Memórias de Bukowski
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 18 de novembro de 1984
A Brasiliense está aproveitando o filão que descobriu: a literatura beat e os autores malditos. Assim, novo livro de Charles Bukowski aparece em sua coleção "Circo de Letras": "Misto Quente - A Juventude de Henry Chinaski" de Charles Bukowski (tradução de Luiz Antônio Sampaio Chagas, 263 páginas, Cr$ 10 mil).
Autor do "descoberto" após o sucesso de "Cartas na Rua" e "Mulheres" - e que levou também a editora gaúcha L&PM a lançar o romance que inspirou ao anárquico filme "Crônica do Amor Louco" de Marco Ferreti - Charles Bukowski, nascido na Alemanha em 1920 e que foi para os EUA ainda criança, é o autor da moda. Publicou sua primeira história aos 24 anos. Hoje vive na Califórnia, bem mais tranqüilo do que nos tempos duros que descreve em seus livro de linguagem crua e até agressiva - que o aproximam, para muitos críticos, de Henry Miller.
Neste "Misto Quente" há muito da história da infância e adolescência do autor - personificado em Henry Jr., herói do livro. Na verdade, Henry é um anti-herói, pois, segundo o próprio Bukowski, sua juventude foi "uma história de horror" que ele procurou contar de um jeito engraçado para evitar que fosse lida como tragédia.
E a vida realmente não é um mar de rosas para o pequeno Henry. Seus país, imigrantes da Alemanha, vivendo durante a grande repressão dos Estados Unidos, passam por uma instabilidade financeira e psicológica bem característica de diversas famílias norte-americanas da época. O desemprego do pai, as surras, as brigas na escola, as brincadeiras de rua e as descobertas sexuais fazem, parte do cotidiano de Henry.
Na adolescência aparecem, com as espinhas do rosto e do corpo (ele tem problema de acne fora do normal), o questionamento religioso e a insatisfação diante da vida: "eu não tinha interesses. Sentia vontade de dormir uns cinco anos seguidos, mas eles não me deixariam". Eles são os pais, professores, colegas que o detestam ou aqueles que gostam e por isso mesmo não lhes deixam sozinho. Henry Jr. só tem curiosidade pelos livros e pelas mulheres.
Apesar da amargura, Bukowski é em diversos momentos surpreendentemente engraçado. Seu relato é rico em detalhes, comovente na maneira de falar da solidão e das relações humanas.
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