Santa Felicidade perderá monumental obra "kitsch"
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 12 de outubro de 1986
Curitiba vai perder um de seus monumentos kitschs: devido à duplicação da avenida Manoel Ribas, em Santa Felicidade, o restaurante Jatão vai ser demolido. Além de ocupar uma área ao lado da pista de rolamento a ser ampliada, também está num terreno que será desapropriado para permitir a abertura de uma via paralela - incluída dentro do plano de melhoria do sistema viário - obra na qual serão investidos, no total, Cz$ 75 milhões.
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O Jatão já faz parte do folclore urbanístico de Curitiba. É apontado, inclusive, para os visitantes como um exemplo do kitsch monumental, pois a idéia de reproduzir um avião para, em seu interior funcionar um restaurante foi, desde o início, combatida pelas pessoas de maior senso estético - mas levada até o fim devido à teimosia de seu proprietário.
Aliás, monumentos kitsch não faltam na arquitetura modernosa de Santa Felicidade e o mais recente exemplo é o "Dom Antonio", o maior de todos os restaurantes do bairro gastronômico, em seu formato circular, lembrando até um disco voador - e com capacidade para servir milhares de refeições. A prosperidade dos comerciantes de Santa Felicidade os têm obrigado a ampliar cada vez mais os restaurantes, improvisando soluções que nem sempre são esteticamente felizes - mas que funcionam para aquilo que se propõem: servir toneladas de massas e frangos para milhares de pessoas que ali estacionam por algumas horas todos os dias, ao maio-dia e, especialmente, à noite.
Com o Dom Antonio, a família Madalosso - já proprietária de dois dos mais movimentados restaurantes do bairro - decidiu oferecer um espaço capaz de atender a demanda que cresce cada vez mais. Com um esquema de recepções para casamentos, homenagens e, especialmente, atendendo a muitas empresas turísticas, a família Madalosso tem uma freguesia segura para lotar todos os seus estabelecimentos até 1987. E não só os Madalosso: restaurantes do outrora tranqüilo bairro estão hoje funcionando com sua capacidade total, com faturamento de milhões de cruzados a cada noite.
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Voltando-se ao Jatão, que está fazendo agora suas últimas viagens gastronômicas: quando de sua implantação, a então diretora de urbanismo da Prefeitura, engenheira Dulcia Auriquio, foi radicalmente contra o projeto, inclusive porque uma das asas da construção avançava sobre a Avenida Manoel Ribas. O proprietário do restaurante, teimoso em sua estética kitsch, não teve dúvidas; mandou cortar a metade da asa. Assim ao ridículo projeto original, acrescentou-se mais este dado: é o único avião do mundo maneta - com apenas um pedaço de asa direita.
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Sugestão aos bons fotógrafos da praça: registrem em imagens criativas o monumento kitsch de Santa Felicidade antes que o mesmo desapareça.
Aliás, eis aí uma boa temática para uma mostra ampla. Fotografar todos os elementos kitschs de Curitiba, a começar pelo Edifício Graças a Deus, na Rua XV de Novembro. Material não falta.
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