De filmes, vídeos & gente que (ainda) crê na arte
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 24 de novembro de 1990
Reflexo mais do que evidente da situação de penúria de quem faz cinema no Brasil: ao contrário dos anos anteriores, a delegação brasileira no Festival de Cinema Livre de Havana, que inicia no próximo dia 4 prolongando-se até 17, será reduzidíssima. Embora 13 curtas e 4 longas tenham sido selecionados por Cosme Alves, para participarem do maior Festival das Américas, poucos diretores estão dispostos a arcar com as despesas mínimas (ao redor de US$ 1.500) para viajar a Cuba (o Festival oferece hospedagem, mas passagens e outras despesas ficam por conta dos participantes, exceto convidados especiais - jurados, dois ou três jornalistas).
"Stelinha", de Miguel Borges; "Barrela", de Marcos Cury; "Natal da Portela", de Sarraceni e "Césio 134", de Roberto Pires. Os outros selecionados foram: "Curta a Lapa", de Marcelo Serra; "Adeus", de Celso d'Elia; "Festa do Casamento", de Sérgio Silva; "O Vendedor", de Alberto Salvá; "O Macaco e o Candidato", de Henrique Freitas Lima; "Suspenso", de Carlos Adriano; "A Coisa Mais Importante", coletivo gaúcho; "Memória", de Roberto Hakim; "Lambada", de Guido Araújo; "Nhanderu", de Sérgio Peo; "Mulher Marginalizada", de Tuna Espinheira; "Ilha das Flores", de Jorge Goulart (já premiado com o Urso de Prata em Berlim, fevereiro/90) e "Anil", de Fernando Belens.
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Do júri participarão Ana Carolina (ficção), José Louzeiro (roteiro), Siron Franco (cartaz). Dona Lúcia Rocha, que finalmente conseguiu instalar num casarão do Bortafogo o memorial "Tempo Glauber", reunindo o acervo do diretor de "A Idade da Terra", também vai a Cuba, participar de mais uma homenagem ao seu filho.
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Bastante desigual o nível dos curtas-35mm que disputaram a premiação. Houve trabalhos pretensiosos intelectualmente (e frustrados no final) como "Aquarela", de Alvarina Silva. Um dos mais tradicionais pontos do Rio, "Curta a Lapa", de Marcelo Serra - com a participação de Mariana de Moraes (neta de Vinícius) e Paulo Villaça -, tem um sentido simpático de preservação urbana. "Cristo Procurado", de Rui de Oliveira, produzido por seu irmão Denoy, filme de animação, com belíssima criação das imagens e uma bela mensagem, foi um dos mais aplaudidos pelo píublico que também, com entusiasmo, recebeu "A Paisagem Natural", de Wladimir de Carvalho, digno de figurar no acervo da National Geographic pela beleza das imagens capturadas do Brasil central. Este curta fez parte de "Brasília, a Última Utopia", produzido pelo governo do Distrito Federal em 1989.
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Os gaúchos, como sempre, com uma presença vigorosa: além de "Festa de Casamento", de Sérgio Silva; "Mazev Tov", de Jaime Lerner e Flávia Sellgman - que havia participado do Festival de Brasília (no qual "Memória", de Roberto Hakim, foi o grande premiado, e portanto aqui veio para encerrar a programação), tiveram mais três trabalhos em disputa: "A Coisa Mais Importante da Vida", realização coletiva dos alunos da Casa de Cinema; "O Macaco e o Candidato", de Henrique Freitas Lima e "O Corpo de Flávia", de Carlos Gerbase. "Manhã", dos catarinenses Zeca Nunes e Norberto Depizzolati, de Florianópolis, também entrou na competição.
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Palito, embora satisfeito com a simpatia com que seu "Lápis, de Cor e Salteado" foi recebido na competição em 16mm, não escondia suas críticas à seleção em 35mm: para ele, seu amigo Elói Ferreira foi injustiçado por ter "Vamos Juntos Comer Defunto", 35mm, rodado em Curitiba, cortado pela comissão de seleção, "O filme do Elói era dez vezes melhor do que muitos dos curtas que aqui concorreram", reclamava.
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Alguns filmes, iniciados entre 1988/89, talvez sejam concluídos nos próximos meses - o que poderá, com muita boa vontade, viabilizar pelo menos o Festival de Gramado, já marcado para maio. Roberto Farias, ex-presidente da Embrafilme, agora contratado do SBT, para atuar na área de telenovelas, garante que o longa de estréia de seu filho, Mauro, está com as filmagens concluídas e agora o auxilia na montagem. O título que ainda não foi definido: "O Inútil" foi o primeiro "nome de trabalho" mas depois surgiram dois outros "O Playboy, Sua Amante, o Gordo e o Traficante" e "My Sweet Little Mag". No elenco, a gorda Eliana Fonseca (diretora de "Frankenstein Punk"), a badalada Sílvia Pfeifel, o ex-beatle Evandro Mosquera. Os outros filhos de Roberto Farias - que foi o último presidente do Concine - também já fizeram filmes: Lui ("Com Licença Eu Vou à Luta" e "Lili Carabina, a Estrela do Crime") e Maurício ("A Espera", média- metragem inspirado em Roland Barthes).
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O espaço dominical que reservamos ao vídeo será espalhado em colunas no domingo da próxima semana. É que há tantas novidades na área, entre o que deu para conhecer nas mostras paralelas (e mesmo competitivas) do RioCine, que justificam uma atenção maior. Em especial o corajoso vídeo "Pedra Podre", realizado por quatro jovens - Evelise Silva, Lígia Girão, Stela Grisotti e Walter Behr -, denunciando a precariedade do sistema de segurança da usina nuclear Angra I. Na segunda-feira passada, 18, o vídeo teve projeção num espaço diferente: no show coordenado por Gilberto Gil no Circo Voador para fazer caixa na campanha de Jorge Viana, candidato do PT ao governo do Acre.
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Na Primeira sala comercial de vídeo do Brasil - a Magnetoscópio (Shopping Center Copacabana, Rua Siqueira Campos, 143 S/30), foram apresentados vídeos interessantíssimos, vindos de vários países - que também tiveram projeções em horários diversos no Centro Cultural Banco do Brasil e Cinemateca do MAM. Na quinta-feira, a sala ficou superlotada para conhecer as avançadas propostas visuais da israelense Irit Batsry, radicada em Nova York. Bonita, simpática, vestindo maxi-saia - apesar do calor -, Irit foi uma das poucas personalidades internacionais, curtida ao menos entre os videomakers, a circular bastante nos salões do Hotel Glória, sede do Festival. O videomaker curitibano Werner Schulmann com seu inglês acaboclado fez boa camaradagem com Irit, que gostou do cartaz de "De Bonna - Cara Palavra" e lamentou não poder ver o vídeo. Schulmann esqueceu de levar uma cópia em VHS, que poderia mostrar de forma informal no telão do bar.
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João Luiz Vieira, curador da Cinemateca do MAM, após ter conhecido no Festival de Nova York os trabalhos do realizador venezuelano Diego Risquez, empenhou-se para que viesse ao RioCine. Alto, loiro, parecendo mais um ator dos filmes de Visconti, Risquez trouxe as cópias (ampliadas para 35mm) de seus três filmes rodados originalmente em Super 8 e que compõem o épico sobre a história de seu país: "Orimoko, Nuevo Mundo", "Amerika, Terra Incógnita" e "Bolívar, Sinfonia Tropical". Longos, um pouco arrastados em sua narrativa, os filmes do realizador venezuelano não têm diálogos.
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No telão do Bar Tropical, na madrugada de terça-feira, um vídeo fez os petistas vibrarem:"Lula Quase Lá/Dias de Euforia", de Rita Moreira, documentando a campanha à Presidência da República a partir de material original gravado em VHS e imagens cedidas por diversas fontes - e no qual é feita também uma recapitulação da história do Brasil.
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Embora competindo na mostra nacional, VHS, com "As Crianças Não Choram" - e portanto convidados do Festival -, Pabla Alessandra e Jorge Brunetti, de Curitiba, não vieram. Ou ao menos, ninguém os viu circulando pelo Festival.
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Em época de crise, realizadores buscam trabalhos alternativos. O sempre simpático e estimado Bigode (Luís Carlos Lacerda), diretor de "Leila", foi convidado para fazer um clip para promoção do primeiro lp da cantora Cássia Eller, convenceu a Polygram que ao invés de um repetitivo clip (que, como diz Jô Soares, é música para surdo) o melhor seria investir numa média, para televisão e circuito paralelo. Proposta aceita, o filme - com participações amáveis de alguns artistas (inclusive Marcélia Cartaxo) - está sendo rodado em pontos turísticos do Rio de Janeiro.
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Como "Vlado" está longe de se tornar realidade, João Batista de Andrade modifica os planos a curto prazo. Aceitou o convite da produtora de Chico Botelho para fazer um curta sobre arte mineira do império, patrocinado pelo Grupo Itaú. Só veio para o final do Festival, quando foi exibido "Solo de Violino", co-produção com Portugal com a empresa de sua esposa, Assumpção Hernandez. Reconhecida como uma das mais organizadas produtoras executivas do cinema brasileiro, Assumpção desativou, a curto prazo, projetos para novos curtas - apesar das premiações que "Arabesques", de Eliana Caffé obteve. Um curta está custando uma longa nota e o mercado mais do que nunca inexiste", justifica.
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