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Aramis

E nos curtas estão os grandes temas sociais

Enquanto os longa-metragens ganham uma natural promoção pelo fato de fazerem carreiras comerciais, os curtas e médias são, infelizmente, condenados a um tratamento perverso. Representam o esforço de realizadores que se empenham em levar à tela as visões dos mais diferentes aspectos da realidade - ou mesmo na ficção (embora seja difícil contar uma estória no limite de 15 minutos), são produzidos com inúmeras dificuldades (especialmente financeiras) e, no final acabam ficando restritas e exibições confinadas no circuito paralelo, sem chegar ao grande público. Embora o processo comece a se reverter - com a obrigatoriedade da projeção de curtas em complemento as sessões de filmes estrangeiros nas cidades com mais de 200 mil habitantes - ainda há muito campo para ser trilhado, conforme observamos ontem. Portanto, foi significativo que os diretores do II Festival de Fortaleza do Cinema Brasileiro, cineastas Pedro Jorge de Castro e Jefferson Albuquerque Jr. - abrissem um grande espaço para os curtas e média-metragens. Se com isto, ali estiveram 7 dos mais interessantes filmes da safra 86/87 do cinema brasileiro ("Fronteira das Almas", de Hermano Penna; "Ele, o Boto", de Walter Lima Jr.; "O País dos Tenentes", de João Batista de Andrade; "Um Trem Para as Estrelas", de Cacá Diegues; "A Cor do Seu Destino", de Jorge Duran e "Jubiabá", de Nelson Pereira dos Santos), para os curtas e médias houve uma premiação especial. O bom nível dos filmes nesta categoria, em competição, valorizou ainda mais a concessão dos troféus "Samburá" e "Abrão Benjamin" a curitibana Berenice Mendes, para seu "A Classe Roceira", contundente documentário sobre os sem-terras, rodado durante a Semana da Pátria, há dois anos. A questão da terra - corajosamente tratada nos longas "Fronteira das Almas", de Hermano Penna e "A Igreja dos Oprimidos", de Jorge Bodanski e Helena Salem (exibido hors concours), mas também examinado num curta em que o maranhense Murilo Santos juntou o cinema de animação ao documentário para denunciar o assassinato do líder Eduardo Elias da Silva (1942-1982), presidente do Sindicado dos Agricultores de Santa Luzia - mostrou como temas sociais da maior atualidade, podem e devem ser denunciados em imagens. O carioca Paulo César Farah, 42 anos, funcionário da FUNARTE, no Rio de Janeiro, realizou um tape sobre os conflitos da terra na praia de Canoa Furada, que se localiza a 140 km de Fortaleza. Belíssima praia, na qual viviam cerca de 300 famílias de pescadores até 1979, Canoa Furada passou a ser ameaçada pela especulação imobiliária a partir do interesse que um grupo financeiro do Ceará (Empresa Machado Correa Empreendimentos Imobiliários) mostrou pela área, num processo de corrupção envolvendo a prefeitura de Puatingia. O tape que Farah realizou nas duas vezes em que ali esteve torna-se um documento importante, mostrado aliás nesta semana em Brasília e que será levado a outros Estados. Mesmo fugindo da categoria de cinema em negativo, "Canoa Furada", em suas duas projeções paralelas, foi mais um grito de alerta em denunciar uma situação praticamente desconhecida de todos. Outro exemplo de denúncia foi a que o alagoano Almir Guilhermino fez em seu contundente "Tana's Take", rodado numa das mais belas cidades históricas do Nordeste: Marechal Deodoro. Usando uma atriz profissional - a expressiva Regina Dourado (principal intérprete de "Tigipió", primeiro longa de Pedro Jorge de Castro), o filme mostra a colonização cultural trazida pela televisão nas pequenas comunidades.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
15/08/1987

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