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Aramis

Waldenyr deu pontapé inicial na história de nosso futebol

É tempo de Copa de Mundo e mais do que nunca tudo que se relaciona ao futebol ganha o maior marketing. Até a bibliografia e musicografia - que no Brasil, apesar de todo o entusiasmo pelo futebol - não é da maiores ganha alguns acréscimos. Por exemplo, está chegando nas livrarias o interessantíssimo "O Pontapé Inicial - Memória do Futebol Brasileiro" do sociólogo e professor Waldenyr Caldas (IBRASA, Cr$ 990,00). Em nível de trabalho acadêmico - no qual se pode contar nos dedos os trabalhos editados no Brasil - Waldenyr Caldas, um professor de Sociologia da Cultura Brasileira na Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo que sempre gostou de temas originais para pesquisar, desenvolveu "O Pontapé Inicial" originalmente como tese de livre-docência no ECA. Neste trabalho, Waldenyr analisou precisamente a trajetória do futebol brasileiro de 1894 e 1933, tendo como base não apenas o futebol. Assim são pontos estruturais de suas reflexões o contexto político-social desse período, a economia, a cultura e, sobretudo, a luta política dos jogadores para serem reconhecidos como categoria profissional. Ou seja, uma visão da luta pela democratização do futebol no Brasil, uma vez que até os anos 30, era uma prática altamente elitizada. "Uma espécie assim de privilégio dos jovens elegantes da alta sociedade", diz o autor. xxx Waldenyr Caldas foi o primeiro scholar universitário a se voltar para o fenômeno da música rural, centrando seus estudos na eletrificação da música dos ex-caipiras e como resultado publicou "Acorde na Aurora". Justamente, fazendo a abordagem desta transformação da música rural foi que Waldenyr esteve, a nosso convite, no seminário "Linguagens e Rumos da Canção Brasileira" - promovido paralelamente ao evento "Brasil de Todos os Cantos" (Teatro Guaíra, abril/1983), quando, pela primeira vez (e até agora única) se reuniram especialista em sociologia, cultura popular e música brasileira para analisar os diferentes rumos e tendências do cancioneiro popular. xxx Autor de outros interessantes estudos - como "A Literatura da Cultura de Massa", "Cultura de Massa e Política de Comunicações", "Uma Utopia do Gosto", tendo ensaios publicados em várias revistas especializadas e pós-doutoramento em Sociologia da Cultura na Universitá Degli Studi Romanzi "La Sapienza", em Roma, Waldenyr Caldas é um professor que tem sabido buscar temas populares para interpretações enxutas, facilmente assimiláveis. E é o que faz, mais uma vez, neste oportuníssimo "O Pontapé Inicial", ao estudar o futebol brasileiro, indiscutivelmente um dos mais importantes produtos de nossa cultura lúdica. Entretanto, mesmo consolidado como esporte de massa ele apresenta, no âmbito da produção acadêmica, uma lacuna considerável no tocante à pesquisa. Pouco se sabe, por exemplo, sobre sua introdução no Brasil e, entre outras versões, atribui-se a Charles Fox Miller (São Paulo, 1874-1953), filho de pais ingleses, que após estudar num colégio de Southampton, na Inglaterra, em 1884, trouxe ao Brasil, em 1894, duas bolas de futebol, com que iniciou os primeiros jogos entre grupos de ingleses empregados em firmas de São Paulo. Tendo o novo esporte despertado o interesse dos brasileiros, Miller divulgou-lhes as regras básicas, instruiu pessoalmente os jogadores e presidiu o primeiro clube de futebol em São Paulo. Hábil jogador, ex-integrante de um grupo de amadores na Inglaterra, é atribuída a ele a criação de uma jogada de efeito conhecida como "Charles". Jogou no São Paulo athletic até 1910, atuando como árbitro de 1911 a 1914. Por 10 anos, foi vice-cônsul honorário da Inglaterra em São Paulo. xxx Mas se há referencia biográfica a Charles Miller - nome de ruas, praças e estádios em vários Estados - até agora nunca havia sido feito um estudo sistemático, analisando a trajetória de nosso futebol que, na visão de Waldenyr Caldas, "apresenta dois momentos bem distintos: o período amador e o profissional. O primeiro, de 1894, até 1933, considerado a fase amadora, onde ainda prevalecia o seu caráter romântico. Oficialmente, não havia o profissionalismo, mas na prática aumentava a cada dia o número de jogadores que reivindicava salário para defender seu time. Esse período é, provavelmente o mais conturbado politicamente na história do futebol brasileiro. Ele representa a passagem da fase amadora para o profissionalismo. "Trava-se, então, uma verdadeira batalha político-trabalhista, cujos protagonistas adversários ao mesmo tempo são dirigentes de clubes de um lado e jogadores de outro" diz Waldenyr Caldas, acrescentando: - "Foi um momento em nosso futebol onde até podemos falar em lutas de classes."
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
14/06/1990

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