Fante, as memórias de Hollywood sem glamour
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 31 de março de 1985
É incrível o poder de marketing que Caio Graco, da Brasiliense, desenvolveu nos últimos anos. Ativíssimo editor, vem fazendo com que autores desconhecidos se tornem best-seller e, especialmente, caiam no gosto do público jovem. Assim transformou Charles Bukowski num dos autores mais consumidos nos últimos três anos a partir de "Cartas na Rua", logo seguido de "Mulheres" e "Misto Quente", todos volumes da coleção Circo de Letras. E como Bukowski sempre falou de John Fante, romancista da década de 40, ex-roteirista em Hollywood e também marginalizado pelo sistema, Caio não teve dúvidas: no ano passado encomendou a Paulo Leminski uma tradução do romance "Pergunte ao Pó", que já está a caminho da terceira edição, e a qual se acrescenta agora "Sonhos de Bunker Hill", desta vez Marilene Felinto cuidando da tradução e Caio Fernando Abreu fazendo uma apaixonada apresentação. A obra de Fante é relativamente pequena. Este "Sonhos de Bunker Hill" foi publicado originalmente em 1982, um ano antes da morte de Fante, aos 74 anos. E o livro não foi escrito, mas ditado a Joyce, mulher do autor. Cego, com as duas pernas amputadas devido a problemas com diabetes, foi a única maneira que Fante encontrou de não para de escrever. E como diz Fernando Abreu: "E escrevendo ou ditando, a emoção era sempre a mesma: tripas e coração, como diz seu admirador Bukowski, misturadas no mesmo esforço de fundir humor e dor, ternura e ridículo, grandeza e miséria".
Como Nathaniel West, autor do admirável "O Dia do Gafanhoto" (que o inglês John Schelessinger levou a tela com tanta genialidade), John Fante foi um dos deserdados do sucesso que viu Hollywood sem a magia artificial que tantos pintaram a Usina dos Sonhos nos anos mágicos de 20 a 50. Assim, a sua visão é amarga e realista. O mesmo personagem de "Pergunte ao Pó", Arturo Bandini, alter-ego de Fante, reaparece neste "Sonhos de Bunker Hill", um livro que se acompanha com vontade de não interromper a leitura e tem o gosto de um bom filme preto-e-branco dos anos 50.
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