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Aramis

O dia em que Bibi veio inaugurar o Cine Ritz

Quando hoje a noite pisar no palco do Auditório Bento Munhoz da Rocha Neto, na única apresentação de "Bibi in Concert" (21 horas, ingressos a Cr$ 1.300,00 e Cr$ 600,00), é possível que alguns espectadores com mais de 50 anos lembrem-se da mesma Bibi Ferreira que, há 42 anos passados, esteve nesta mesma Curitiba - só que bastante diferente. Exatamente em 6 de novembro de 1948, uma sexta-feira, Bibi no esplendor de seus 28 anos, era a grande atração num evento importante dentro da então chamada Cinelândia curitibana: no hall do antigo Cine Ritz, na Rua XV de Novembro, era ela o centro de atrações como estrela do filme "O Fim do Rio", escolhido para marcar a nova fase da casa exibidora que o jornal "O Dia", um dia antes, anunciava como "Curitiba conta com mais um cinema de primeira linha". Não se tratava, propriamente, de uma nova sala de exibição - mas, sim, da terceira fase de uma antiga sala de projeção que já vinha funcionando há alguns anos, mas de forma precária. Batizado anteriormente de "Imperial" e "Vitória", e tendo diferentes arrendatários - entre os quais Antônio Mattos Azeredo (1880-1940) - que durante mais de 20 anos lidera o ramo da cinematografia em Curitiba - a reforma daquela sala, e sua incorporação a uma poderosa empresa de exibição de São Paulo que poucos meses antes havia estendido suas atividades a capital curitibana, foi marcada com um lançamento capaz de justificar grande movimentação na cidade - numa época em que o cinema era de fato a grande, elegante e disputada forma de lazer cultural. xxx A Empresa Cinematográfica Sul Ltda., de São Paulo, comandada pelo mineiro Paulo Barreto de Sá Pinto, hoje aos 80 anos, bastante doente, tinha crescido interestadualmente. Depois de São Paulo, onde sua cadeia de cinemas era liderada pelo luxuoso "Marabá", e se expandindo a Porto Alegre, havia chegado a Curitiba, quando o empresário Ferez Mehry (1879-1946), dono do Palácio Avenida, tinha assumido, novamente, o Cine-Theatro Avenida - inaugurado em 1º de maio de 1929 (com "Moulin Rouge", produção dos estúdios UFA, da Alemanha, de 1927), arrendado a J. Muzillo & Irmãos - substituído, posteriormente por Mattos Azeredo. Com uma nova mentalidade em termos de exibição, introduzindo novidades e, principalmente, comandando um circuito interestadual de bons cinemas, Paulo e seu irmão, Antônio de Sá Pinto, já haviam feito o Cine-Theatro Avenida, após algumas reformas, disputar de forma agressiva o mercado com os outros cinemas de primeira linha da avenida João Pessoa: o Palácio, então já de propriedade do velho Henrique Oliva e cujas origens vinham do final dos anos 20 (época do chamado "Coliseum Paranaense", com frente para a então Rua Aquidaban - hoje Emiliano Perneta), - enquanto o Cine Ópera, inaugurado em julho de 1943 (com "Tudo Isto e o Céu Também") rivalizava-se em luxo e freqüência do público classe A. xxx Para ampliar, assim, sua cadeia de exibição em Curitiba - que incluía também o Marabá (antigo Teatro Hauer), o América, os antigos Odeon e Glória, a Sul investiu na reforma do "Vitória" e para a reabertura escolheu uma produção inglesa, em preto e branco, rodada em 1946, com seqüências na América do Sul e que se chamava "O Fim do Rio" (End of the River), de Drek Twist. A grande atração era o fato de uma brasileira, Bibi Ferreira (Abigail Isquierdo Ferreira, Rio de Janeiro, 1920), ser uma das intérpretes daquele filme que havia feito sucesso na Inglaterra e outros países. xxx O Cine Ritz - o novo nome que o velho "Vitória" recebeu - era descrito com entusiasmo pelo jornal "O Dia": "apresenta-se com instalações caprichosas, que podem, assim, serem especificadas: confortável e atraente sala de espera, esplendidamente mobiliada de vidro; iluminação moderníssima, platéia e boca de cena completamente remodeladas. A platéia lindamente decorada e pronta para ter seu mobiliário substituído por cadeiras estofadas, o que deixou de ser executado pela exiguidade do tempo". Durante mais de duas décadas, o Cine Ritz seria explorado pela Empresa Cinematográfica Sul, que ali sempre procurou manter uma programação de bom nível - muitas vezes com lançamentos feitos paralelos ao do Avenida e outras salas. Só quando houve o alargamento da Rua XV de Novembro na gestão Ivo Arzua, e os velhos prédios do trecho foram demolidos, o cinema cerrou suas atividades. Anos depois a multinacional C&A adquiriu o grande terreno e construiu a sua loja de departamentos. Quando o projeto foi apresentado ao IPPUC, o prefeito Jaime Lerner, cinéfilo fiel e preocupado com o fechamento dos cinemas, propôs que ao invés do miolo-de-quadra, que por lei deveria existir, fosse executado pela C&A um confortável cinema, com 280 lugares. Apesar de ter deixado a Prefeitura - e a sua proposta sofrer alguma oposição pela administração que o sucedeu (que pretendia obrigar a multinacional ao invés de fazer o cinema, financiar creches em bairros), venceu o bom senso e a Fundação Cultural ganhou a sua melhor sala, inaugurada em março de 1985, com o filme "Cabra Marcado para Morrer", de Eduardo Coutinho. Hoje, dentro do circuito oficial da Fucucu, apesar de todos os descalabros que acontecem na área cultural do município, o Cine Ritz é o que tem o lançamento dos melhores filmes - exibindo, por exemplo, atualmente, o emocionante "Entrevista", de Fellini. LEGENDA FOTO - Fachada do Cine Ritz, cuja inauguração, em 6 de novembro de 1948, teve a presença de Bibi Ferreira, intérprete da produção inglesa "O Fim do Rio". Bibi Ferreira, hoje à noite, apresenta um "revival" de seus 50 anos de carreira, no Teatro Guaíra.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
29/07/1990

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