Festivais musicais precisam de raízes
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 19 de setembro de 1985
Após uma interrupção de seis anos, voltou a ser realizado, no ano passado, o festival de música popular de Pato Branco. Dedicado especialmente aos talentos locais, o evento só proporcionou uma área competitiva em interpretação e a repercussão do festival não passou dos limites do município. Agora, entretanto, o deputado Nilso Sguarezzi, presidente da Assembléia Legislativa e político daquela região, dispõe-se a auxiliar a promoção, encarregando Almir Dalla Costa (chefe de gabinete do parlamentar) para ajudar os organizadores. Com isso, a promoção poderá fortalecer-se e encontrar repercussão estadual, a exemplo do que acontece com o Fercapo, em Cascavel, já na 14a edição e hoje o festival mais importante do Estado.
Em Maringá, 30 canções disputarão, entre 26 e 27 do corrente, o Vlll Festival de Música. São compositores do Norte do Estado, em busca dos pequenos prêmios oferecidos.
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Festivais de música popular continuam a multiplicar-se pelo Estado e pelo Brasil, mas os resultados são mínimos. A festa é bonita, há muita animação nas apresentações e até canções interessantes. Passada a euforia da hora., entretanto, pouco ou nada fica, porque até os próprios autores esquecem as músicas que defenderam.
A falta de uma estrutura que pudesse converter essas idealísticas e generosas promoções em eventos culturais de maior suporte e, especialmente, ao menos preservar em gravações as músicas que chegam à finalíssima é uma das maiores falhas. O festival de Pato Branco custará quase Cr$ 200 milhões
(o Fercapo passou dos Cr$ l50 milhões), mas não foi prevista sequer a gravação de um compacto simples, com as 5 músicas premiadas, o que, afinal, não custaria mais do que Cr$ 25 milhões, que poderia ser autofinanciável, através de um patrocinador comercial ou, mesmo, com a venda dos exemplares.
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Enquanto os festivais realizados no Paraná se esgotam na manhã seguinte ao encerramento, no Rio Grande do Sul o vigoroso movimento nativista, com ao menos uma dúzia de excelentes festivais, conta com uma auto-sustentação que os torna independentes do governo do Estado. O mais consagrado dos festivais gaúchos, a Califórnia da Canção Nativista, em Uruguaiana, a caminho da 16a edição, na primeira quinzena de dezembro, está preservada numa invejável coleção de discos. Agora, em iniciativa do CTG Sinuelo do Pago, organizador da promoção, associado à Sigla/RBs, será editado um àlbum com as 12 melhores músicas de todas as Califórnias, conforme indicações de críticos, pesquisadores e jornalistas identificados com a música nativista.
Em Carazinho, também no RS, onde acontece a Seara da Canção Nativista, haverá, em outubro próximo, paralelamente a uma nova edição desse festival, um "Chamamento Cultural ", organizado pelo professor e cantor Edson Otto, diretor do Instituto Gaúcho de Tradição e Folclore do Rio Grande do Sul, com a participação de pesquisadores de vários Estados. Serão discutidos tradicionalismo e regionalismo, com o enfoque de questões de identidade cultural - não só do Rio Grande do Sul, mas dos Estados vizinhos.
Edson Otto veio duas vezes ao Paraná, nas últimas semanas: compareceu a um evento tradicionalista, em Campo Mourão e como convidado especial, esteve na Semana Farroupilha, em Cascavel, iniciada no último dia 15, em promoção do Centro de Tradições Gaúchas do Oeste. Otto ficou entusiasmado com o nosso movimento tradicionalista que, infelizmente, até hoje não conseguiu refletir sua expressão em eventos musicais de maior repercussão, restritos apenas à área dos CTGs, ao contrário do que acontece nas cidades gaúchas (Uruguaiana, Santa Rosa, Santa Maria, Cruz Alta, etc.), nas quais os festivais nativistas se firmaram como grandes eventos culturais-turísticos de cada município.
O Fercapo, porque promoção de um clube classe "A "de Cascavel, o Tuiuti, sempre bloqueou qualquer tentativa de participação de artistas regionais. Ao contrário, bons valores da região se afastaram do festival, voltado para a música urbana. Assim, tanto o prefeito Fidelcino Tolentino, paulista de nascimento, mas sensível à cultural popular, como Edgar Bueno, proprietário da maior loja de discos da cidade e atual presidente da Associação Comercial e Industrial de Cascavel, pensam, seriamente, na promoção de um festival de música nativista naquela cidade. Afinal, há público (os discos nativistas vendem milhares de cópias), compositores e intérpretes na região e caberia, perfeitamente, um evento bem organizado, que pudesse deitar raízes. A ida do folclorista Edson Otto a Cascavel já foi um passo significativo.
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Pato Branco, no Sudoeste, a exemplo de Cascavel, também é centro de colonização gaúcha e poderia igualmente assumir uma identidade nativista. Mas, na primeira fase dos festivais ali realizados, até músicas com letras em inglês chegaram a ser aceitas em um ano no qual uma das favoritas acabou com um verdadeiro happening no palco (a música falava no diabo e o cantor usou fantasia com tridente e tudo o mais). Agora, espera-se que haja uma volta às raízes brasileiras - e por que não? - regionais. Só que a grande atração, contratada para o festival (dias 13 a 15 de dezembro), é o baiano Moraes Moreira. Famoso, simpático, mas, convenhamos, não tem nada a ver com o Paraná. A não ser, claro, as parcerias com o poeta Paulo Leminski.
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