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Teatro da Classe pode fechar as suas portas

A cidade pode perder, a curto prazo, mais uma sala de espetáculos. Segunda-feira, 3 de fevereiro, o corretor de imóveis Mário Damasceno, representando os proprietários do imóvel em que funciona o Teatro da Classe (Rua 13 de Maio, 655) vai colocar aos diretores da Associação dos Produtores de Artes Cênicas do Paraná as condições para a renovação do contrato. Nesta semana, a diretoria da APACP ao tentar pagar o aluguel do mês de dezembro não viu aceito seu cheque, pois o gerente da imobiliária, sr. Joel Damasceno, preferiu esperar o retorno de seu pai, Mário, que se encontra em viagem para decidir em relação à renovação ou não do aluguel. Pertencente a vários herdeiros - coordenados, pelo sr. Gunther Hoffmann (cuja família é proprietária de muitos imóveis no Setor Histórico), o prédio no qual, em abril de 1982, foi inaugurado o Teatro da Classe está alugado hoje ao redor de Cr$ 1.000.000. A excelente localização do prédio e o grande espaço fazem com que, naturalmente, este valor seja irrisório em termos de aluguel. Entretanto, uma ação de recuperação do imóvel - com o despejo do teatro e do restaurante que ali funcionam - não será fácil. A não ser que a diretoria da Associação permaneça na indolência que vem caracterizando-a nos últimos tempos. xxx Originalmente uma antiga fábrica de malhas, o prédio foi parcialmente destruído por um incêndio em 1980. Alguns meses depois, através da Fundação Cultural o imóvel foi alugado e reformado para sediar a chamada "Fábrica do Samba", no qual foi instalado o comando do Carnaval de 1981. A privilegiada localização, o fato do imóvel não poder ser demolido já que se encontra no Setor Histórico e a falta de melhores perspectivas de utilização econômica - mais o estímulo que o então prefeito Jaime Lerner deu à sua ativação como um espaço cultural, animaram o ator José Maria Santos, que na época havia fundado a Associação dos Produtores Teatrais do Paraná, a viabilizar um antigo projeto: um teatro pertencente aos empresários teatrais, "independente de pressões e interesses das entidades oficiais de cultura" como dizia na ocasião. xxx Com a garra e o entusiasmo que o fazem, há 30 anos, o mais independente e ativo ator-produtor do teatro paranaense, José Maria dos Santos foi à luta. Mesmo sem dispor de recursos maiores iniciou as obras a partir de Cr$ 1.000.000, que o então presidente do Serviço Nacional de Teatro, Orlando Miranda, doou à Associação. O arquiteto José de la Pastilla, fez o projeto de reaproveitamento do imóvel e, buscando ajuda em todos os lugares possíveis, economizando no máximo e, pessoalmente, supervisionando as obras, José Maria dos Santos via, em princípios de 1982, o teatro ganhar forma, com uma sala de 196 confortáveis poltronas, bom palco, camarins, além de espaços laterais para outras atividades - um dos quais logo reservado para um bar-restaurante. Como presidente da Associação, José Maria reuniu os 17 empresários de teatro que eram filiados na época e convidou-os para montarem o espetáculo de inauguração e apresentarem projetos para a ocupação futura do teatro. Primeira decepção de Zé Maria: nenhum associado manifestou interesse para fazer a peça de inauguração. Para evitar ter que buscar um espetáculo fora de Curitiba capaz de inaugurar o novo teatro, o próprio José lançou-se à produção da comédia "A Reputação do Quatro Bicos", de Luís Groff - que, graças a uma boa campanha promocional, acabou ficando seis meses em cartaz. xxx Para o bar-restaurante, com um mini-palco, José Maria também tentou interessar algum grupo local. Nada! Montou então a revista satírica "Nem Gay, Nem Bicha", que em horários não convencionais (meia-noite de sábados e domingos) fez com que o "Restaurante da Classe" se transformasse em novo sucesso. Infezlimente, após o período inicial, o Teatro da Classe nunca teve uma ocupação regular. Por falta de divulgação e continuidade nas temporadas passou a abrigar espetáculos semi-amadorísticos, sem condições de atrair maior público. O posterior afastamento de José Maria da presidência da Associação - substituído por José Basso, contribuiu ainda mais para o esvaziamento do local. Basso, mais preocupado com seus espetáculos mambembes pelo Sul do Brasil - que nos últimos anos lhe garantia a sua sobrevivência econômica e, a partir do ano passado, em ocupar a superintendência da Fundação Teatro Guaíra, não deu ao Teatro da Classe o dinamismo que o mesmo necessitava. Enéas Lour, atual presidente (pessoa difícil de ser localizada para prestar informações a respeito) também pouco fez para impedir o esvaziamento daquele espaço cultural, a tal ponto que a campanha "Vá ao Teatro", patrocinada pelo Inacem, pulverizou Cr$ 120 milhões sem qualquer resultado artístico - conforme aqui denunciamos há duas semanas. xxx Enojado com a política cultural do Paraná - especialmente a quem vem sendo desenvolvida pela Secretaria da Cultura e do Esporte (sic), José Maria Santos, 53 anos, sente-se desestimulado a qualquer iniciativa para evitar que o Teatro da Classe venha a ser fechado. Embora sinta em ver um espaço cultural por ele idealizado e construído ficar cada vez mais esvaziado (a tal ponto que inúmeros espetáculos ali encenados têm tido público reduzidíssimo), José Maria não tem motivação para se integrar a uma campanha que poderia, com relativa facilidade, garantir não só a preservação do Teatro da Classe, mas mesmo forçar ao Poder Público (ou algum mecenas da iniciativa privada) a adquiri-lo e doá-lo à Associação. Ao contrário, o seu novo espetáculo, uma revista satírica intitulada "Zé Maria procura Sarney para se coçar" deve estrear no Interior e só terá temporada em Curitiba após turnê por várias cidades. xxx Parte do amplo espaço ocioso do Teatro da Classe está sublocado há mais de dois anos a Studio D, de Dora Paula Soares - o que cobre a despesa fixa do aluguel do imóvel. O bar-restaurante arrendado ao ator-diretor Roberto Menghini tem uma alegre e consumista freqüência, que o torna altamente rentável. Entretanto, em termos de ocupação artística, o teatro propriamente dito tem um aproveitamento que deixa a desejar. Nada, entretanto, justificará que Curitiba perca o Teatro da Classe. Localizado num setor com vocação para espaços culturais e vida noturna, confortável e de fácil acesso, o Teatro precisa ser conservado. Só que para justificar sua existência necessita também de ter uma direção ativa, programar espetáculos atraentes e, especialmente, deixar de ser mais uma "casa Conceição", daquelas que apresentam shows e peças das quais ninguém sabe, ninguém vê! Basta dizer que nem os editores de colunas de programação dos palcos da cidade conseguem saber o que ali é apresentado. Telefona-se para o número 234-9424 e uma voz sonolenta responde: - Teatro da Classe, às suas ordens! - Poderia me informar o que está programado para esta semana? Qual o espetáculo, quem são os artistas, etc.? - Ah! Não sei. - Tem alguém que possa informar? - Não, os diretores estão fora. - E quando é possível localizá-los? - Ah! Não sei. Talvez à tardezinha. O sr. fique tentando... xxx Pano rápido!
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
13
29/01/1986

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