muita exploração. As sociedades arrecadadoras - SDDA e SICAM, cobraram Cr$ 4 mil por baile dos dirigentes de clubes, os quais desconheciam que poderiam recolher apenas uma taxa de Cr$ 9 mil por todas as festas carnavalescas, desde que a depositassem na Caixa Econômica Federal do Paraná. Os dirigentes da Thalia, Curitibano, Círculo Militar, Morguenau e Dom Pedro II tiveram essa iniciativa e economizaram Cr$ 11 mil para suas tesourarias.
xxx
O industrial Henrique Schmitdinger, 48 anos, desde 1973 na presidência da Sociedade Dom Pedro II, um dos dirigentes que se recusou a pagar a taxa de Cr$ 4 mil por baile, comentava na sexta-feira, animado com o sucesso do primeiro baile em seu clube: "Acho justo que os autores das músicas tenham seus direitos respeitados mas é injusto o critério imposto as sociedades".
Uma coisa é certa: dificilmente alguma música gravada para este Carnaval "estourará" nos clubes. O que se está tocando é mesmo "Cidade Maravilhosa" (1935), "Mamãe Eu Quero" (1937), "Jardineira" (1939), "Saca-Rolha" (1953), entre outros sucessos do passado. Quando não as incríveis versões da linha "Estúpido Cupido".
Enviar novo comentário