Os sinais da morte nos ventos da contaminação
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 10 de agosto de 1986
Aparentemente pouco "Vento Sul" (cine Ritz, hoje último dia em exibição mas a partir de amanhã no Luz) e "Sinal de Perigo" (cine Plaza, também últimas exibições nesta quarta-feira), tem em comum.
Realizados por jovens cineastas - Hal Barwood, de "Warning Sign" em seu primeiro longa-metragem; o baiano José Frazão em seu segundo longa, mas o primeiro praticamente inédito ("J.S.Brown, o Último Herói", 1979, nunca obteve lançamento comercial), - estes dois filmes, injustamente esquecidos pelo público, levantam questões atualíssimas, diariamente nas páginas dos jornais, rádio e televisão: a contaminação do meio ambiente.
O roteiro de Hal Barwood/Matthew Robins em "Sinal de Perigo"tem características que seriam uma ficção-científica se a realidade não fosse tão ameaçadora neste final de século e já transforme aquilo que se vê na tela como um terrível documentário de antecipação: por trás de uma empresa multinacional de defensivos agrícolas, numa região isolada dos Estados Unidos, desenvolvem-se terríveis pesquisas para a guerra bacteriológica. Um prosáico acidente contamina cientistas, pesquisadores e funcionários e o efeito letal da droga pesquisada provoca a morte de dezenas de pessoas. Mesmo com aparente happy end, o final é amargo: aquela ficção (ou antecipação) terrível pode estar acontecendo agora mesmo, em qualquer parte do mundo.
Baiano da região cacaueira, José Frazão, 34 anos, é jornalístico no desenvolvimento de seu "Vento Sul". E através de duas jornalistas - Íris (Maria Padilha) e Sandra (Denise Bandeira), constrói um misto de "Caso Especial" com triller de suspense para mostrar a ação de multinacionais da indústria de agrotóxicos no interior da Bahia - e os riscos de uma contaminação cada vez maior do meio ambiente.
Partindo de uma investigação sobre os vampiros do comércio de sangue na Baixada Fluminense - assunto, aliás, já corajosamente denunciado por Sergio Rezende em seu corajoso "Até a Última Gota" - a jornalista Iris acaba se integrando a uma outra reportagem denúncia, que havia levado uma sua colega, Sandra, a ter que deixar o Brasil e viver em Paramaribo, capital do Suriname (por sinal, pela primeira vez focalizada num filme). Com um bom aprendizado no longa-metragem (foi assistente em várias produções importantes) e alguns elogiados curtas, Frazão construiu um filme desses, com uma linguagem viva e que, dentro de uma linha corajosa na abordagem de problemas do meio ambiente, ombreia-se ao corajoso "DDD - Dose Diária Aceitável", média-metragem, de Frederico Füllgraff - filme com o qual, aliás, esteve no festival de cinema ecológico de Royan, na França, no ano passado.
Tanto "Sinal de Perigo" como "Vento Sul", são obras de cineastas que ainda não tem o domínio total da linguagem cinematográfica - mas que oferecem, em compensação, a coragem e o vigor de levantarem questões atualíssimas. Se o cinema americano, bissextamente vem tocando em temas incômodos - como os riscos de acidentes nucleares (remember "A Síndrome da China", que estreou poucos dias antes da tragédia de Theree Miles Island), no Brasil, até agora, poucos foram os que levantaram a questão da contaminação do meio ambiente, dos interesses multinacionais que cercam experiências e uso de agrotóxicos de resultados perigosos.
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