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Aramis

Celso, o pioneiro do CD independente

Enquanto Vera Guimarães - a exemplo de tantos outros talentos musicais - buscam melhores oportunidades de trabalho no Exterior - outros mesmo sem deixarem, definitivamente, o nosso País também entendem a necessidade de tentar abrir espaços lá fora. É o caso de Celso Adolfo. Compositor, violonista e cantor afinadíssimo, este mineiro de Belo Horizonte, ex-funcionário do Departamento Nacional de Estradas de Rodagem naquele Estado, vem há mais de dez anos tentando encontrar um merecido lugar no meio musical. Em 1983, pela Barclay, já gravava um elepê produzido pelo "padrinho" Milton Nascimento, com participações especialíssimas como de Renato Andrade (viola caipira), Juarez Moreira (violonista/guitarrista, que mereceu o "Free Jazz" na Rede Machete, domingo passado), Tulio Mourão (teclados), Nenem (percussão), entre outros. "Coração Brasileiro" (que chegou a ser canção-tema de um dos discos de Elba Ramalho) era uma das faixas mais bonitas daquele álbum, que mesmo com todo carinho que foi recebido não foi o suficiente para dar a Celso Adolfo a promoção merecida. Quatro anos depois, retornaria numa produção independente ("Feliz", Diplomata Discos), no qual, novamente, mostrava toda sua ternura e sensibilidade com canções como "Nós Dois", "Aldebaran", "Água", "Chuva", "Passarim", "Depois do Amor" (esta uma parceria com Juarez Moreira) e a faixa-título. Em 1990, Celso Adolfo voltou ao caminho independente, mas então sendo um pioneiro. Assim como o tecladista Antônio Adolfo (outro que também hoje vive mais tempo nos EUA do que no Brasil) havia, em 1977, com seu "Feito em Casa", viabilizado a produção independente, o mineiro Celso Adolfo foi mais longe: fez de "Anjo Torto" o primeiro CD alternativo. Gravado com apoio cultural da Brasilaço, com registros feitos no Bemol (o mais importante estúdio de Minas Gerais), tendo inclusive a colaboração de um músico de raízes curitibanas (André Dequech) na elaboração técnica, com este CD, Celso Adolfo mostrou uma nova safra de composições - apenas uma em parceria ("Batom Passado", com Yuri Popoff) e confirmando sua versatilidade. Suave e romântico em suas letras, com um certo toque buarqueano algumas vezes, Celso também acorajou-se a tentar o mercado americano. Desconhecemos detalhes de suas andanças pelos Estados Unidos, mas pelo visto foi bem sucedido. Tanto é que animou-se a reeditar, por sua conta, em CD, os discos anteriores - "Coração Brasileiro" e "Feliz", dispondo agora de uma tríplice obra para auxiliá-lo em sua caminhada internacional. É importante ouvir Celso Adolfo, que executando violão e fazendo os vocais, buscou acompanhamentos harmoniosos - e também encontrou em Vanessa Falabella uma voz para contracanto que enriquece muitas faixas deste "Anjo Torto". Conhecer um talento como Celso Adolfo - que já admiramos desde suas primeiras gravações - pode parecer uma "revelação" para o ouvinte que só agora venha a escutar canções como "A Estrada do Barro Branco", "Nóis Dois", "Três Poderes", "Rio Lava-pés" e outras jóias incluídas em "Anjo Torto". Entretanto, isto confirma o arquipélago cultural-musical em que vivemos, nos quais dezenas de talentos vivem, lutam e algumas vezes mesmo fazendo suas gravações independentes, em seus Estados, permanecem praticamente inéditos fora dos limites geográficos devido a ditadura imposta pelos veículos nacionais de divulgação. Raros os jornalistas da chamada grande imprensa que abrem espaços em suas colunas para registrar discos independentes ou produções regionais (enquanto priorizam com páginas inteiras o lixo pop internacional) e nas televisões são mínimas as "janelas" para talentos que não caiam no esquema de marketing. Entretanto, bastaria a inclusão de uma música de um talento como Celso Adolfo - ou do paranaense Reinaldo Godinho (*) na trilha sonora de uma novela, para que fossem catipultuados [catapultados] na dimensão que seus talentos merecem. Celso Adolfo, corajosamente, foi buscar nos Estados Unidos um espaço maior - mas quantos outros terão a mesma audácia? Nota (*) Reinaldinho, 40 anos, compositor, violonista, arranjador, é um dos grandes talentos musicais do Paraná. Há dez anos, com imensos sacrifícios fez um belíssimo lp independente, que infelizmente não teve a repercussão merecida. É um dos muitos exemplos de talentos regionais que hoje se mostra decepcionado com a falta de perspectivas de fazer carreira musical (por exemplo, Paulinho Vitola, seu parceiro, preferiu a publicidade do que continuar na música) e emprega a sua energia na criação de jingles e trilhas sonoras para produções do Sir-Laboratório de Som & Imagem.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
23/02/1992

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