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Aramis

Rita, Vania, Zélia, Cássia, Mara e Angélica em seus LPs

Como Simone não tem disco novo na praça - a CBS optou por uma montagem especial de seus maiores sucessos - Maria Bethânia ganha terreno no ranking natalino com seu novo elepê, produção cuidadosa e que teve até a carinhosa participação do mitológico João Gilberto - uma espécie de aperitivo enquanto o mais aguardado disco do ano, o seu, não desova na praça. Claro que Roberto Carlos comparece com seu tradicional produto de fim de ano, no mesmo esquema com que faz há quase 20 anos - e que garante a tranqüilidade financeira da CBS e mais alguns milhões de dólares em sua conta na Suíça. Entretanto, nem só de superstars vive o natal e no campo da voz feminina há, felizmente, algumas opções - para todos os gostos e temperamentos. Eis alguns exemplos. Rita Lee/Roberto de Carvalho (EMI/Odeon) pegam pesado no rock em seu novo elepê. A presença de Carvalho na guitarra e vocais é extremamente hard e poderia até limitar esta produção a um público que se identifique a um som elétrico e pesado. Poderia. Pois felizmente há três faixas que dão a Rita Lee a chance de mostrar o seu estilo sapeca, temperado com ingenuidade e ironia. "Tipo Inesquecível" e "La Miranda", composições dela e Roberto e numa recriação de "La Javanaise", do francês Serge Gainsbourg. Coincidência ou não, nessas três faixas há a dispensável vocalização de Carvalho, cuja presença vocal nada acrescenta nos outros momentos do disco. Vania Bastos está entre as cantoras revelações dos anos 80. Esposa de um compositor-intérprete tão talentoso quanto imerecidamente esquecido, Passoca (Marco Antônio Vilalba, Santos, 1950), Vania também ainda não encontrou o espaço que merece. Entretanto, quem realmente se liga a nossa melhor MPB, não poderia deixar de admirá-la pelo seu estilo personalíssimo, afinação e, sobretudo, ecletismo, como demonstra no novo disco (Estúdio Eldorado, setembro/90), para nós um candidato forte a figurar entre os melhores do ano e ao Prêmio Sharp na categoria de melhor cantora. Trabalhando com diferentes arranjadores e um repertório diversificado, Vania mostra competência em todos os momentos - seja nas parcerias de Eduardo Godim / Costa Neto ("Caiaque", "Paulista"), na composição solo de Gudim ("Outra Estação"), na conhecida "O Rouxinol" de Gilberto Gil / Mautner, numa releitura de "A Filha de Quitia Bacana" (Caetano) acoplada a "Frou Frou" (Rita Lee / Roberto de Carvalho), nas composições de Arrigo Barnabé (primeiro a acreditar em seu talento, ao convocá-la para seus shows), "Sky of my Blues", parceria com Hermelino Neder e Carlos Renno, da trilha sonora de "A Dama do Cine Shangai". Afetuosamente dedicada à filha Rita, Vania interpreta "Pedacinho", composição do marido Passoca; homenageia Caymmi ("A Vizinha do Lado"), amplia "Não Canto na Chuva" de Inácio Zatz e ainda mostra todo seu feeling em "Tudo o que Você É", título que Waldir da Fonseca deu a versão do clássico "All the Things You Are" (Hammerstein / Kern). Some-se arranjos de gente como Paulo Belinatti, Cláudio Leal Ferreira e Amilton Godoy, presenças de um baixista notável como Arismar do Espírito Santo, do baterista Duda Neves e teclados de Amilton Godoy e temos um disco de primeira categoria. Zélia Cristina é outra cantora de vigor que o Estúdio Eldorado prestigia com uma bem cuidada produção. Na safra 90 de novas intérpretes, esta homônima da ministra da Economia - e que por ter morado no Distrito Federal é chamada de "Zélia de Brasília" - o que lhe tira seu bom humor - chega com um repertório escolhido a dedo, que inclui composições próprias como "Outra Luz", que da título ao disco, ao lado de um punhado de composições de autores como Silvia Patrícia / Cal Vanturini ("Meus Olhos"), Luci / Lucina / Klebi ("Que Cara Tem", uma das faixas de maior comunicação), mas sem desprezar autores já conhecidos - como Gilberto Gil ("Super Homem"), Luiz Melodia ("Segredo") e uma parceria de Rita Lee / Lee Marcuci: "Pirataria". Cássia Eller merece tanta atenção da Polygram em sua estréia que ganhou até recursos para fazer um clip tão sofisticado que vai virar média-metragem nas telas. Isto mesmo: entusiasmado pela força desta nova cantora, chegando agora ao disco mas com relativa quilometragem musical, a gravadora chamou o cineasta Luís Carlos Lacerda ("Bigode"), diretor de "Leila Diniz" para fazer um clip. Realizador sensível e experiente, fez uma contraproposta: ao invés de repetir o óbvio esquema dos clips - "que como diz Jô Soares, é música para surdos" - propôs um filme de 30/40 minutos, que pode se transformar num programa de televisão e, autonomamente, levar as imagens de Cássia cantando em cenários dos mais belos pontos do Rio de Janeiro. Criativo, Bigode bolou também participações especiais - desde a atriz Marcélia Cartaxo (de "A Hora da Estrela") até a transformista Laura de Visom, uma espécie de "Divine" brasileiro que faz shows em boates gays do Rio de Janeiro (Divine - na verdade, Harry Glenn Milstead, 1946-1988, era um ator gay que vestido como mulher, apareceu em "trash movies" de John Walters, como "Polyester", "Pink Flaminco" e "Hair Spray"). Mas voltando a Cássia Eller, a moça merece a atenção que a Polygram está lhe dando, pois na briga de foice para conquistar a faixa de público que elege suas musas canoras, é importante quando aparece uma intérprete capaz de encarnar músicas marcantes de autores up to date como Itamar Assunção ("Já Deu pra Sentir"), Hermelino Neder / Arrigo Barnabé ("Não Sei o que eu Quero na Vida"), Mário Manga ("Rubens", "O Dedo de Deus", este em parceria com Arrigo), Renato Russo ("Por Enquanto") e Bocato ("Otário"). A própria Cássia ataca de compositora em "Lullaby" e duas homenagens especiais: "Que o Deus Venha", no qual Frejat / Cazuza trabalharam sobre um belo texto de Clarice Lispector e "Barraco" (Frejat / Jorge Salomão). Há ainda uma referência a Lennon / McCartney, com uma nova releitura de "Eleanor Rugby". "Rubens", de Mário Manga - guitarrista que começa a se destacar como compositor - é irônico e audacioso, ao enaltecer o amor gay - numa prova de que os últimos preconceitos estão caindo. Angélica e Mara são dois exemplos de produtos visuais que chegam ao disco via televisão. Promovidas nacionalmente por seus trabalhos em programas destinados ao público infantil, numa beirada do mercado deixado por Xuxa (cujos discos continuam derrubando o "rei" Roberto Carlos em termos de vendas), estas duas ninfetas tentadora não podem ser apreciadas mais do que como produtos momentâneos - mas que têm o público (e como têm!), para os quais os produtores montam discos com todos os esquemas de fácil consumo. Mara chega ao seu quarto elepê na Odeon, catapultado, naturalmente, pelo seu programa na TVS e embora desde 1988 também assine algumas composições, o produtor Arnaldo Sacomani buscou canções capazes de facilmente caírem no gosto da criança, de autorias de Bozo Barreti, Piska e Sérgio Sá. Bozo, integrante do grupo Capital Inicial, participa nos teclados na regravação de "Esse tal de Roque Enrow", enquanto Mara divide com Marileide a "autoria" de uma lambada, "Doida para Dançar" - entremeando outros produtos tão comerciais como um sorvete ou um chocolate. "Vamos Passear no Parque" (Hoje é domingo), "Carrossel do Amor", "Outra Vez", "Menino de Brinco". Na mesma faixa de público - mas com um prestígio já maior e que tem sido ampliado por atrações em inocentes comédias de Renato Aragão - Angélica repete para a CBS o esquema que adotou desde a sua primeira experiência canora: repertório de facílima comunicação com todos os modismos do momento. E como o grupo baiano Kaoma está em alta, a sua participação na faixa "Me Dá um Beijinho" deve ajudar ainda mais nas vendas. LEGENDA FOTO - Mara: um belo pitéu que canta como um sabor de sorvete.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Música
7
02/12/1990

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