Do barquinho ao avião, uma história por especialistas
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 26 de março de 1989
A Bossa Nova, pelo seu significado cultural, pela permanência que trouxe à MPB - rompendo tabus e dando bases a toda uma geração que nela soube beber as melhores influências - até hoje mereceu mínima bibliografia. Ramalho Neto, na época diretor artístico da RCA (hoje BMG/Ariola), foi o primeiro a tentar uma biografia do movimento chamado "Historinha do Desafinado" - obra há muito esgotada. Alguns outros pesquisadores e ensaístas voltaram-se bissextamente ao tema, mas sem um estudo de maior fôlego. Só agora, em sua 12ª edição, o Projeto Lúcio Rangel de Monografias, promovido pela divisão de Música Popular do Instituto Nacional de Música/Funarte, incluiu João Gilberto como um dos quatro artistas-temas.
Portanto, a iniciativa da Líder Táxi Aéreo, ao comemorar seus 30 anos de fundação, em patrocinar a edição de um belíssimo álbum-livro - "Do barquinho ao avião: 30 anos Bossa Nova/30 anos Líder" (48 páginas, distribuição dirigida) é um evento fundamental para quem se interessa pela nossa música. Vem, de certa forma, complementar outro trabalho - também desenvolvido em equipe, "Brasil Musical" (302 páginas, edição de Art Bureau) patrocinado pelo Chase Manhattan Bank - este, felizmente, já com uma edição popular, chegando agora nas livrarias.
"Do barquinho ao avião: 30 anos Bossa Nova", livro e disco, não tem previsão de lançamento comercial. Trata-se, entretanto, de material referencial básico, distribuído pela Líder Táxi Aéreo às bibliotecas e centros musicais de todo o país, para informar às novas gerações um pouco sobre a BN - como nasceu, seus participantes e suas influências.
Para escrever este livro, foram convocados três jornalistas que, bem de perto, acompanharam (e participaram) de seu nascimento: Ronaldo Bôscoli, João Máximo e Tárik de Souza. A carioca Maria Christina Gurjão, que foi mulher de Vinícius de Moraes, coordenou a obra e fez também uma introdução situando o Brasil do final dos anos 50, início da década de 60 ("Éramos felizes"). O poeta e cronista mineiro Paulo Mendes Campos abre o volume fazendo a ponte da Líder Táxi Aéreo com a Bossa Nova, num texto delicioso. Enfim, cinco blocos perfeitos, com ilustrações apropriadas - muitas inéditas - numa edição bilíngüe, já que os textos foram traduzidos para o inglês por Elba Javier e João Luiz de Albuquerque, este um dos mais bem humorados e competentes jornalistas cariocas, colunista da "Última Hora", assessor de imprensa do FestRio e que também acompanhou a Bossa Nova desde seus primeiros toques.
Perante textos tão enxutos e objetivos, desenvolvidos numa linguagem coloquial - como se fosse um papo de bar, "para trocar experiências, sensações e informações" como diz Christina Gurjão, é difícil sintetizar num registro de jornal a quantidade de informações saborosas trazidas. Ainda recorrendo à síntese de Christina, pode-se dizer que em sua parte, "A Bossa vista de fora", temos "o antes é tudo aquilo que vai de Noel a Noel, ou seja, do surgimento de Noel Rosa como símbolo e síntese da Época de Ouro à redescoberta de Noel Rosa como figura central da reação saudosista nos anos 50. O durante é a Bossa Nova propriamente dita", diz João Máximo, jornalista do JB, expert em música popular e autor do mais completo livro sobre Noel Rosa (1910-1937), que a Editora da Universidade de Brasília promete editar este ano.
"O fenômeno da descaracterização progressiva também ocorreria com outro desbravador da Bossa Nova no Exterior, o pianista niteroiense Sérgio Mendes. Ele que em 61 já rompia fronteiras participando do II Festival Sul-Americano de Jazz do Uruguai, liderando um Brazilian Jazz Sextet, faria um disco antológico com o Sexteto Bossa Rio antes de embarcar para os EUA" diz Tárik de Souza, 43 anos, quase 20 de "Jornal do Brasil" - autor de vários livros sobre MPB.
LEGENDA FOTO - Integrantes da famosa gravação do disco "Getz/Gilberto", que com "Garota de Ipanema" correu o mundo: Tião Neto, Tom Jobim, Stan Getz, João Gilberto e Milton Banana. Astrud, na época mulher de João, é que cantava "The Girl From Ipanema".
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