Agora o rock-gay!
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 23 de junho de 1985
Assim como a liberação da Censura permitiu que se estabelecesse uma crescente musicografia na base do 33 rpo (rotações por orgasmos), com canções das mais insinuantes em termos sexuais, abre-se agora também o canto gay. Aliás, não é novidade as [preferências] de tantos nomes famosos, mas nunca houve uma disposição tão grande de tantos artistas da música de assumir a questão. Sem entrar no campo nacional - pauta uma futura reportagem especial - surgem, simultaneamente, dois grupos ingleses assumidamente gays - não só em seus integrantes, mas nas letras que apresentam: Bronski Beat ("The Age of Consent", London/Polygram) e Frankie Goes To Hollywood ("Welcome To The Pleasuredome", Island/ - WEA).
Sem contar o Quarteto The Smiths - ainda inédito no Brasil e as posições em favor dos movimentos gay de Paul Weller, do duo Style Council (já com 2 lps no Brasil, ambos excelentes aliás), o trio Bronski Beat, formado por Larry "Laz" Steinbachek, Jimmi Sommervile e Steve Bronski - é tão assumido que o encarte com as letras de suas canções foi censurado nos EUA. No encarte, também havia uma tabela com indicações da idade em que o homossexualismo é aceito em vários países europeus. Questões sexuais a parte, o Bronski Beat apareceu inicialmente com "Smal Town Boy" e agora neste "The Age of Consent" traz músicas bonitas - em arranjos vocais suaves e românticos, lembrando mesmo bons grupos dos anos 50 - mas com as pitadas da irreverência de quem assume e vive novos tempos.
Irreverência também caracteriza o quinteto formado por Brian Nasch, Peter Rutherford, Mark O'Toole, Holly Johnson e Peter Gill que adotou o estranho (mas funcional) nome de "Frankie Goes To Hollywood", uma referência clara a Sinatra e o cinema. O FGTH, quinteto de Liverpool (como os Beatles) estreou com um compacto, "Relax", que era uma insinuante canção com forte apelo sexual e que começou a despontar na programação da conservadora BBC mas foi vetada - assim como o vídeo clipe. A censura catapultou internacionalmente o Frankie, cujo compacto tornou-se o segundo mais vendido na Inglaterra. O segundo CS - "Two Tribes" (música pacifista, criticando tanto russos como americanos) também teve boa carreira e o resultado é que no final do ano passado o grupo ganhava nada menos que um álbum duplo - "Welcome to the Pleasure Dome", que a WEA agora lançou no Brasil.
As irreverências do quinteto são muitas - mas sempre dentro de uma linha musical bem armada, lembrando, de certa forma, as brincadeiras que Spike Jones introduziu nos anos 50 e que, recicladas a maneira argentina, estão nos muitos álbuns dos Les Luthiers.
Dentro de uma nova ótica de comportamento, sem preconceitos, tanto o Bronski Beat com Frank Goes To Hollywood se constituem em propostas curiosas e bem humoradas - não chegando [à] grosseria. Mas, ao que informa Antonio Carlos Miguel, do "Jornal da Tarde", em termos de música gay, o melhor é o que faz Morrissey, cantor e letrista do grupo The Smits (três [elepês] entre 84/85), sem as plumas e os paetês da imagem estereotipada que a sociedade cultua. No mínimo, estes conjuntos assumidos - como tantos outros intérpretes (Boy George, Alice Cooper de alguns anos e mesmo David Bowie) passam a se constituírem em trilhas sonoras indispensáveis a ambiente das minorias sexuais que, como dizia o grande Sergio Porto, pelo visto vão acabar sendo maioria.
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