"A vida" destaca-se entre as três estréias
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 26 de julho de 1991
Apenas três estréias nesta semana de muitas continuações. Em compensação, são três filmes que merecem ser conferidos. No Plaza, apenas nas sessões noturnas (20/22 horas), "armadilhas do Amor" que, finalmente, dá chance de se conhecer no circuito comercial o trabalho de um dos mais elogiados cineastas da nova geração, discípulo de Robert Altman e cujos longas permaneciam inéditos no Brasil: Alan Rudolph. Desde 1977, quando fez "Welcome To L.A", enaltecido pela crítica americana, Rudolph vem sendo bem recebido em suas observações da vida americana e agora chega este seu filme com Tom Berenger, Elizabeth Perkins e Anne Archer.
No Astor, apenas nas sessões noturnas, estréia "Gritos de Revolta" (Miles From Home), cuja maior atração para o público é a presença de Richard Gere, que nos anos 70 foi o galã que teve melhores chances de se tornar um superstar - sem conseguir. O diretor é um novato, Gary Sinise e no elenco está também Kevin Anderson.
A Vida segundo Tavernier - O Cine Luz (5 sessões) inicia hoje a exibição do imperdível filme "A Vida e Nada Mais", de Bertrand Tavernier. A lamentar, no entanto, que o excelente "Jesus de Montreal" seja substituído após apenas duas semanas em cartaz. Uma prova de incompetência da Fucucu que também continua a ofender o público ao programar intervalos de 25 minutos entre uma sessão e outra. É o caso de "A Lua Sangrenta" em exibição no Groff.
Basta lembrar dois dos quatorze filmes que Bertrand Tavernier (Lyon, 25/4/1941) realizou a partir de 1984 para credenciar este La Vie Et Rien D'Autre e como obra imperdível: "Round About Midnight", um clássico sobre jazz. "Un Dimanche a la campagne" (1984), que teve apenas quatro esquálidas exibições no Groff, dentro de um festival do cinema francês. Tavernier é autor também de um documentário recebido com entusiasmo internacionalmente. "Mississipi Blues"(em parceria com o americano Robert Parish), que dificilmente chegará ao Brasil.
Em "a Vida é Nada Mais", Tavernier trabalhando com o roteirista Jean Cosmos, aborda um tema que pode ser transposto ao Brasil recente: mortos sem sepulturas. Ambientado em 1920, duas mulheres, Irene (Sabine Azema, vista em "Melô" de Resnais), uma burguesa e Alice (Pascale Vignal), provinciana humilde, procuram pelos seus homens, dois entre os 350 mil desaparecidos na I Guerra Mundial, cem mil dos quais jamais identificados. Assim, o túmulo do Soldado Desconhecido ao lado do Arco do Triunfo, em Paris, tem a sua razão de existir - e a partir desta simbologia, Tavernier desenvolveu um filme de muita emoção e que, passados 71 anos, conserva intensa atualidade: a estupidez da guerra e o desaparecimento de seres queridos. A ação é concentrada em menos de uma semana (6 a 10 de novembro de 1920), na qual Irene e Alice encontram-se com o comandante Dellaplane (Phillipe Noiret, em seu 100o. filme), chefe do Centro de Procura e Identificação de Militares Mortos e Desaparecidos.
[Deste] encontro de duas mulheres angustiadas pela ausência dos homens que amaram com um militar responsável por uma difícil missão, nasce o clima para uma obra que exige grandes intérpretes e muita segurança na direção. Como fundo deste encontro, um cenário de destruição: o exército exuma em Grezancourt o que restou de um trem sanitário, destruído numa explosão num túnel convertido em túmulo. Famílias de luto, vindas das províncias e misturadas a militares cuja juventude lhes traz sempre uma canção aos lábios, uma malícia no olhar à passagem das moças - mas num momento de tensão: o túnel está afundado e no comboio ainda restam caixas de explosivos e gazes tóxicos que ameaçam aumentar a catástrofe. A fotografia é de Bruno De Keyzer e a trilha sonora de Oswald D'Andrea, um compositor ainda pouco conhecido no Brasil.
LEGENDA FOTO: Philippe Noiret e Sabine Azéma em "A vida e nada mais", no cine Luz a partir de hoje.
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