Um lobby para manter o superintendente da FTG
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 15 de fevereiro de 1987
Em nome de uma discutível conquista da classe, um (reduzido) grupo de artistas e empresários do teatro está forçando um lobby em defesa de interesses pessoais. A questão da indicação da lista tríplice para a superintendência da Fundação Teatro Guaíra tem, de forma direta, a intenção de pressionar o novo governo a manter o atual superintendente José Basso, através de uma estratégia dita cooperativista.
Provando que o grupo que hoje domina a Associação de Produtores de Artes Cênicas (quantos associados existem?), não representa, em absoluto, o pensamento da categoria, o Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do Paraná, em nota oficial divulgada na quinta-feira, 12, denunciou a manobra, inclusive do uso indevido do nome da entidade nas declarações do grupo de artistas que vem percorrendo veículos de divulgação para forçar a aceitação de uma lista tríplice de candidatos ao cargo.
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Lucio Togo Mange, 48 anos, presidente do Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do Paraná, veterano ator de origens circenses (do que muito se orgulha), na nota de esclarecimento a opinião pública lembra, com clareza, que as "listas tríplices" (pois que são três listas de três nomes cada), não são absolutamente uma conquista da classe, mas sim um artifício usado pelo então Secretário da Cultura e do Esporte, senhor Fernando Ghignone, para dividir a classe das Artes Cênicas paranaense, até aquele momento unida e lutando por interesses comuns. Artifício esse que seria usado para quebrar o impasse entre a SECE e a classe na crise originada pela demissão de diretores da Fundação Teatro Guaíra (maio/85).
A inabilidade e incompetência do ex-Secretário da Cultura e Esportes - há pouco ainda reconhecida pela sua substituta, secretária Suzana Munhoz da Rocha Guimarães (que publicamente, em declarações oficiais, o acusou de omisso em relação a importantes questões da cultura paranaense), foi a responsável pela mais grave crise da Fundação Teatro Guaíra, há quase dois anos, quando, de forma autoritaria e desleal, demitiu os diretores Iara Sarmento e Oracy Gemba, provocando a revolta da classe teatral. Então, tentando manter-se no cargo (no qual só permaneceu devido sua amizade com o ex-governador José Richa), o secretário propôs que as entidades indicassem nomes, mas numa manobra que, então, já foi denunciada pelo STED/PR, conforme Lucio Togo Mange recorda:
- "Na época, alertamos as demais entidades e ao senhor Secretário sobre a decisão que fatalmente se daria quando cada categoria (trabalhadores, artistas e técnicos, produtores e amadores), lutasse por seus indicados. Por que não a classe votar como um todo e tirar uma só lista com três nomes? Não convinha". Acrescentou o presidente do Sindicato. Entre as indicações dos nomes até a escolha de José Basso para a superintendência, passaram-se quase cinco meses, período em que o referido Secretário chegou a declarar a imprensa ("Gazeta do Povo", 28/8/1985), "que nenhum dos candidatos tem a qualificação necessária para assumir a Superintendência".
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Agora, face a posse de um novo Governo, a Associação dos Produtores de Artes Cênicas vem tentando, já há um mês, pressionar o secretário escolhido para a pasta da Cultura, professor Renê Dotti, num lobby claramente conduzido para nomes previamente definidos, e em cuja lista estará o do atual superintendente, desejoso de permanecer na função.
Por sua própria formação de democrata liberal - do que é prova 30 anos de advocacia em que tem defendido centenas de causas políticas e ecológicas, sem nunca pensar em honorários - Renê Ariel Dotti sempre viu como legítimas as aspirações classistas. Entretento, surpreende-se com a forma de pressão agressiva que vem sendo exercida por um reduzido grupo de pessoas, que dizendo interpretar o pensamento "de milhares de profissionais" (SIC), arvora-se agora ao redor de uma entidade que, nos últimos anos, tem tido pouquíssima atuação na defesa dos interesses da categoria. Tanto é que devido a incompetência da atual diretoria o Teatro da Classe (depois Teatro 13 de Maio), está sendo despejado do prédio que ocupa na rua 13 de Maio, conforme aqui registramos em nossa coluna de sexta-feira, 13 do corrente.
Afinal, antes da atual ação de despejo por denúncia vazia, por duas vezes a referida Associação foi processada por atraso de pagamento dos alugéis. Ainda recentemente, por ocasião da Campanha da Kombi, a mesma Associação não teve a mínima preocupação de coordenar a divulgação dos espetáculos beneficiados Com as subvenções do INACEM, nem sequer informando com exatidão as datas e locais em que os mesmos eram apresentados. Curiosamente, esta mesma entidade, agora vem usando toda sua discutível representatividade num lobby destinado a beneficiar pessoas ligadas a sua diretoria (é bom não esquecer que José Basso era o presidente da Associação, quando a mesma fez a sua indicação para a lista tríplice).
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Em que pese a simpatia com que uma lista tríplice pode ser encarada por parte da opinião pública, a escolha de diretores da Fundação Teatro Guaíra deve partir do Secretário da Cultura, com aval do governador - já que se tratam de cargos de confiança. Portanto, pressionar um novo governo em termos de nomes é também uma atitude autoritária e antidemocrática. O jornalista Adherbal Fortes Júnior, num lúcido artigo a respeito ("A república Corporativista do Guaíra", "Correio de Notícias", 11/2/87), lembrou que "de qualquer forma, cargos de confiança não deviam ser objeto de pressão sindical ou corporativista. Já imaginaram a Ordem dos Advogados desfilando em frente do Palácio Iguaçu para reivindicar a indicação do secretário da Justiça? Ou o CREA exigindo o direito de apontar o secretário dos Transportes? Ou a Associação Médica brigando para colocar alguém de sua confiança na Saúde?
Para exorcizar de uma vez por todas o fantasma de uma república corporativista é preciso começar por repelir esse tipo de pressão ilegítima. É a parte querendo mandar no todo - absurdo que contradiz todos os princípios do Estado de Direito".
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José Maria dos Santos, 53 anos, 33 de teatro, fundador e ex-presidente da Associação de Produtores de Artes Cênicas tem, reiteradas vezes, denunciado o lobby que a mesma está fazendo "para favorecer pessoas e não a classe, em nome da qual arvora-se a falar".
Responsável pela construção do Teatro da Classe - cuja decadência após o seu afastamento da presidência deve-se, justamente, a falta de competência administrativa dos srs. José Basso e Enéas Lohr, este o atual presidente da entidade - José Maria Santos, repeitado por sua sinceridade e coragem, tem dito o que pensa:
- A experiência mostra que a presença de um membro da classe na superintendência do Teatro Guaíra não significa boa administração. Ao contrário, tivemos resultados frustrantes sempre que a direção foi entregue a artistas. Sou muito mais favorável a um bom administrador, com experiência na área cultural, honesto, competente e que possa desenvolver um trabalho executivo.
Profissional de teatro que, ao longo das últimas décadas tem realizado um trabalho sério e honesto, sem recorrer a subvenções oficiais (critica inclusive a forma com que alguns produtores (SIC), se apegam a subvenções para espetáculos de discutível qualidade), José Maria é uma, entre muitas vozes, conscientes, que erguem-se neste momento de difinições, contra a pressão de interesses particulares que buscam envolver toda a classe artística.
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