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"West Side Story", a obra-prima dos musicais, agora em edição CD

- "A história dos Estados Unidos mudou agora" (juiz Felix Frankfurtter, da Suprema Corte, na noite de 20 de agosto de 1957). Ao fazer esta declaração tão forte, o magistrado Frankfurtter não referia-se a nenhuma questão jurídica. Era apenas a forma com que transmitia sua emoção e entusiasmo - semelhante a de algumas centenas de outras pessoas que, há 34 anos, assistiam a primeira apresentação daquele que, para a história do show business americano, é considerado o mais perfeito musical de todos os tempos: "West Side Story". O juiz Felix Frankfurtter fez a afirmação ao maestro compositor Leonard Bernstein, um dos autores deste musical que, um mês depois - após ser levado em seu roteiro "of Broadway" também na Philadephia, chegaria, finalmente ao Winter Garden Theatre, em Nova Iorque, na noite de 26 de setembro de 1957. Ali permaneceria em cartaz por mais de dois anos nesta primeira temporada - exatamente com 732 apresentações. A primeira de uma série de montagens que, levadas a todo o mundo - e posteriormente com vários "revivals" nos Estados Unidos - contribuiriam para fazer desta transposição moderna da tragédia de Romeu e Julieta um momento único na história do musical nos palcos. Quatro anos depois, em sua adaptação cinematográfica - codirigida pelo encenador do original na Broadway, Jerome Robbins e Robert Wise, "Amor, Sublime Amor" (título que ganhou no Brasil) quase quebrava o record de estatuetas que "Ben Hur" havia obtido dois anos antes: levava 10 Oscars, de melhor filme, direção, ator coadjuvante (George Chakiris), atriz coadjuvante (Rita Moreno), fotografia (Daniel L. Fapp), montagem (Thomas Stanford), direção de arte em cores (Boris Leven), som, música, figurinos (Irene Sharaff). Curiosamente, em 1958, na distribuição dos "Tonys" - que corresponde ao Oscar no teatro americano - "West Side Story" apesar de indicado entre os melhores musicais, perdeu para "The Music Man" (Meredith Wilson / Franklin Laccy), ganhando apenas o prêmio de melhor coreografia (Robbins). Passados trinta e quatro anos "West Side Story" continua a manter todo o seu vigor e emoção - como se pode sentir seja vendo-se o filme (a disposição em vídeo), ouvindo-se as inúmeras gravações que existem da obra e, aos privilegiados que com o dólar batendo nos Cr$ 1.000,00 ainda viajam ao Exterior, se tiverem sorte, assistindo a eventuais remontagens que são feitas deste musical. Agora, enriquecendo o seu já magnífico catálogo em CD, a Polygram Deutsch Grammophon, acaba de lançar a versão em CD de melhor gravação feita da obra de Bernstein, registrada há seis anos passados quando, pela primeira vez, o próprio compositor da música fez a regência. Apesar a existência de inúmeras versões de "West Side Story" - desde as trilhas autênticas da primeira montagem na Broadway, com as vozes do elenco original (Larry Kert e Carol Lawrence como Maria e Tony; Chita Riviera; Lee Backer, David Winters, Tony Mordente) e do filme (com Marni Nixon e Jimmy Bryahnt dublando as vozes de Natalie Wood e Richard Beymer, respectivamente; mas nos demais as vozes originais de Russ Tamblyn e Rita Moreno, George Chackiris e Tony Mordente - vindo da montagem no teatro, etc.), o fato é que a obra merecia uma gravação definitiva (*). Assim, os executivos da Deutsch Grammophon, convenceram Bernstein a reservar três dias de sua congestionada agenda de verão para ir a um estúdio de Nova Iorque e gravar "West Side Story". Numa produção dirigida por David Stahl, com Adrienne Albert regendo o coral, mais Jim Stendborg como maestro-ensaiador e até um "dialect coaching" (Nico Castel) garantindo a perfeição correta às letras, foi feito um registro com dois dos maiores nomes do mundo lírico: o tenor espanhol José Carreras e a neozelandesa Kiri Te Kanawa nos papéis de Tony e Maria. "A partitura de Bernstein refulgiu como nunca acontecera antes", escreveu a biógrafa de Bernstein, Joan Peyser, que garante que esta foi a sua gravação de maior vendagem na história de Deutsche Grammophon. O crítico do "New York Times", Will Crutchfield, escreveu que Bernstein estava na mesma classe de Verdi. Durante um filme feito durante a gravação do álbum - já exibido na televisão no Brasil e com muitas cópias piratas em mãos de colecionadores - a soprano Kiri Te Kanawa afirmou ter sido essa a música que ela cresceu ouvindo na Nova Zelândia. De fato, disse ela, um namorado cantava a parte de Tony e ela a de Maria. Diz ela no filme - já disponível em videodisco (com gente pirateando-o para venda) que "o mais divertido de tudo foi quando Bernstein parou subitamente de reger e disse: "É esse o tempo, é esse". E eu ri, porque era como ter Mozart com você: você estava ali recebendo diretamente dele, do mestre em pessoa". Outros pesos-pesados também participaram desta gravação: a grande Marilyn Horne cantando "Somewhere", Tatia Troyanos (Anita), Kurt Ollman (Riff), Louise Edelken (Rosalia), Stella Zambalis (Consuela), Angelina Reaux (Francisca), David Livingston (Action), Marty Nelson (Diesel), Stephen Bogardust (Boby John), Peter Thom (Arab), Todd Lester (Snowboy) e Richard Harrel (Bernardo). Como se não bastasse os dois CDs trazerem todo musical - com as canções tendo suas letras em inglês e português no encarte que acompanha o álbum (**), a gravação foi completada com outra mostra do virtuosismo de Bernstein: a trilha sonora que compôs para "Sindicato de Ladrões" (On the Waterfront, 1954, de Elia Kazan), sua mais significativa contribuição a música de cinema - e que por si só já justificaria, se espaço houvesse, todo um comentário especial. A gênese de "West Side Story" teve início nove anos antes do espetáculo estrear. Começou quando um ator abordou Jerome Robbins, então trabalhando no Actors Studio, para lhe dizer que iria fazer o personagem Romeu. "Comecei a imaginar que, nos tempos modernos, seria capaz de entender o personagem shakespereano em sua época. Tive então a idéia de uma peça modernizando a história para a Nova Iorque daquele final dos anos 40, em forma de musical". E no dia 6 de janeiro de 1949, telefonou a Bernstein - que começava a se interessar por trabalhos musicais na Broadway - lhe fazendo a sugestão de uma versão contemporânea de "Romeu e Julieta" - envolvendo um judeu e uma católica. Arthur Laurents, autor já conhecido, participou da reunião e o esboço de quatro cenas foi elaborado, mas diversos fatos fariam o projeto ser congelado. Bernstein começou a lecionar em Brandeis e além de estrear seu musical "On the Town", começou a trabalhar num projeto ("Serenade") que acabou virando um musical da Warner, com Mário Lanza e principalmente ligou-se a idéia de outro musical, "Candide", e um programa pioneiro na então nascente televisão americana ("Omnibus" e a série "Sinfônica no Ar"). Robbins continuou na Broadway e Laurents foi para Hollywood. Em 25 de agosto de 1955, quando Bernstein e Laurents encontram-se por acaso, na piscina do Beverly Hills Hotel a idéia retornou. Laurents fazia o roteiro de "Summertime" ("Quando o Coração Floresce", 55, de David Lean) e Bernstein regia no Hollywood Bowl. A idéia do musical - com o nome provisório de "Romeo", voltou a ser discutida e notícias sobre guerra nas gangs entre porto-riquenhos e americanos nas ruas de Nova Iorque mostraram uma outra facção da história. Em 6 de setembro de 1955, Bernstein anotaria o "Robbins adorou a idéia das gangs. Um pacto foi feito: vamos tentar o projeto". Mas assim mesmo, muita água rolou por baixo na ponte. Um jovem compositor, Stephen Sondheim (Nova Iorque, 22/03/1930), que procurava suas primeiras oportunidades, chegou a Bernstein, Laurents e Robbins e revelaria-se o letrista certo para o projeto. A produção, entretanto, teve muitos problemas antes de estrear em Washington - só depois indo para Nova Iorque - e ser consagrado como o musical renovador, social e magnífico que se mantém três décadas depois. Notas (*) Entre muitas gravações de "West Side Story", uma das mais antológicas foi a que Oscar Pterson Trio (piano e trio) fez em 1959, para a Verve. Existem mais de mil registros diferentes de "Maria" e "Somewhere", as duas canções mais conhecidas do espetáculo. (**) O álbum que acompanha o CD traz textos do próprio Bernstein, uma análise do crítico David Patrick Stearns ("Entre a Broadway e a Ópera") e as letras de todas as canções em português e inglês. (***) Para se conhecer melhor a vida e obra de Leonard Bernstein, a Editora Campus, de São Paulo, editou a tradução para o português (de Álvaro Cabral) de "Bernstein - Uma Biografia", de Joan Peyser, jornalista do "New York Times" há mais de 20 anos, tendo entre suas obras uma biografia de Pierrez Boulez e entre 1977/84 editora da respeitada "The Musical Quartely", miss Peyser oferece uma obra definitiva sobre Lennie Bernstein, desde sua infância em Boston, onde nasceu em 1918, até poucos anos antes de sua morte, há dois anos. Bernstein foi regente da Filarmônica de Nova Iorque por 11 anos (1958/69), compositor de sinfônicas (inclusive "The Age of Anxiety", 1949), partituras para balés e a "Missa" (71), além dos musicais "On the Town", "Candide" e "West Side Story". LEGENDA FOTO - A biografia que a jornalista americana Joan Peyser escreveu sobre o maestro Leonard Bernstein foi editada no Brasil no ano passado, pela Campus.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
4
10/11/1991

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