Fafá, o canto afinal (depois da política)
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 14 de setembro de 1986
Afinal Fafá de Bélem (Maria de Fátima Palha Figueiredo, Belém), chegando aos 30 anos - completados no último dia 10 de agosto - decidiu parar de badalar politicamente e dar um pouco atenção a sua carreira.
Catapultuada [alçada] ao sucesso há 10 anos, transformada em sex symbol por uma discutível promoção sócio-etílica, sua carreira quase foi para o brejo. Vítima de empresários irresponsáveis, falhando em compromissos (só em Curitiba, deu dois canos lendários no público que desejava aplaudí-la no Guaíra), um casamento desfeito, experiências com drogas (que agora combate), Fafá agarrou-se na campanha das Diretas. Mesmo com estigma de se ter transformado numa espécie de Urubu Canoro, acabou ganhando uma projeção mais político-promocional de que artística. Da forte, afinada e marcante cantora do final dos anos 70, decaiu para uma intérprete ridícula, mal produzida e chegando até a apelação ufanista de gravar o "Hino Nacional".
Finalmente, freando tanta irresponsabilidade musical, Fafá retorna agora num elepê ao menos digno de ser ouvido. Não deve ter sido fácil contornar seus arroubos político-promocionais e fazê-la entender que mais do que o momentâneo poder peemedebista (que ela tanto cultiva e aproveita) é usar a sua bonita voz em um repertório bem escolhido, com bons arranjos. Max Pierre e Ana Sabugosa, produtores de "Atrevida" (Sigla/Som Livre, agosto de 1986), conseguiram fazer com que a cantora Fafá retornasse num elepê equilibrado, com bons arranjos e um repertório de alguns momentos inspirados - especialmente graças às músicas de Ivan Lins - uma surpreendente parceria com Maysa (1936-1977), guardada por tantos anos ("Pra não mais voltar"), "Coração de Isopor" (parceria com Lincoln Olivetti, Vitor Martins e a própria Fafá), mais "Minha Estrela" e "Atrevida", com Martins. Ivan sempre foi um compositor de vigor, com momentos inspirados e estas suas quatro contribuições valorizam este retorno de Fafá, que, como boa paraense, também buscou um reencontro de origens e a simplicidade com gravações de Lambadas da sua terra incluindo até um trecho de "A Carta", de Carlos Santos, o intérprete mais popular da região Norte.
Como não poderia faltar um toque de sensualidade - marketing que Fafá busca sempre sem seus discos - regravou "Cavalgada" (Erasmo-Roberto Carlos) e para completar bem a versão de uma bela música de Marvin Hamlisch/Carole Bayer Seger: "Meu Homem"
Comparado ao lamentável disco que fez no ano passado, este "Atrevida" mostra que nem tudo está perdido para Fafá. Ao contrário, agora com a cabeça no lugar, conscientizando-se, de que mais do que palanques do poder temporário, vale sua força vocal, há muito a ser feito em termos musicais. Potencialidades para tanto ela tem. É só uma questão de administrar o seu talento, sem cair em piroquetas e modismos para ficar nas primeiras páginas dos jornais como "A Musa das Diretas".
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