Abertura ( Opus 3)
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 23 de janeiro de 1975
Em sua terceira eliminatória, "Abertura" (Rede Globo de Televisão/Canais 4 e 11, terça-feira, 21 às 22h45min) mostrou uma aparente predileção do imparcial juri pelas composições de vanguarda, o que fez com que um belíssimo samba de Nelson Cavaquinho/ Guilherme de Brito ("Saudade Minha Inimiga") fosse desclassificado, enquanto recebiam pontos para chegarem à finalíssima, músicas estranhas e sem o lirismo do samba da dupla de autores de "A Flor e o Espinho". Se um festival de música popular é, antes de tudo, uma oportunidade de se darem às novas forças criativas, hora e vez para mostrarem suas avançadas propostas, a terceira etapa desta saudável promoção da Rede Globo
de Televisão deve ter atingido tal objetivo: cinco das dez músicas ali apresentadas surpreenderam o público pela linguagem anticonvencional (e às vezes até antimusical) de seus autores.
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"Fato Consumado", de Djavan Caetano Silva (85 pontos, classificada), "Teofagia", de Luiz Marcatto Neto (59 pontos), "Princípio do Prazer", de Jards Macalé (87 pontos, classificada), "Drácula", de Thiago Figueiredo de Alencar Araripe e Décio Pignatari (66 pontos) e "Sarro" ("Ou Uma Concepção da Vida"), de Manoel Messias (72 pontos) foram realmente propostas avançadas - e se por exemplo a letra inteligente do poeta concretista Décio Pignatari para "Drácula" pode merecer alguma admiração, a brincadeira de Manoel Messias em "Sarro", que no arranjo de Tom zé chegou a utilizar os ruídos de duas motocicletas, é mesmo o que diz o próprio autor no "quarto movimento" de sua "concepção de vida": "Amor no coração, minhoca na cabeça".
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Felizmente classificado, "O Tempo", de Reginaldo (de Souza) Bessa, compositor já com algumas gravações, foi, em nosso entender, a melhor música da noite. Com uma letra longa, mas com um refrão facilmente assimilável ("o tempo não pára no porto... / Não apita na curva / Não espera ninguém") esta canção mereceu sua inclusão para a finalíssima, dentro de duas semanas, Em compensação, afora a discutível classificação das músicas de Macalé e Djavan Caetano, o fato de "Saudade Minha Inimiga", de Nelson do Cavaquinho, ter sido eliminada, não deixa de entristecer os fãs do grande poeta do povo. Possivelmente, a péssima interpretação de Elza Soares contribuiu para que o juri só desse 80 pontos à sua música. Que pena a magnífica Beth Carvalho estar no Midem, em Cannes.
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