Do sorvete e água no calor do verão
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 01 de fevereiro de 1988
Apesar do verão atingir temperaturas que nunca antes os paranaenses conheceram, o empobrecimento da classe média se reflete num pequeno segmento: a venda de sorvetes. Embora as grandes empresas que atuam na área não revelem números, o representante local do La Basque - sorvete da melhor qualidade - garante que proporcionalmente, com sete lojas, as vendas estão sendo inferiores há cinco anos passados, quando esta marca de produto sofisticado chegou a Curitiba.
Jacques Raul Riegler, 45 anos, empresário do setor de representações, ex-violinista da Sinfônica da Universidade Federal do Paraná, mostra que a venda de sorvetes é um termômetro do empobrecimento da classe média.
- "O natural seria que estivéssemos vendendo 50 a 70% a mais do que nos anos anteriores, mas os números são frios e objetivos: o aumento é pequeno, para não dizer inexistente".
xxx
Sorvete artesanal que nasceu da paixão do banqueiro paulista Aloísio Faria pelos sorvetes, o La Basque é hoje o produto mais sofisticado da área. O próprio banqueiro André Faria, em suas horas de folga, supervisiona a fabricação - e é extremamente rigoroso na concessão de representações. Sua filha, Flávia, foi quem conseguiu levar o produto para o Rio de Janeiro e Jacques, apesar de suas boas relações, levou meses para obter os direitos de trazê-lo ao Paraná. Hoje com pontos de vendas espalhados em Curitiba e também nas praias de Caiobá e Guaratuba, continua trazendo o produto de São Paulo - "fabricá-lo em Curitiba seria praticamente impossível", argumenta. Além do mais, a experiência mostra que há necessidade de um elevado know how para conseguir a fórmula capaz de produzir um sorvete fino. Em Curitiba, algumas indústrias de sorvete buscam seus espaços - Casquinha, Caramba e o próprio Gaúcho (este produzindo apenas para o consumo de sua loja, ao lado do Cemitério Municipal). Claro que as maiores vendas, em freezers distribuídos por todas as partes, são ainda da Kibom e Gelato, com fortes esquemas de marketing.
xxx
Se a venda de sorvetes - ao menos dos produtos mais caros, como os do La Basque (Cz$ 70,00 o copo com dois sabores; Cz$ 480,00 a embalagem de um litro) não teve elevação no consumo - numa demonstração da retratação da retração do público, outro segmento que acompanha o verão vem apresentando um crescimento impressionante: a água mineral. Só a Ouro Fino, a mais tradicional das empresas engarrafadoras, teve uma ascensão impressionante - e um movimento ampliado após ter introduzido o sistema de garrafões, atingindo especialmente escritórios, empresas e entidades diversas. Tanto é que para a distribuição de duas empresas, uma das quais a Distribuidora de Bebidas Anta Branca, cresceu em pouco tempo de duas pequenas Kombis para dez veículos utilitários, mais três caminhões, "e assim mesmo é difícil atender toda a demanda", como explicou a sua principal executiva, a charmosa Beatriz de Albuquerque Withers.
xxx
Sorvete e água mineral - dois exemplos de produtos de consumo que apresenta picos nos meses de verão, tendo um desaquecimento no inverno. "O sorvete - raciocina Jacques Riegler - especialmente é ingrato em termos de remuneração, pois quando o tempo esfria tem uma queda de procura de mais de 70%, mas não há condições de desativar os pontos de vendas e mesmo paralisar as câmaras de congelamento".
O caminho para algumas sorveterias é a diversificação dos produtos para a área de alimentos congelados. Por outro lado, sorveterias que surgiram em verões passados não resistiram neste calor de 1988. E a imagem das sorveterias de bairro, artesanalmente simples - mas com o gosto de infância dos velhos curitibanos - só ficou na memória dos cinqüentões desta cidade de temperaturas inesperadas - e que tem agora um verão antes nunca sentido e suado.
Enviar novo comentário