Nas fotografias, uma era da Curitiba que já se foi
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 13 de março de 1988
"Fitas e Bandeiras Venske" não será apenas uma bela edição, digna de figurar em qualquer coleção de livros-de-arte. Resgata imagens de uma época industrial curitibana, infelizmente com poucos registros iconográficos.
Foi há 81 anos que Gustavo Venske fundou uma fábrica de fitas, inicialmente uma pequena manufatura de fundo de quintal, instalada numa casa alugada na Rua Assungui (hoje Mateus Leme), onde instalou três antigos teares suíços usados. A pequena fábrica produzia fitas utilizando matéria-prima importada e revendia seus produtos numa loja de ferragens e armarinhos (Muller & Venske & Cia.), de propriedade de Gustavo e seu cunhado, Oscar Charles Muller.
A empresa prosperou e, cinco anos depois instalava-se no Largo da Ordem. Um dos filhos de Gustavo, Alfredo Venske, voltava da Europa, onde se formara em técnico-tecelão. A empresa começou a crescer - e ao longo de quase 70 anos de existência teve várias fases, de maior ou menor prosperidade.
Durante anos emprega basicamente mão-de-obra feminina. Em fins dos anos 30 mudou-se para a Rua Ubaldino do Amaral, quando conheceu sua fase de maior glória - chegando a atingir o recorde de produção na ordem de 800 mil metros de fita/mês e com as Indústrias Francisco Matarazzo, tinha a seu favor a qualidade dos produtos que fornecia.
A partir de 1957 o controle deixou de ser exclusivamente familiar, com entrada de quase 10 sócios. Começava a decadência da indústria que, sofrendo com os novos tempos, encerraria suas atividades há 8 anos passados. O imóvel foi adquirido pelo milionário Henrique Lemanski, que até hoje ainda não encontrou um destino definitivo para o imenso pavilhão - ideal para sediar unidades culturais.
Uma indústria, uma época que desapareceria sem registro se não houvesse a sensibilidade de Orlando e a casualidade de chegar ao seu interior há pouco mais de dois anos. Eis o seu depoimento, explicando porque as suas próprias custas, fez mais de 2 mil fotografias coloridas - das quais resultaram um livro que, em breve, estará circulando internacionalmente.
"Quando pisei e olhei aquele imenso cenário de abandono e poesia-palco surreal e lírico de fitas e carretéis, bandeiras desbotadas, contrapesos caídos no chão, máquinas do começo do século paradas e inertes, cores e brilhos - fiquei imediatamente apaixonado, mergulhando no universo da Venske e iniciando o registro de sua letargia.
Embora a Venske estivesse fechada desde 1980 e o tempo mostrasse sua presença nos vidros quebrados e nas cortinas rasgadas, curiosamente por outro lado, tinha a sensação que, subitamente, tudo voltaria ao normal, com máquinas girando, pessoas entrando.
Do cenário inicial de meu trabalho pouco resta agora.
A velha indústria poderia ter sido transformada e conservada como um museu de tecelagem. Contudo no nosso País já se tornou um hábito o desrespeito à memória e ao belo, ao homem e à natureza.
Cabe ao fotógrafo o registro das coisas em constante mudança, em constante desaparecimento e esquecimento."
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