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A "Arapuca" de Maurício

Com quase 20 anos de atividades teatrais, nos mais diferentes setores - intérprete, diretor, cenógrafo, produtor - Maurício Távora é um homem habituado a linguagem cênica. Redator de publicidade disputado, humor satírico e crítico à flor da pele, aprendeu em seus anos de primeiro aluno do Colégio Dom Pedro II, no Rio de Janeiro, a domar as palavras, a "enxugar" um texto. Assim, unindo à vivência teatral, um cáustico humorismo e o conhecimento do vernáculo, Távora desenvolveu, após muitos meses, um texto que considera como fruto de uma relativa maturidade profissional: "Arapuca" (auditório Salvador de Ferrante, até dia 10, 21 horas). Anteriormente, é bem verdade, Maurício já havia escrito outras peças: as chanchadas "Fofoca no Paralá" e "Não Me Lote Brasilino", especialmente para temporadas suadas nos heróicos tempos da sociedade Paranaense de Teatro, no Teatro de Bolso, que funcionava na Praça Ruy Barbosa, graças ao idealismo de Ary Fontoura e seu grupo, do qual Maurício fazia parte. Depois houve um longo período de televisão, quando a inexistência do vídeo-tape permitia que os artistas locais criassem algo. E, ao lado de Jane Martins (sua esposa), Maurício escreveu, dirigiu e interpretou uma longa série de programas, na linha do "Alô, Querida!" - situações bem humoradas no cotidiano de um casal. Portanto, Távora, que hoje está absorvido em funções administrativas na superintendência da Fundação Teatro Guaíra, é um homem que sabe das coisas do teatro. Apesar de toda essa vivência, só após ter visto o espetáculo no palco, pode ter uma visão em conjunto e chegar a algumas conclusões, uma das quais é a de que o seu texto suporta, tranqüilamente, uma remontagem por qualquer grupo profissional. Podendo inclusive adquirir uma dimensão bem mais ampla, do que a conseguida nesta primeira produção - realizada com esmero, bom gosto, mas sofrendo, ainda, certas limitações. O inglês Anthony Shaffer desenvolveu em sua clássica peça "Sleuth" (em São Paulo encenada com Sérgio Viotti e Ney Latorraca com o título de "O Estranho Caso de Mr. Morgan" e no Rio com Paulo Gracindo e Gracindo Júnior, com o título de "O Jogo do Crime"), uma inteligente situação entre dois personagens - um escritor de novelas policiais apaixonado por jogos, Andrew Wyke, enfrentando num duelo verbal e de intrigas, o cabeleireiro Milo Tndle, amante de sua esposa. Aparentemente o texto de Shaffer, nada tem em comum com "Arapuca", uma peça ambientada em Curitiba, com referências locais. Mas, a exemplo daquela peça inglesa - o texto de Távora oferece ao público uma série de elementos para desenvolver um raciocínio amplo, questionando inclusive valores (honestidade, fidelidade etc.). No momento em que um jogo estranho - de carcereiro e prisioneiro, sofre uma inversão, a peça deixa de ser uma simples comédia e adquire um sentido bem mais amplo. Pena que, por uma série de razões, não tenha sido explorado esse aspecto da idéia teatral do autor, permanecendo os personagens - Feijó (Joel de Oliveira, atuação segura e criativa), Tatuíra (José Plínio) e Lídia (Lota Moncada), limitados e mesmo com uma certa frieza - faltando o "timing" exato. Mas o que não retira de "Arapuca" os méritos de uma encenação séria, realizada com bom gosto e capaz de atingir amplas faixas de público, embora saudavelmente polêmicas em seu resultado. A sonoplastia, criada por Cesarti e executada por Luís Carlos Assad, funciona adequadamente, assim como a iluminação de Luthero Almeida. A cenografia de Nilson Burda, embora artificial é plasticamente interessante. Vale a pena assistir "Arapuca". Mesmo que seja para discordar!
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Tablóide
4
05/04/1977

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