Kozak arrebentou a boca do balão nas premiações
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 03 de novembro de 1988
Foi como se Papai Noel tivesse antecipado em 55 dias a sua chegada para Fernando Severo: na noite de terça-feira, dia 1º, na praça interna do ParkShopping, na original festa de encerramento do XXIº Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, este cineasta catarina-paranaense, teve que subir seis vezes ao improvisado palco ali montado para receber as premiações na categoria de curta-metragem, 16 milímetros. Além de cinco Candangos obtidos por seu "O Mundo Perdido de Kozák" - montagem, roteiro, direção, filme e especial de "qualidade de imagens", houve ainda a atribuição do Troféu Panda - sobre o qual falaremos adiante.
Severo, catarinense de Caçador, 30 anos a serem completados no próximo dia 9 de dezembro, técnico de comunicação social do Centro Federal de Ensino Tecnológico do Paraná, não sabia nem mais onde colocar tantos troféus. Com esta consagração em Brasília, Severo torna-se um dos mais premiados cineastas brasileiros por um único filme: Kikito de melhor roteiro no XVIº Festival de Gramado (junho/88); Estrela de Prata de melhor filme e direção no IV Rio-Çine Festival (agosto/87), troféu Macunaíma do Conselho Nacional de Cine-Clubes (no mesmo festival); troféu Gralha Azul, dos cineclubistas paranaenses; e Tatu de Prata, melhor documentário curta, na XVII Jornada de Cinema da Bahia (setembro/88).
Severo concorreu com quatro outros curtas - "Colorbar", de Marcelo Mendes (que ficou com o prêmio de trilha sonora para Leão Leibovich), "Café Soçaite" de Joatan Vilela Berbel (paranaense, de Londrina, radicado no Rio), "Amor e Morte" de Walquíria Ribeiro e "Tangência", criação coletiva de alunos do curso intensivo de cinema que José Joffily, filho, orientou na Cinemateca Guido Viaro, em junho. "A qualidade do filme de Severo foi tão superior aos demais que o júri decidiu lhe dar todas as premiações - exceto trilha sonora - numa valorização do explêndido trabalho", justificou a cineasta Maria Luiza Abroim, presidente do júri e que no ano passado foi a vencedora no mesmo Festival de Brasília com seu lírico "Cidadão Jatobá".
A premiação de fotografia foi reunida no ítem "qualidade de imagens", pois o júri avaliou a importância de efeitos especiais, fusão e table-top - dividindo-se apenas nesta categoria a premiação com os outros dois colaboradores de Severo, o fotógrafo Peter Lorenzo e o cenógrafo Silvio Silva Junior.
Com a junção de várias premiações, Fernando Severo teve a maior premiação financeira já dada a um realizador em sua categoria, no Brasil: um cheque no total de Cz$ 1.900.000,00 está sendo creditado hoje em sua conta.
- "Com este dinheiro vou poder completar o orçamento de meu novo filme, "Sombras no Final da Tarde", que quero começar a rodar ainda em novembro" - comentava, com o mais dentifrício dos sorrisos, logo após a premiação.
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Uma brincadeira bem humorada dos irreverentes cineastas Cecíio Neto, Arthur Omar, Carlos Reichenbach e crítico Jairo Ferreira, nascida no último Rio-Cine Festival, consolidou-se em Brasília: a outorga do Troféu Panda ao filme que, independente de bitola e metragem, apresenta o melhor plano. No Rio, o premiado foi Ney Costa Santos pela imagem em movimento circular de 360 graus dentro do estádio maracanã no curta "Heleno e Garrincha". Instituido para "resgatar pequenas pérolas de invenção que as vezes se perdem nos filmes" - como diz Arthur Omar, o troféu Panda é, assim, "uma união ecológica-cinematográfica, já que é preciso salvar de extinção (assim como o urso panda) o que ainda exista de invenção e criatividade no cinema brasileiro". E, entre cinco filmes nominados para a original (e não oficial) categoria, a premiação foi uma homenagem a Kozak (1897-1979): o plano em que o cineasta aparece ao lado de uma índia que aos poucos vai se virando com um sorriso para a câmera ao som de Villa-Lobos. Justificou Arthur Omar:
-"É uma homenagem póstuma que fazemos a este homem que em vida não foi reconhecido e não ganhou nenhum prêmio".
Três cineastas que estão ligados ao Paraná foram consagrados no XXIº Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, encerrado na terça-feira: Sergio Bianchi, dividiu com o gaúcho Werner Schunemann o Candango de melhor direção na categoria de 35mm com o seu "Romance"; Fernando Severo levou cinco dos seis prêmios na categoria de curta, 16mm e Joel Pizzini Filho, mato-grossense de Campo Grande - mas que estudou comunicação na Universidade Federal do Paraná - foi o cineasta-revelação, obtendo três premiações por seu curta, em 35mm, "Caramujo Flor" - inspirado no universo poético de Mario de Barros (do qual falaremos, em detalhes, no domingo).
Num festival desaquecido, refletindo o próprio momento de desânimo e apatia que caracteriza o país, só realizado com o empenho do presidente da Fundação Cultural do Distrito Federal, maestro Marlos Nobre, enfrentando a mais hostil campanha contra sua administração, os filmes em competição, na categoria de longa-metragem, não chegaram a atrair público para lotar as 380 poltronas do Cine I do distante ParkShopping - sede do Festival, tradicionalmente realizado no Cine Brasília (de propriedade da própria Fundação Cultural). Três documentários de longa-metragem e três filmes de ficção na categoria 35mm representam a crise do cinema brasileiro neste ano - e que se projeta com imagens mais negras para 1989/90, com a queda da produção e o esfacelamento da Embrafilme após a última e dasastrosa administração que por ali passou.
A premiação a Bianchi e Schunemann dividindo a direção foi, de certa forma, uma questão de compensação pela injustiça que estes dois realizadores sofreram na última edição do Festival de Gramado, na qual seus filmes foram cortados - entrando, em substituição, os dois piores longas levados naquela mostra - "Luzia Homem", de Fabio Barreto e "Sonhos de Menina Moça", de Teresa Trautmann (que não obtiveram nenhuma premiação no Festival gaúcho).
Schunemann, 29 anos, que estreou dirigindo o longa "Me Beija" (1984, já exibido no Cine Groff), foi duplamente vitorioso: além das cinco premiações que seu filme obteve, pela manhã de terça-feira, recebeu a informação de que ao lado de "Lili Carabina", de Lui Faria, representará o Brasil no V FestRio (17 a 26 de novembro).
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