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Aramis

Uma história a espera de um cronista: nossa noite

A simpática idéia do poeta e publicitário Paulo Leminski em entrevista para o "Almanaque" dominical, do qual agora é colaborador regular, dois proprietários de bares - o "Camarim" e o "Moby Dick", faz com que se volte a um projeto que há muito exige pesquisas de maior profundidade: um levantamento da história da boemia curitibana. Afinal, pouco a pouco estão desaparecendo os boêmios da Curitiba dos anos 30 a 50 e com eles se perdem histórias, dados e todos um folclore riquíssimo, sobre uma época em que a cidade era mais feliz. Por exemplo, a memória do simpático Alcides, que durante anos foi proprietário do bar O.K. - inicialmente na Praça Osório (onde hoje existe o edifício Wavel) e, posteriormente, na travessa Jesuíno Marcondes (ao lado da antiga Telefônica), cometeu uma falha. Ao falar que Paulo Wendt foi assassinado na boate Moulin Rouge, Alcides enganou-se: Wendt era proprietário da boate Marrocos, na esquina das ruas Dr. Murici/Marechal Deodoro (Praça Zacarias) e foi ali que na madrugada de 20 de julho de 1966 foi morto a tiros, após uma briga, na qual dois de seus leões-de- chácara agrediram um freguês devido a problemas de pagamento da conta. A boate Moulin Rouge nunca pertenceu a Wendt. Teve diferentes donos e, por último, o velho J.P. Guimarães, também já falecido, a explorou em muitos endereços. Acabou na esquina da Rua Carlos de Carvalho com a travessa Cabral, no andar superior de um posto de gasolina - hoje pertencente ao Touring Clube. Após a morte de Guimarães, um homem da noite, o Paulista (eis um dado a ser levantado: o seu nome?) ali ficou como arrendatário. Mais tarde, Paulista associou-se a bela Ediluz Iliponti, já então viúva de Paulo Wendt, no "1810", um piano-bar de características mais modernas (por exemplo, não tinha mulheres profissionais) e que funcionou entre 1965/ 1969 na Rua Marechal Deodoro - num prédio hoje ocupado pela Sharp. José Curi, jornalista, editor da "Panorama", sempre uma grande figura e boêmio generoso, chegou a associar-se a Ediluz no "1810" em sua fase final. Anteriormente, em suas generosidades para com grandes paixões da madrugada, Curi havia financiado compras de outras uiscarias na cidade. xxx Um dado que causa muita confusão: quando a boate Marrocos fechou definitivamente, Paulo Wendt, já tinha morrido. Já contamos aqui a história, mas não custa repetir. Em agosto de 1966 - portanto algumas semanas após a morte de Paulo Wendt, acontecia em Curitiba a estréia nacional de "O Senhor Puntila e seu Criado Matti", de Bertold Brecht (1898-1956), que foi uma das primeiras grandes montagens dirigidas por Flávio Rangel. Na cabeça do elenco, como o Sr. Puntilla, estava Jardel Filho, temperamento boêmio e violento. A peça ainda estava em fase de ensaio geral - com um grande elenco (nomes famosos hoje, na época em início de carreira) e, numa madrugada, Jardel foi a Marrocos. Na hora de pagar a conta, reclamou e foi agredido - jogado escadaria abaixo. Hospitalizado, o que atrasou em dois dias a estréia do espetáculo, a agressão que sofreu foi a gota d' água para fechar a Marrocos, que apesar da boa vontade do diplomático titular da Delegacia de Costumes, Miguel Zacarias (já falecido também), teve suas portas cerradas - então definitivamente. É que o governador Paulo Pimentel, pessoalmente, deu esta determinação, pois a companhia de teatro vinha a Curitiba para fazer uma estréia nacional de uma peça de Brecht - em homenagem aos 10 anos da morte do dramaturgo alemão - e o fato teve repercussão nacional. xxx O folclore da noite curitibana é riquíssimo. O publicitário Sérgio Mercer, hoje um boêmio aposentado, nos tempos em que assinava uma coluna no suplemento "Fim de Semana", aqui em "O Estado", chegou a fazer uma série de deliciosos textos sobre a vida noturna dos anos 50, baseado, principalmente, em reminiscências de seu amigo Luiz Renato Muniz Ribas, jornalista da velha guarda. Posteriormente, quando presidia a Fundação Cultural de Curitiba, Mercer fez questão de editar o melhor das crônicas de Renatão, publicadas na coluna "Ecos da Noite", na "Tribuna do Paraná" (1957/1961). Mas afora as reminiscências de Renatão, há muito material a ser pesquisado. Há alguns anos, quando dava seus primeiros passos em busca de badalação cultural, o então estudante de engenharia Rafael Greca de Macedo, apropriando-se de uma idéia que tínhamos, escreveu, rapidamente, uma reportagem sobre a noite curitibana, publicada na revista "Panorama". Ficou, entretanto, no superficial, baseado em poucos depoimentos - quando o tema exige uma visão bem maior. De qualquer forma, como agora Rafael é o poderoso deputado pedetista, uma das vozes mais influentes na administração municipal, talvez se faça alguma pesquisa deste lado obscuro da história curitibana. Afinal, a cada dia que passa estão morrendo os personagens que podem contar os fatos, nunca registrados oficialmente mas que fazem parte desta cidade sem portas. LEGENDA FOTO - Jardel; pivô da briga que fechou a boite Marrocos.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
3
04/01/1989
Sou a neta de Paulo Wendt. O artigo acima tem diversos equivocos em relação ao nome da viúva que não é o de minha avó, sobre a briga de Jardel Filho (fechou e abriu) e o tocante ao fechamento da Boate Marrocos que só teve suas atividades encerradas algum tempo depois de sua morte. A viúva de Paulo Wendt está viva com 92 anos, filhos e netos. Comprovados por certidões de nascimento e casamento. Grata Denise Wendt

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