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Aramis

Noite das estrelas da Rádio Nacional

Os 60 anos de vida profissional de Paulo Tapajós e os 77 de idade de Mário Lago - duas comemorações que, na semana que se encerra, foram encontros emocionantes, sinceros e sobretudo musicais de duas personalidades maiores da vida artística-cultural brasileira. Na segunda-feira, 28, na sede social do Fluminense, em seu salão nobre, mais de 400 amigos que Paulo Tapajós Gomes, 75 anos, fez ao longo de um vida admirável, ali foram abraçá-lo por uma razão muito especial: a indicação de seu nome para figurar na edição de 1989/90 do Guinnes Book of Records, como o profissional que há mais tempo, ininterruptamente, atua na produção de programas de rádio. O recorde mais aproximado de Paulo era o do sueco Sven Jerring (1898-1979), que se aposentou da Swedish Broadcasting Corporation há dez anos, aos 82 anos, onde produziu o programa "Childrens Mailbox" em 1.785 audições entre 1925/1978. O caso de Paulo Tapajós é ainda mais significativo: em 2 de abril de 1928, com seus irmãos Haroldo e Osvaldo, com os quais formava um trio vocal, estreou nos microfones da rádio Sociedade do Brasil (hoje Roquete Pinto), iniciando uma carreira que jamais interromperia - praticamente fazendo de tudo no rádio. Hoje, embora aposentado, Paulo não deixou o microfone: é responsável por um dos programas de maior audiência nacional, pela rádio MEC e dentro do projeto Minerva - sempre com aquele seu estilo característico e principalmente, o conhecimento de quem mais conhece a nossa música brasileira. xxx A festa em homenagem a Paulo não poderia ser mais emocionante: paralelamente a oficialização de seu nome ao Guinnes Book Of Records, seus amigos - e sempre com o entusiasmo apaixonado de sua esposa, a admirável Norma, ampliaram o evento para o lançamento do disco com 12 históricas gravações, extraídas de programas feitos na Rádio Nacional (na qual Paulo esteve por quatro décadas), nas quais interpreta desde uma canção irlandesa ("Machshla") até dois clássicos de Jerome Kern/Oscar Hammerstein II ("All The Things You Are" e "The Last Time I Saw Paris"), mas, naturalmente, incluindo modinhas, gênero do qual é um dos grandes intérpretes (edição Collector's, venda em Curitiba apenas na Loja Sartori, ou pedidos pelo correio à Rua Visconde de Pirajá, 550, CEP 22.410, Rio de Janeiro). Para uma noite tão especial, o grande idealizador e coordenador da festa, radialista Gerdal Renner dos Santos, convocou um elenco all star que parecia um renascimento da época de ouro da Rádio Nacional nos anos 40. A passagem do tempo não retirou o encanto e a simpatia de cantores, compositores, apresentadores e músicos que, entre os anos 30 a 60, tinham, através do rádio - especialmente na Nacional - a popularidade com que hoje desfrutam os stars televisivos. Eliana Macedo, 23 filmes como atriz de seus tempos de garota até a meia idade, hoje uma senhora discreta, ao lado do neto, Ney, ali estava, feliz pelo fato de também acontecer a reedição de "Nos Bastidores do Rádio", livro de Renato Murce, seu marido, falecido há menos de dois anos - e que foi um dos grandes produtores e apresentadores da Nacional, revelador de dezenas de talentos em seu programa (especialmente "Papel Carbono"). Luis Carlos Saroldi, jornalista e produtor do programa "Arte Final" da Rádio Jornal do Brasil, na mesma noite, autografava seu livro sobre a Rádio Nacional, agora reeditado pela Funarte/Martins Fontes. xxx A gravação feita em um Panasonic documentando toda a festa em homenagem a Paulo, ficará como um registro histórico por ter captado a expontaneidade e alegria dos participantes da noite memorável em que todos foram levar o abraço ao querido Tapajós. Claro, que para alguém que sempre viveu com a música a noite teria que ter a melhor MPB, ele que tem sido o seu maior defensor, nosso sucessor na presidência da Associação de Pesquisadores e também compositor, intérprete e produtor. Da abertura com o grupo Vibrações - e justamente com o choro de Jacob do Bandolim que dá nome ao conjunto, ao encerramento, com todos os presentes interpretando "Luar do Sertão", houve um desfile daquilo que apropriadamente, se pode chamar de "constelação das noites estreladas da Nacional". Vejam só, que elenco! Elizeth Cardoso, elegantíssima, num vestido azul, cantando "As Rosas Não Falam"; Jamelão, esta voz maravilhosa e potente, normalmente de poucas palavras e famoso por seu mau humor, improvisando até um pequeno discurso em agradecimento a Paulo, "que sempre teve paciência para me aturar", lembrando o amigo Lupiscínio Rodrigues com "Esses Moços!"; Zezé Gonzaga, uma das mais afinadas cantoras brasileiras com "Eu Sei Que Vou Te Amar"; Elenn de Lima, bem humorada e bela, fazendo uma homenagem especial ao interpretar "Cantiga Para Luciana", de Paulinho Tapajós e Eduardo Souto Neto - que, em 1969, foi a vencedora do IV Festival Internacional da Canção. Se o casamento não tivesse interrompido sua carreira, por certo Violeta Cavalcanti teria sido a substituta de Carmen Miranda: brejeira, sapeca, esta notável cantora - há mais de 30 anos afastada do meio artístico (a não ser para apresentações especiais) - fez os presentes vibrarem ao dar o tom moleque na interpretação de "Camisa Listrada". Outra cantora há muito afastada dos estúdios, hoje presidente da Socimpro, Rosita Gonzales, ao cantar "Estão Voltando As Flores" ( do parnanguara Paulo Soledade) fez com que um coral expontâneo (afinal, com tanta gente do meio musical presente) provocasse um dos momentos mais emocionantes da noite. Modinheiro como Paulo, o mineiro Luiz Cláudio preferiu reviver uma das mais suaves músicas de Paulinho Nogueira: "Menina". Outra bela voz, infelizmente que pouco se ouve, a do cantor Paulo Barcelos, também escultor, não se limitou a oferecer uma peça de arte (um busto, em bronze) ao seu amigo Tapajós, mas lemrou um dos mais belos sucessos de Chico Alves - "A Voz do Violão". Se Miriam, que foi mulher de Abel Ferreira (e hoje dirige a Sala Sidney Miller, da Funarte) e Gerdal não tivessem montado a homenagem de forma organizada, a noite poderia prosseguir por muitas horas, pois, como espectadores, havia pelo menos mais de 30 outros artistas de nossa música - entre eles o Francisco Carlos, "El Broto" (que foi candidato a vereador no Rio e teve menos de 200 votos, mas que em compensação também está sendo reeditado num disco pela Collector's), o grande Elton Medeiros - compositor e cantor admirável, um dos maiores amigos de Paulo; cantor Roberto Paiva, cantoras Ademilde Fonseca e Sonia Delfino, João de Barros - cada vez mais jovem aos 82 anos, sambista Delcio Carvalho, o trombonista Raul de Barros, compositor Roberto Martins - entre tantos. Ao sair do Fluminense, Paulo teve que dividir com os filhos - Maurício, Paulinho e Dorinha, e os netos, os troféus recebidos na noite: o Sindicato dos Músicos - através de sua presidente, cantora lírica Sileia Stocato; o incansável Albino Pinheiro, presidente da Associação dos Pesquisadores da MPB; professor Vicente Tapajós, do Instituto Histórico e Geográfico do Rio de Janeiro; Adilson Santos, do Sindicato dos Radialista; o compositor Romeu Nunes, da União Brasileira de Escritores; Milton Varela, da Associação de Pesquisadores e Escritores de Música Popular do Rio de Janeiro e até o presidente do Fluminense, Fábio Egito - se sucederam em rápidas saudações a Paulo, todos destacando sua presença da maior dignidade em 60 anos de vida cultural no Brasil. xxx Na quarta-feira à noite no Teatro Jõao Caetano, houve outra homenagem - esta ao ator, compositor, escritor, radialista (atual diretor da rádio Roquete Pinto), Mário Lago - numa festa dirigida por Albino Pinheiro.Também uma justíssima celebração a um dos profissionais mais dignos da cultura e arte no Brasil. Paulo Tapajós, símbolo da amizade, exemplo de competência e dedicação profissional, saiu emocionado da festa - tão emocionado que chegou até a preocupar seus amigos. Realmente, poucas vezes houve uma festa tão bonita - e sobretudo - tão musical, a alguém que, com a maior dedicação, há seis décadas procura fazer o melhor. E que o tem conseguido, para felicidade de quem sabe amar nossa música. LEGENDA FOTO - Paulo Tapajós, 75 anos, 60 de rádio: a homenagem ao grande brasileiro.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
04/12/1988

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