Sambas para escolas dá milhões a compositores
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 25 de janeiro de 1986
A edição de sambas-de-enredo das Escolas de Samba do Rio de Janeiro tornou-se um mercado tão lucrativo que o pau comeu nos últimos anos. Este ano a questão foi para a justiça, o lançamento dos discos foi retardado e, como resultado, a Top Tape - que foi a primeira etiqueta a perceber este filão - rompeu com a Associação das Escolas de Samba. Com distribuição da RCA, saiu o elepê da Liga Independente das Escolas de Samba do Rio de Janeiro, reuindo a Mocidade Independente de Padre Miguel, Vila Isabel, Portela, Império Serrano, Imperatriz Leopoldinense, Estação Primeira da Mangueira, Império da Tijuca, Unidos da Ponte e Unidos do Cabuçu - misturando assim escolas do primeiro e segundo grupo. As escolas dissidentes partiram para uma outra produção fonográfia, que, até a semana passada, não havia sequer sido comercializada nas lojas fora do Rio de Janeiro.
O grande mercado dos discos com Sambas-de-Enredo está no Rio, naturalmente. As vendas são impressionantes e hoje os compositores que têm sambas escolhidos por uma Escola praticamente acertam na loteria: entre direitos fonomecânicos e autoriais, faturam mais de Cr$ 100 milhões. Não é, portanto, sem razão que a tão falada comercialização do Carnaval - explorado como a maior fonte de renda do turismo carioca - atingisse em cheio também a parte musical, o que, no entender de analistas e críticos, prejudicou a qualidade artística.
O maná dos discos de sambas-de-enredo não fica apenas para as grandes escolas: as do segundo grupo, bem como blocos, também fazem seus LPs, em diferentes etiquetas ou, nestes últimos anos, partindo até mesmo para produções independentes. Em São Paulo, desde os anos 70, os sambas-de-enredo das Escolas de Samba - do primeiro e segundo grupo - também ganham registro fonográfico especialmente através da Continental, o mesmo ocorrendo, já há 4 anos, em Porto Alegre, com produções da RSB-Sigla.
Em Recife, durante anos a hoje falida Resemblite, teve na edição de elepês com música de frevo - grande característica do carnaval pernambucano - sua sustentação comercial. Hoje, são poucos os discos de frevo que aparecem - e estes, infelizmente, raramente chegam ao Sul. Em outros Estados, em produções menores, também acontecem registros eventuais de músicas de escolas-de-samba ou blocos.
No Paraná, só em 1973, quando a Top Tape produziu um disco com faixas representativas de escolas de samba de vários Estados, ouve a inclusão de um samba-enredo da Mocidade Azul. Normalmente, apenas duas ou três de nossas escolas conseguem fazer a gravação dos sambas que apresentam na avenida em fitas cassete, distribuídas a rádios da cidade. Mas que, infelizmente, não têm a divulgação merecida.
Entre 1980/82, quando a Secretaria da Cultura e Esportes do Paraná era dirigida com competência, promoveu duas edições do concurso de músicas carnavalescas "Abre Alas", coordenado por Cláudio Ribeiro - e que resultaram em compactos com os sambas e marchas vencedores. No infeliz Governo José Richa, apesar de todo o proselitismo populista, nada mais foi feito.
OS SAMBAS... AS MARCHINHAS - Descontadas isoladas e idealistas tentativas de reviver os sambas e marchinhas carnavalescas - mesmo através de competições via televisão ou produções de elepês mais sofisticados - um fato é definitivo: a música de Carnaval, na forma com que se conheceu por mais de 60 anos, extinguiu-se em si mesma. O que se canta são os sucessos de 40, 30 ou 20 anos passados - somados àquelas músicas, de gêneros diversos, que lançadas no meio do ano, por diferentes intérpretes, caem no gosto do público. Para desenvolver este tema, haveria necessidade de um espaço imenso e digressões histórico-sociológicas que o nosso espaço dominical não comporta.
Assim, como mudaram as regras do jogo carnavalesco - em termos de organização as escolas, desfiles, interesses comerciais etc., também modificou-se o panorama musical. Os sambas-de-enredo deixaram - ao menos no Rio de Janeiro - de serem cantados apenas pelos integrantes das escolas e passaram a ocupar um espaço maior. Puxadores de sambas, como Neguinho da Beija-Flor e Dominguinhos do Estácio, promovidos pelos veículos de comunicação, ganharam espaços próprios e, neste ano, saíram com seus lps-solos.
De tudo isto - e aprendendo a entender o comportamento e modificações sócio-artísticas de uma festa popular - o importante é que o Carnaval continua. E como dizia um velho samba cantado por Jair Rodrigues:
O importante é ser fevereiro
e ter carnaval
para a gente sambar...
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