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Aramis

A festa da raça negra no canto de Martinho

A espera compensou: contratado em fevereiro deste ano pela CBS - após quase 20 anos na RCA (hoje BMG/Barclay), Martinho da Vila, sempre com a ajuda de seu grande amigo e produtor, Rildo Hora, estreou com o pé direito na nova etiqueta: "Festa da Raça" o traz em sua mostra de coerência artística e mesmo ideológica. A motivação não poderia ser melhor: os 100 anos da libertação dos escravos - e como um dos mais assumidos intérpretes da negritude (o que o faz, há anos, ser um artista de grande popularidade em Angola, Moçambique e outros países da jovem África), Martinho realizou um álbum que, na proposta do artista gráfico Elifas Andreato (e que desde "Batuque na Cozinha", esculpe a capa de seus álbuns) foi dedicado a liberdade. O produtor Rildo Hora, com o seu bom gosto e competência, fundiu na vestimenta dos arranjos e participação instrumental, as culturas negras e européias. O resultado é que "Festa da Raça" soma a clássicos sambas-de-enredo - "Xica da Silva" (1962), "Rio Grande do Sul Na Festa do Preto Forro" (1972), da Acadêmicos do Salgueiro e E.S. São Carlos, respectivamente, mais o "Ilu-Ayê-Odara" (1972, Portela) ao "Kizomba Festa da Raça", que Martinho fez para que a E.S. Vila Izabel, presidida por sua esposa, a líder comunitária Ruça, ganhasse o concurso neste ano. Mas Martinho não ficou apenas na exaltação de Carnaval, trazendo em "Sol e Chuva, Casamento de Viúva", por exemplo, uma explosão de negritude, em parceria com Beto Sem Braça - e uma fusão com cantigas de roda. Também com Beto Sem Braça (e Serginho Mereti) é "Quem Me Guia", no estilo calangueado que justificou atabaque, ganzá, pandeiro, violão e viola no acompanhamento. O Martinho em seu lado romântico (lembram-se de "Disritmia"?) está malicioso em "Jaguatirica". Cada faixa tem um significado especial - e há a beleza da faixa que inspirou o tema global ("Liberdade Pelo Amor de Deus"), a comunicação-saudação de "Axé Para Todo o Mundo" (com regência de Geraldinho Vespar e a participação do Coral das Docas), além de um antigo samba de Martinho, "To Maior" que foi eliminado no festival da Record em 1961. mostrando como se cometeram injustiças nos festivais! Um disco de raízes, belo e comunicativo.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
16
04/12/1988

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