Os trinta anos de uma gravadora. Brasileira
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 16 de agosto de 1988
Trinta anos de resistência. Eis uma epígrafe que poderia ser aplicada aos aniversários de suas empresas que identificam a produção fonográfica no Brasil - e que transcorre neste mês. Numa área de indústria cultural no qual os grandes multinacionais sempre dominaram, os 30 anos que a Companhia Industrial de Discos está comemorando agora - e de fundação da Chantecler, que transcorre nesta terça-feira, 16, sem qualquer lembrança, encontra-se um pouco da história da própria músic brasileira, como produto cultural e de consumo.
Os 30 anos da Chantecler - hoje apenas em selo do grupo Continental - não tiveram qualquer comemoração especial, mas as três décadas da CID, estão sendo lembradas. Na última sexta-feira, numa rápida passagem por Curitiba, o vice-presidente executivo Harry Zuckermann, 43 anos, reestruturou com Silvio Meirelles (SC) e Laércio Machado (PR), a presença deta marca no Sul e para marcar a efeméride, o lançamento de uma coleção de cinco discos clássicos, nos quais nomes famosos fazem didáticas narrações da obra de cada compositor: Chopin por Arthur Moreira Lima; Mozart pelo tenor Paulo Fortes; Beethoven pelo maestro Isaac Karabitchevski; Villa Lobos pela atriz Aracy Balabanian e até Fernando Bicudo, ex-diretor de ópera de ballet, narrando a vida de Wagner. Ao lado das introduções a vida e obra de cada um destes autores, a montagem dos álbuns foi feita com excelente fonogramas reunindo orquestras como Volksoper de Viena, Sinfônicas de Nuremberg e Cincinatti; Orquestra de Ópera Estadual de Hamburgo; Filarmônica de Londres - ao lado de solistas como o pianista Cláudio Vettori e o canto de Leda Machado Luís e Ataíde Beck no álbum dedicado a Villa-Lobos.
Na criação desta coleção a participação do curitibano Roberto Mugiatti, que elaborou textos e, junto com sua esposa, a fotógrafa Lena, fez as capas.
Um projeto desenvolvido ao londo de dois anos - e reservado por Zuckermann para marcar os 30 anos de fundação da CID. Um segundo pacote já está programado para 1989, desta vez focalizando Strauss, Tchaikowsky, Verdi, Carlos Gomes e Back.
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Possuindo um dos quatro únicos parques industriais de prensagem de discos no Brasil, no bairro de Bonsucesso, no Rio de Janeiro, a CID não é só a gravadora que mantém catálogo em atividade - aproximadamente 700 entre quase 2 mil títulos que já editou - como tem conseguido driblar as crises sazionais - mesmo as mais rigorosas que se abatem sobre o setor - com uma estratégia especial: oferecendo os produtos aos preços mais competitivos, tem seus pontos de venda basicamente em supermercados e lojas de departamentos - só trabalhando com lojas especializadas selecionadas cuidadosamente. "Nossa estratégia foi a de chegar a um público de massa, com produtos que custando até CZ$ 700,00 a unidade - quando normalmente o elepê já ultrapassa os CZ$ 2 mil - alcança uma faixa bem mais ampla", explica Paulo Kresch, 49 anos, diretor comercial - e qua acompanhou a Zuckermann em sua vinda a Curitiba.
Arnaldo Lotti, superintendente da região Sul, expõe um raciocínio lógico:
- "A indústria fonográfica sofre, mais do que qualquer outra, as crises econômicas. Considerando ao mesmo tempo um produto cultural, sofisticado e atraente, mas também supérfluo - há riscos constantes em termos empresariais. Assim, a manutenção de uma catálogo extenso, com produtos que vão do comercial ao artístico, é uma opção de atingir maior público."
Com a experiência de quem cresceu dentro desta indústria fonográfica, Harry lembra que seu pai, Hermann, recentemente distinguido pela Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro com o título de cidadão carioca, após ter sido um dos pioneiros numa indústria de montagem de aparelhos de televisão no Brasil - a Emerson TV, no final dos anos 40 - assumiu uma pequena e precária indústria de prensagem de discos, que nos primeiros anos apenas produzia discos para terceiros. A primeira experiência da CID em ter seu próprio catálogo foi uma coleção destinada às crianças - a Carrossel, com produção de Paulo Tapajós - na linha do que João de Barro (Braguinha) havia feito, anos antes, na coleção Disquinho, da Continental. Sem deixar de prensar discos para várias etiquetas, a partir se 1970 a CID - já com os filhos de Hermann Zuckermann, Harry na área comercial e Rodolfo, 48 anos, no setor industrial - passou a formar um catálogo - com nomes importantes como de Nana Caymmi, Emílio Santiago, Bezerra da Silva, Chico Anísio (com os Baianos e Caetanos e Azambuja & Cia), Miltinho, Victor Assis Brasil, Moreira da Silva, Abel Ferreira, etc.
- "Muitos destes artistas passaram para outras gravadoras, quando tiveram propostas que não podiam arriscar a cobrir " - diz Harry, cauteloso na empresa - que, por mais de uma vez, também trouxe marcas internacionais, inclusive da 20th Century Records.
Agora, a CID está lançando o elepê "Mindnight Sun", com Flora Purin - produção de Airto Moreira, originalmente produzida para a Sigem (ligada ao sistema Globo), paralelamente ao excelente grupo Azymuth, formado por José Bertrami/Alex Malheiros/Ivan Conti - mais conhecido até hoje nos EUA do que no Brasil.
- "São dois exemplos de lançamentos jazzísticos, que sugerem agora, num momento em que este gênero encontra novos estímulos com promoções bem estruturadas como o Free Jazz, em sua 4º edição."
Harry Zuckermann, um record man seguro em seus projetos, já fez algumas edições de intérpretes e grupos regionais. Em sua passagem por Curitiba deixou o representante local, Laércio Machado, incubido de sondar o mercado e sugerir produções regionais.
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