Violonistas
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 01 de junho de 1980
São tão raros os discos de solistas de violão que os lançamentos merecem registros, mesmo quando ocorridos já algum tempo - como no caso dos álbuns de Turíbio Santos e Julian Breach, ambos do elenco internacional da RCA, interpretando as mesmas peças - 12 estudos para violão de Heitor Villa-Lobos (5 de março de 1887-17 de novembro de 1859) ou as avançadas propostas de Stênio Mendes, somando ao violão, também a craviola (invenção de seu tio, o consagrado Paulinho Nogueira), vozes e percusão.
Aos 37 anos, Turíbio Santos é hoje o mais importante violonista brasileiro no campo erudito: a longa permanência na Europa, regulares apresentações em vários países, divididas hoje com a direção da Sala Cecília Meireles, tornam seu tempo bastante curto para se preocupar com gravações no Brasil, embora tenha feito alguns discos antológicos, como o << Choro do Brasil >>, produção de seu amigo estimulador Herminio Bello de Carvalho, gravado na Tapecar, e o melhor disco entre tantos álbuns instrumentais de choro feitos em 77. Na França, contratado de Erato, Turíbio tem uma dezena de elepês em catálogo, tendo inclusive inaugurado a série << Florilège de la guitare >>, posteriormente transformado em << Panorama da Guitarra >> - incluindo virtuoses como seu amigo (e extraordinário pessoa humana) Oscar Caceres, o cubano Leo Browerr, entre outros. A RCA, que detém a representação de Erato no Brasil, até agora somente editou o volume 1 desta série, gravado por Turíbio, há 12 anos passados, interpretando os 12 estudos na guitarra, que Villa Lobos começou a compor em 1929, e que só em 53 foram propostos para publicação, dedicados a Andres Segovia, que entusiasmado os definiu como portadores << ao mesmo tempo, (de) fórmulas de surpreendente eficácia para o desenvolvimento da técnica de ambas as mãos e belezas musicais << desinteressadas >>, sem finalidade pedagógica, valores estéticos permanentes de obras de concerto >>. Não é preciso ser um profundo conhecedor de música para se reconhecer nestes estudos de Villa-Lobos, uma das obras-primas da música contemporânea, que resistem ao tempo e que teve na sensibilidade de Turíbio uma interpretação perfeita. Lançada na França em 1968 - e no Brasil em 1975, este disco ainda pode ser encontrado em algumas lojas que sabem selecionara oferta (como a Sartori, na Rua Marechal Deodoro) e se trata de obra-de-catálogo: deve permanecer sempre. Só lamentamos que os outros discos de Turíbio, gravados no Exterior, aqui não tenham saído e que suas eventuais gravações, como as que fez para discos-brindes, tenham ficado restritos a um privilegiado grupo de pessoas que os receberam. No ano passado em seu prestigioso << Red Sead >>, a RCA incluiu a edição de interpretação que Juliam Bream deu aos 12 Estados Para Violão, que possibilita a comparação das mesmas obras na visão de dois virtuosos do instrumento. Bream incluiu ainda em complemento, ao lado 2, a chamada << Suite Populaire Brésilienne >>, composta de 5 pequenas peças, que Villa-Lobos criou entre 1908/1912. Com esta edição, a RCA prestou uma excelente contribuição a quem se interessa pela música do mestre Villa.
Na sua coleção << Música Popular Brasileira Contemporânea >>, dedicada a dar oportunidade aos instrumentistas mostrarem seus trabalhos, a Philips/Polygram, edita o lp de Stênio Mendes. Sente-se neste jovem uma profunda influência de Egberto Gismonti: no texto de contracapa, fala dos índios xingús, suas crianças, seus ritos - temas que marcaram profundamente a Gismonti, há alguns anos e o levaram a fazer o internacionalmente consagrado << O Sol do Meio-Dia >>. Assim com Gismonti utiliza a percussão (do notável Naná Vasconcelos) em contrapartida ao violão (e, em seu caso, também a flauta e teclados), Stênio encontrou em Ubiraci de Oliveira (Bira) e José Eduardo Nazário, percussionistas identificados com suas propostas. Alternando-se na craviola e violão com arco, Stênio acrescenta vozes - somando inclusive a participação especial de sua mãe, Ruth Mendes Nogueira, em << Linhas Tortas >>.
Com exceção de uma fusão de << Aquarela do Brasil >> (Ary Barroso) a << Also Sprach Zarathustra >> (Strauss) e o popularíssimo << Hara Nagilah >> (A . Z. Idelsohn), todas as composições são de Stênio: << Taquará>., << Espada de Anjo >> , << A Sonata Perdida >>, << Invação dos Monges >>, << Linhas Tortas >>, << A Barca dos Homens >> e << Rosário >>. Não é um lp fácil de ser consumido e nem será ouvido nas rádios. Mas é, sem dúvida, um disco-marco do início da caminhada de um novo forte e vigoroso talento, que não teme em aceitar os riscos de sofrer uma restrição comercial, preferindo ao invés de um repertório facilmente assimilável, a proposta de um som instrumental - somado a voz e a percussão, que o faz ser ouvido com maior atenção.
FOTO LEGENDA- MPBC Stênio Mendes
FOTO LEGENDA1- Julian Bream
Villa-Lobos
FOTO LEGENDA2- Oboe Und Orgel
Musik Des 18. Jahrhunderts
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