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Aramis

Poucas estrelas e muitas confusões no II FestRio

No ano passado houve a nostálgica presença de Esther Willians, hoje uma sexagenária senhora que pouco lembra da rainha das piscinas dos technicoloridos e escapistas filmes da MGM dos anos 50. Houve também a presença - esta desnuda, a beira da piscina do Hotel Nacional, da argentina Libertad Leblanc - que, como sua compatriota Isabel Sarli, de talento tem os belos seios. Este ano, não houve estrelas. A francesa Bernardete Laffont, que nos anos 60 embalava sonhos da nouvelle vague aparecendo em filmes de Claude Chabrol e François Truffaut, parece muito mais uma tranquila mãe de família - e aliás o é, sempre ao lado de duas (belas) filhas adolescentes e acabou até reecontrando m antigo amor, com quem se casa - informa Zezino - ainda este mês, em Paris. Giam Maria Volonté, o atlético e sempre politicamente esquerdista (ex-deputado pelo PCI) ator de filmes inesquecíveis como " O Caso Mattei" e "Investigações Sobre um Cidadão Acima de Qualquer Suspeita", nem de longe lembrava - mesmo às mais dedicadas fãs - o galã do passado. Envelhecido, alquebrado, de poucas palavras, demonstrou nas poucas vezes que era visto no hall da sala Glauber Rocha, no Hotel Nacional, estar gravemente enfermo (falam, inclusive, em cancer). A estrela maior esperada não chegou: Michelangelo Antonione, após muitas promessas, acabou cancelando sua presença, preferindo ficar em Roma e acertar detalhes do próximo filme, já que finalmente conseguiu um produtor. Em compensação, outros importantes cineastas passaram pelo Hotel Nacional durante a semana retrasada: o chileno Miguel Litin o iogoslavo István Szabo ("Meistofele", "Coronel Reidl"), o espanhol Juan Maria Barden (autor de um clássico: "A morte de Um Ciclista") e até o jornalista cineasta Claude Lanzomann, que veio para ajudar a promoção do seu mastodôntico "Shoah" (10 horas de duração, abordando o genocidio dos judeus), que a Gaumont-Alvorada lança em 1986. Encantando as mulheres com sua cabeleira branca e amabilidade, o argentino Fernando Solonas, foi a última grande personalidade a chegar, para a exibição, no encerramento, com seu maravilhoso "Tangos - O Exílio de Gardel", sem dúvida, o mais belo filme entre quase 200 apresentados durante o II Festival Internacional de Cinema, Vídeo e Televisão. O FestRio, realizado de 21 a 30 de novembro, foi assim: sem grandes estrelas para o grande público (pouquíssimos caçadores de autógrafos), muitos filmes (e tapes), mas poucas obras de maior impacto. Afinal, as grandes vedetes do FestRio - conforme a imprensa nacional divulgou - foram dois brasileiros : Caetano Velloso e Norma Benguel. A POLÊMICA DE MARIE - Na longa solenidade de abertura do FestRio, na noite de quinta-feira, 21, o compositor Caetano Velloso, todo afrescalhado em trajes azuis, foi o mais fotografado - Como a festa demorava a inciciar - nas poltronas reservadas a autoridades, muitos brancos e a espera do governador Leonel Brizolla (que acabou não vindo e sendo representado pelo seu vice Darcy Ribeiro) - Caetano aproveitou para começar a esbravejar em torno das razões na proibição de "Je Vous Salve Marie", o polêmico Filme de Jean Luc Godard, inicialmente cotado para abrir o FestRio (e dentro de uma respectiva do cineasta francês e que acabou sendo suspensa. As manifestações de Caetano tiveram eco: o secretário de turismo Trajano Ribeiro, o prefeito Mauricio Alencar e o diretor-geral do FestRio, Nei Shoulevich, acabaram dando esfarrapadas desculpas, culpando o distribuidor do filme no Brasil (Alvorada, ex-Gaumont, pertencente ao bilionário mineiro Wilton Figueiredo) de ter decidido esperar a liberação da fita pela censura (para a mostra ao Festival, não haveria necessidade desta autorização). Vaias, reclamações e protestos - inclusive da grande dama do teatro brasileiro, Fernanda Montenegro, fizeram com que "Je Vous Salve, Marie" fosse o filme mais discutido da noite - quando se exibiu o longo, cansativo mas muito bonito "Ran", de Akira Kurosawa. A atriz e deputada Ruth Escobar, ao subir o palco, deu nome aos bois: o filme de Godard foi cancelado devido as pressões da Igreja. "A direita da Igreja", gritou, da platéia, a atriz Norma Benguel, integrante do júri e que durante todo o Festival, deixou seu apartamento no Jardim Botânico e levando até o seu gato - felpudo "Afonso Celso"- se instalou em uma suíte (US$ 180 dólares a diária) do Hotel Nacional. AS TRAPALHADAS DO FINAL - A festa de abertura, com a atriz Ana Maria Nascimento e o ator Othon Bastos, como apresentadores já foi tumultuada - inclusive pela falta de traquejo dos mestres-de-cerimonia. Mas a noite de encerramento foi pior: Lucelia Santos e Rubens de Falco recusaram este trabalho, alegando que estão com peças em cartaz (mas apesar disto foram, no início, para entregar prêmios) e foram substituídos por Denis Carvalho e Malu Maeder. Se Denis ainda conseguiu se salvar , a curitibana Malu Maeder, starlete da Globo, teve uma atuação digna de uma comédia dos Trapalhões: confundiu nomes (chamando o prefeito Mauricio Alencar de presidente da Assembléia Legislativa), interrompeu o discurso de um dos homenageados e mostrava muito nervosismo. Luis Carlos Barreto, produtor e presidente do Júri, ao intervir na entrega dos prêmios, sugerindo que a atriz americana Ellen Bursteyn recebesse, em nome de Glenda Jackson, o Tucano de Prata como melhor atriz, acabou provocando o bafafá da festa. A atriz de "Alice Não Mora Mais Aqui" - que pouco foi vista durante o Festival, mantendo-se afastada de contatos com públicos e imprensa - por distração (para outros, por má vontade) não havia entendido, na reunião do júri, que o prêmio de melhor atriz havia sido dividido entre a inglesa Glenda (por "O Diário da Tartaruga") e a canadense Christine Pak (por "90 Dias") e, na hora de receber simbolicamente o troféu, das mãos de Fernanda Montenegro, se recusou. Exigiu explicações e acabou dizendo que não tinha havido empate. O júri (com exceção de Volonte, que nem estava mais na sala) subiu ao palco e confirmou a votação. Ellen tentou desculpar-se mas as vaias foram maiores. Antes porém, Norma Benguel mostrou porque é uma atriz que assusta muitos: quando a confusão começou, ela - toda de branco, muito bonita e charmosa - subiu ao palco e foi dizendo cobras&largatos, ameaçando inclusive responder com palavrões os insultos vindos da Platéia. Um belo desenho animado produzido pela Embrafilmes, em homenagem ao Ano Internacional da Paz, foi apropriadamente exibido logo depois - numa coincidência muito simbólica. E a beleza de "Tangos - O Exílio de Gardel", com a música de Piazzolla, emocionou a todos - conseguindo o que nenhum outro filme mostrado neste FestRio obteve: aplausos unânimes. Aliás, por 5 vezes, a platéia interrompeu a sua trilha sonora, por estridentes aplausos. Um filme maravilhoso que, ao contrário da maioria das fitas levadas este ano ao FestRio, terá lançamento comercial no Brasil no segundo trimestre de 1986. LEGENDA FOTO1: O argentino Fernando Solinas, diretor de "Tangos - O Exílio de Gardel", exibido no encerramento: uma obra-prima que no próximo ano terá lançamento comercial no Brasil. LEGENDA FOTO2: Gustavo Angarita (de chapéu), premiado como melhor ator em "Tiempo de Morir", o filme colombiano que acabou levando também o tucano de Ouro como melhor fita do FestRio-85.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
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08/12/1985

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