Os russos estão chegando...
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 11 de novembro de 1984
Há três anos, quando editou para a Ariola o primeiro pacote de elepês de música clássica de autores e intérpretes - solistas, conjuntos e orquestras - russos, com material da gravadora estatal Melodia, o record-man Maurício Quadrio cunhou a expressão: "Os russos estão chegando!", lembrando o título do inesquecível filme de Norman Jewison.
A expressão pegou! A Ariola lança em breve a terceira fornada de gravações clássicas made in URSS (a segunda saiu em junho último), enquanto outras etiquetas também se voltam para este amplo mercado.
Arthur Moreira Lima, pianista maior que estudou oito anos em Moscou, após alguns anos de associação a Mário Aratanha, na Kuarup, fundou sua própria etiqueta, a L'Art, lançando um elepê ("Música Russa"), na qual utilizando uma gravação fieta durante sua temporada na Bulgária, em amio último, registrou peças de Tchaikovsky ("Dumka", opus 59), Rachmaninov ("Etude-Tableau", e dois "Prelúdios") e 10 estudos de Scriabin. Uma gravação excelente, na qual Moreira Lima demonstra todo o seu vituosismo. Na capa deste disco uma bela reprodução de uma obra de Butorin, em 1935.
A CBS, cujo catálogo erudito tem também orientação de Maurício Quadrio, edita autores russos consagrados, mas com suas obras em novas interpretações. É o caso de Tchaikowsky, que tem as suas Sinfonias nº 5 e 6, em gravações da Orquestra de Cleveland, sob a regência de Lorin Maazel, apresentadas na série digital "Masterworks CBS". Duas obras que dispensam maiores comentários, tal a importância que adquiriram dentro da história musical.
Também pela CBS, na mesma coleção, Leonard Bernstein rege a Filarmônica de Israel, interpretando a Sinfonia nº 5, em Si Bemol Maior, de Prokofieff - obra composta no verão de 1944. Do mesmo Serge Prokofiev (1981-1953) temos outras três belas peças, estas em registros feitos na própria União Soviética em selo Melodia, há 10 anos - e agora editado no Brasil pela Ariola: Gidon Kremer (violino) e Oleg Maisenberg (piano) interpretam a Sonata nº 1 para violino e piano, em Fá Menor, opus 80. O mesmo Gidon Kremer, no violino divide com Tatiana Gridenko, no 2º violino, a Sonata Para Dois Violino em Dó Maior, Opus 56 - também de Prokofiev, e cuja estréia mundial aconteceu há 52 anos - exatamente 16 de dezembro de 1932.
Outro importantíssimo compositor russo, Dmitri Shostakovich, (1906-1975) pode ser apreciado em alguns de seus melhores trabalhos através de dois lançamentos recentes. Em edição London/Decca, agora representada no Brasil pela Polygram, temos a Sinfonia nº 12, em ré menor, opus 112 - dedicada a memória de Lenin. Obra de sua maturidade - (foi concluída em 1961) e chamada "O Ano de 1917" - reverenciando a transformação político-social russa que abalaria todo o mundo - é considerada uma das obras mais importantes dos tempos modernos. Segundo o crítico soviético Boris Assafiev, "é um quadro músico-histórico". Cada um dos movimentos traz um título comemorativo: "Petrogrado revolucionário"; "Razliv" (referência a bela localidade onde Lenin, escondido em uma cabana de camponês, dirigia as operações revolucionárias); "Aurora", referência ao couraçado que deu o sinal para a revolução atirando para as janelas do Palácio de Inverno e, por último, "O Alvorecer da Humanidade", simbolicamente referindo-se ao novo dia que se levantava para a humanidade.
Além desta belíssima sinfonia, o disco agora lançado no Brasil (gravado na Holanda, em 1982), é complementado com "A Abertura sobre temas folclóricos russos e da Kirghizia", de 1963, que Shostakovich compôs em honra ao centenário da incorporação voluntária da Kirghizia à Russa. Uma peça que contrasta a ansiosa melancolia de uma melodia muito simples com o colorido e a exuberância de uma selvagem dança ofegante.
Já em gravação da Melodia/Ariola, temos dois concertos de Shostakovich. O número um - para piano, trumpete e cordas, na execução de Maria Grimberg (piano), S. Popov (trumpete) e a Grande Orquestra Sinfônica da Rádio de Moscou sob regência de Gennadi Rosdestvensky. O concerto número dois, composto doze anos depois do término da II Guerra Mundial e que demonstra (ao contrário do número um, de 1933), um felicidade tranquila e uma pulsante alegria de viver. Dedicada a Maxim Shostakovich (que foi o solista na estréia em Moscou, reprisada, algumas semanas depois, no Festival de Música da Primavera de Praga, em 1957), a execução deste concerto tem como solista o próprio Dmitri Shostakovich, acompanhado pela Grande Orquestra Sinfônica da Rádio de Moscou, mas já sob regência de outro maestro - Alexander Gauk.
Dentro do (excelente) pacote de lançamentos de gravações da Melodia, feitos pela Ariola, temos outros preciosos registros. Assim, Alexandre Glasunov é reverenciado em seus dois primeiros concertos. O número um, em fá menor, opus 22, com a pianista Alexei Nassedkin e a Orquestra Rádio-Sinfônica de Moscou, sob a regência de Algis Zuraitis; o número dois, em si maior, opus 100, também para plano e orquestra (em um movimento), com Dmitri Alexeiev como solista e a mesma Orquestra Rádio-Sinfônica de Moscou, mas regida por Yuri Nikolaievsky.
Aram Katchaturiam, nascido a 6 de junho de 1903 na Tiflis transcaucasiana mas que passou a viver, desde os anos 20, em Moscou - considerado, ao lado de Prokofiev e Shostakovitch, como um dos "compositores exponenciais" da URSS, tem sua Sinfonia nº 3 em dó maior, para órgão e conjunto de sopros e orquestra sinfônica, interpretada pelo organista Harry Grodberg, mais o conjunto de sopros do Teatro Bolshoi e a Sinfônica de Moscou, regida por Kirill Kondrashin. Na mesma gravação, o "Concerto-Rapsodia" para violoncelo e orquestra, com Mstislav Rostropovich como solista e a Sinfônica da URSS, regida por Jeugeni Svetlanov.
As grandes orquestras soviéticas não se limitam a autores russos. Por isto, um dos melhores discos do suplemento da Melodia / Ariola é o que traz a Filarmônica de L:eningrado, regida por Ginnadi Roshdetsvensky, interpretando a suite para orquestra de Johann Sebastian Bach, na versão orquestral de Gustav Mahler. No lado dois da mesma gravação estão o "Prelúdio e Fuga em Mi Bemol Maio" (na versão orquestral de Arnold Schoenberg) e o "Ricercare" da Oferenda Musical (em versão orquestral de Anton Webern), com as orquestras Sinfônica Academia da URSS e de Câmara da Sinfônica da Rádio de Moscou, ambas sob regência de Roshdestvensky.
Finalmente, dentro desta presença russa na música clássica, dois álbuns especiais: a Banda e Coro do Exército Soviético, ou seja, o famoso conjunto Alexandrov, regida por Boris Alexandrov e tendo como solista o baixo Alexei Sergeiev, interpretando canções folclóricas e militares. Este conjunto teve sua primeira formação em 1928 e se hoje inclui até grupos de bailes e solistas vocais, começou como um modesto octeto vocal. Foi fundado e dirigido durante anos por Alexander Vassilievich Alexandrow, compositor e regente, autor inclusive do Hino Nacional da URSS. Desde a sua morte - em 1946 - passou a ser dirigido por Boris Alexandrovich Alexandrov, autor de muitos bailados, operetas e canções.
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