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Aramis

Carnaval com pouca música (I)

Das 32 agremiações carnavalescas da cidade, pelo menos as 15 escolas-de-samba do primeiro e segundo grupos sairão, amanhã à noite, na Avenida Marechal Deodoro, cantando seus sambas-de-enredo. Aquilo que era uma novidade em 1965, quando o então garoto Paulinho Vitola compôs o primeiro samba-de-enredo, para a então poderosa E. S. Não Agite contar os "Ciclos Econômicos do Paraná", hoje já se tornou comum, mesmo nas agremiações mais modestas. Pena que, em muitas dessas escolas, nem mesmo os integrantes conheçam bem o samba que devem cantar por mais de uma hora na avenida. O público, então, nem pensar! Simplesmente desconhece as letras, eventualmente distribuídas, durante a passagem da escola, em impressos feitos na última hora. Os sambas-de-enredo das escolas de samba de Curitiba dificilmente são divulgadas pelas emissoras da cidade. Até mesmo o belo samba que Gerson Fisbein e Josemar Vieira da Rocha compuseram para a Escola de Samba Portão I - que homenageará os 30 anos de colunismo de Dino Almeida - conseguiu uma gravação e somente em cópias minicassetes é que foi distribuído para alguns prefixos. O único caso de uma escola de samba de Curitiba que conseguiu ter seu samba-de-enredo gravado num disco de distribuição nacional foi a Mocidade Azul. Em 1973, a Top Tape, decidiu investir num disco com os sambas-de-enredo de escolas de vários Estados e a Mocidade Azul representou o Paraná. xxx Embora a Top Tape, etiqueta hoje pertencente à multinacional RCA, tenha, há mais de 20 anos, exclusividade para edição de discos de sambas-de-enredo das poderosas escolas do grupo I-A, no Rio de Janeiro (e as vendas sejam excelentes), até mesmo no eixo Rio-São Paulo, esse novo tipo de música carnavalesca - que a partir dos anos 60 veio substituir as tradicionais marchinhas e sambas também entrou em crise, em termos de produção. Tanto é que houve divisões internas e quatro das grandes escolas do primeiro grupo não participam do elepê da Top Tape, lançado no final do ano passado. Já as escolas de samba do Rio de Janeiro do grupo I-B negociaram os direitos de edição de seus sambas com a Sigla, que lançou um elepê com músicas de dez agremiações - e que permitem apreciar o bom desempenho de alguns puxadores, como Sylvio (no samba "Chuê-Chuá Moronguetá... Cruz Credo", do Arranco do Engenho Novo); e Rico Medeiros, puxando "Felix por um dia", da Escola Lins Imperial. Barreto traz no "gogó" o samba-enredo "Depois do mal Feito, chorar não é Proveito", da E. S. Arrastão da Cascadura, com um tema ecológico, no qual até o fim das Sete Quedas é lamentável, na letra de belas imagens. Em me vesti de natureza/ Me bordei com poesia E num rio de saudade/mergulhei nesta folia Sou eu as Sete Quedas que você seu lá Eu sou o passarinho que contava a flor No segundo grupo, está também o G. R. E. S. Acadêmicos de Santa Cruz, que homenageia o mais famoso colunista social do Brasil, no samba-de-enredo "Ibrahim de Leve eu Chego Lá". Entretanto, o samba de Zé de Angola e Grajaú, que enaltece Sued, não tem a mesma beleza do que Gersinho e Jasomar compuseram para a Escola de Samba Portão I. Infelizmente, o samba curitibano não sairá de nossos limites, porque, apesar de todos os esforços, não foi possível conseguir os Cr$ 4 milhões necessários para prensar o compacto, conforme queria o carnavalesco daquela escola, o publicitário Roberto Fonseca. O chamado Carnaval da Democracia faz com que muitas escolas de samba do Rio de Janeiro (como em outras cidades) abordem temas políticos. Por exemplo, a Unidos da Luca, do Grupo B-1, com "Essa Gente Brasileira" reclama bastante na letra de Cosminho Magnata, Altair Cardoso e Zebinho Barros. Quem sou eu/Quem vem lá! Brasileiros reclamando seu direito de votar Precisamos lutar por um dia melhor Deste povo sofrido devemos ter dó Crise do desemprego/Em nosso dia a dia Já não como/não durmo, vivo na agonia Na esperança de ver um Brasil bem maior Sem a dívida externa pro povo pagar Numa prova de que o samba-de-enredo não é privilégio carioca, há vários anos que as escolas de samba de São Paulo também o exalta em seus discos carnavalescos, assim como Porto Alegre. O elepê dos sambas das escolas gaúchas saiu, este ano, pela Sigla, numa produção do sempre atuante Ayrton dos Anjos, responsável pela realização de mais de 200 elepês, naquele Estado. O disco abre com "Viagem ao Mundo das Ilusões" (Jorge Carioca), samba-enredo dos "Bambas da Orgia", que busca o tricampeonato. Destacaram-se, ainda, "Salve, Salve Jorge Maravilha" (Waldir Alves), homenagem do Império da Zona Norte a Jorge Ben, e "Gosto de gostar de quem gosta de samba" (Afonso Soares), samba-enredo dos Embaixadores do Ritmo. Tradicionalmente, a Rozemblit/Mocambo dava sinal de vida, ao menos no Carnaval, lançando discos de frevos. Este ano, a crise daquela indústria fonográfica do Recife chegou a tal ponto que nada editou. Em compensação, a Som Livre reuniu as músicas premiadas num festival de música carnavalesca, na Capital pernambucana - o consagrado "Frevança" - que nos últimos seis anos tem revelado valores e renovado o repertório regional de carnaval sempre com bons frevos e maracatus. Neste anos, os destaques maiores ficam para o frevo-canção "Sem você eu me dano" (Severino Luís de Araújo), primeiro lugar na categoria e interpretação por Ivanildo Silva e Coral Vozes de Olinda: o frevo de bloco "Bloco para Antônio Maria" (Fernando Azevedo/Fernando Gama), com Coralito; e, "Frevança" (Jorge de Altinho), com o autor. Outro disco que mostra o carnaval pernambucano é o que nos traz o excelente cantor Claudionor Germano, o mais popular intérprete das noites do Recife. Num belo elepê ("O Bom do Carnaval"), ele reúne desde o frevo rasgado ao frevo canção, passando por músicas como "Mestre Leviano" (Luís Bandeira) e "Quando o Frevo Esquentar" (Manuel Gilberto).
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
15/02/1985

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