Rita Lee, rock vovó com garra
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 12 de fevereiro de 1989
Na linha dos que já fizeram (sem cumprir) no passado Sílvio Caldas e Frank Sinatra, a roqueira Rita Lee (Jones), 41 anos - completados no último dia do ano, paulista da capital, também ameaça uma precoce aposentadoria. O que seria uma pena pois esta ireverente compositora e cantora tem marcado bastante a música jovem brasileira desde os seus tempos de Mutantes - ao lado dos irmãos Arnaldo e Sérgio Baptista, formado há 20 anos passados como um sopro de anárquica (mais salutar) renovação na época dos grandes festivais.
Desfeito o grupo, a partir de "Build Up" (Philips, 1969) Rita já mostrava seus méritos de artista-solo. O encontro com o guitarrista - depois marido e parceiro, Roberto de Carvalho, desembocaria numa nova fase de grande sucesso - mesmo interrompida com problemas do casal.
Hoje, bem mais amadurecida - já vendo uma geração de auto proclamados "netos" de roqueiros na praça - Rita continua a mostrar uma boa categoria, a fina ironia e muita garra como fez no seu novo LP (Zona Zen, EMI-Odeon), na qual comparece apenas com três composições próprias. Na mais interessante delas - "Nunca Fui Santa" (nenhuma referência ao título brasileiro do filme "Bus Stop", 1956, de Joshua Logan, com Marilyn Monroe) ela se auto-define neste momento atual:
Sou nova demais
Pra velhos comícios
Sou velha demais
Pra novos vícios
As outras duas músicas são também interessantes: "Independência e Vida" ("Independência e vida/Branca, preta, colorida/Quero mais e menos/E muito melhor) e "Mana Mané".
Em suas pesquisas para o programa "Rádio Amador" que apresentou por algum tempo em emissoras do Rio/SP, Rita encontrou um kitsch sucesso dos anos 60, versão de Rossini Pinto (da canção de Chuck Berry: "Sem Endereço"). O estilo gostoso de Rita cantar (ela tem uma voz especial, que poderia marcar uma nova fase de sua carreira, se não abandoná-la em definitivo como vem prometendo) é "Cecy Bom" (C´est si bon), o clássico francês que virou um cha-cha-cha nesta versão de Rita, em que ela brinca com o dialeto franco-brasilês ("Sacanage tupy/É um tal de oui, oui/Prazer se diz plaisir/E viva Brigitte Bardot/Vanja Orico achou très bom/Sônia Braga fechou. E como!")
Assim é Rita: criativa, irreverente, inteligente. Tem muita gente cuja aposentadoria faria muito bem. Rita, ao contrário, abriria uma lacuna difícil de preencher. Afinal ela significa vida inteligente no rock brasileiro.
LEGENDA FOTO - Rita Lee, 41, ameaçando aposentadoria - mas em forma na "Zona Zen".
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