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Aramis

De Nelson a Karan

NELSON GONÇALVES - Poucos, muitos poucos, cantores tem permanecido tão fiéis a uma gravadora como Nelson (na verdade Antônio) Gonçalves, paulista do dia 22 de junho de 1920. Não só fiel mas lucrativo, pois esse cantor romântico, que antes de ser cantor foi boxeur e garção, é, há pelo menos 20 anos, um dos artistas de maior prestígio popular. O tempo passa e Nelson permanece, com um repertório que durante anos foi caracterizado pelas músicas de Adelino Moreira, de quem foi durante tempo uma espécie de intérprete exclusivo. Nos últimos anos, Nelson vem diversificando seu repertório, gravando autores modernos - mas sempre em seu estilo de "vozeirão" romântico. Já gravou cerca de 100 elepês, mesmo número de 78 rpm e compactos e é o único artista da RCA Victor, em todo mundo, há ter em catálogo, permanente, mais de 30 elepês - todos vendendo sempre. Além do mais, pela experiência, Nelson é capaz de gravar todo um elepê numa única sessão (período de registro, contratado em estúdio), o que é um fato raro - quando se sabe que a maioria dos cantores e mesmo instrumentistas demora vários dias para fazer um elepê. Tudo isso deve ter contribuído para que a RCA Victor produzisse um álbum quase inédito em termos de Brasil: "Nelson de 3 Gerações" (RCA Victor, 112.0001/ 2/ 3, fevereiro/77), reúne nada menos que treze elepês, num total de dezoito músicas. Produção de Adelino Moreira, com arranjos e regências divididos entre os maestros Nelsinho e Carioca, é uma obra com unidade o que se explica pela facilidade de Nelson gravar muitas músicas em seguida - como se fosse uma apresentação ao vivo, ele que tem viajado por todo País - sempre emocionando o público humilde mas que sinceramente lhe dedica um grande amor. Onze das dezoitos faixas foram reservadas a músicas de Adelino Moreira, sem dúvida o autor de alguns dos mais populares, sucessos de Nelson. Mas, as que sobraram foram reservadas a bons compositores, como sempre valorizadas (e popularizados ainda mais quando tem suas músicas gravadas por ele). Assim temos desde Noel Rosa, com "Último Desejo" e "Três Apitos", até Rildo Hora - Sérgio Cabral ("Parece Que Foi Ontem"), passando por Antônio Almeida ("... E Os Outros Que Se Sanem Foot - Ball Club"), Benedito Lacerda ( e Frazão) ("Sabiá de Mangueira"), "Apelo", de Baden Powell e Vinícios de Moraes, "Folha Morta" de Ary Barroso, Herivelto Martins ("Atiraste Uma Pedra" e "Ela Me Beijou"), passando por dois fados - "Nem As Paredes Confesso" (Arthur Ribeiro/ F. Trindade) e "Só Nós Dois" (Joaquim Pimentel), há uma faixa particularmente curiosa: "Dolores Sierra" de Wilson Batista e Jorge de Castro, uma das músicas mais interessantes mas, ironicamente, menos conhecidas do grande Batista, falecido em 1969, aos 63 anos de idade. Para os fãs de Nelson Gonçalves - esses são muitos, um lançamento que por certo não os assustará, apesar do preço não ser dos mais reduzidos. Mas afinal são 13 bons LPs. RICARDO- Para um Nelson Gonçalves que resiste a modismos e mudanças da MPB, existem dezenas de imitadores ou discípulos, a procura de uma mesma popularidade. Artistas até bem intencionados, preocupados em conquistar a imensa faixa de público que gosta de canções românticas, dramáticas, das quais Gonçalves se tornou especialista. A Som Livre/ Sigla, por exemplo, investe todo seu poderio promocional em um novo compositor e intérprete chamado Ricardo, que no lp de estréia ("Eu Gosto de Você", Sigla, 403.6098, novembro/76), apresenta três músicas próprias, ao lado de compositores como Odair José, Paulinho Camargo e Clayton. LÉO KARAN- Quantos talentos existem espalhados pelo Brasil, sem chance de mostrarem suas composições e sua voz? Mesmo em São Paulo, com todas as facilidades fonográficas/ promocionais, dezenas de talentos permanecem restritos as casas de samba, sem poderem lançarem-se nacionalmente. Era o caso de um jovem chamado Léo Karan, "o grande íntimo da noite paulista, figura doce e boa, rara pessoa em que ainda se pode confiar por inteiro nesses nossos corrompidos tempos atuais", em uma música (" Por Incrível Que Pareça"). E a MPB deve a Marcus Pereira, esse cavaleiro andante em defesa de valores esquecidos, a revelação de Karan, em seu primeiro lp ("Urbana", Marcus Pereira, MPA 9347, lançado no ano passado), o suficiente para lhe garantir seu nome como a grande revelação. Revelação em termos nacionais, pois a julgar pela cronologia das 12 músicas gravadas - 3 em parceria com Adauto Santos e Gilberto Karan, oito apenas com Gilberto Karan e uma última com Paulinho Cézar Pinheiro - Léo vem compondo desde 1969. Todas são músicas excelentes, letras trabalhadas, belíssimas harmonias - do tom francês da "belle époque" de "Charlotte" até a "Crônica da Cidade Natal", dedicada à cidade de Novo Horizonte, SP, onde Léo nasceu. Excelentes instrumentistas acompanham Léo Karan em cada faixa. Um disco importantíssimo, audição recomendável a todos que se interessam pelo que há de novo - e bom - em nossa MPB. MILTINHO- (Milton Santos de Almeida), 49 anos - completados dia 31 de janeiro último, é um dos cantores de maior balanço da MPB. Ex-integrante de grupos vocais ("Os Namorados da Lua", "Anjos do Inferno" e "4 Ases e um Coringa"), crooner dos Milionários do Ritmo, de Djalma Ferreira, só no final dos anos 50 teve chance de fazer as primeiras incursões como solista, gravando na Sideral o lp "Um Astro Que Surge" e tendo, logo a seguir uma série de sucessos ("Palhaçada", "Eu e o Rio", "Poema das Mãos", etc.). Nos últimos 18 anos, Miltinho tem gravado regularmente, sempre de seu estilo bem dividido, animado agradável de se ouvir. Mas continua a ser , basicamente, um cantor intimista, da noite, o que o faz um artista com um campo de trabalho restrito, fora dos circuitos universitários - já que este público não entenderia o estilo e o sentido musical do veterano Miltinho. Depois da série de lps divididos com Dóris Monteiro e Elza Soares, Miltinho reaparece com um álbum - solo, com um repertório de músicas novas, revelando um desejo de renovar o repertório. Assim Miltinho gravou principalmente sambas de autores como Paulinho Rezende ("Cicatriz de Carnaval", "Deixa O Carnaval Passar", "Depende" ) , Dedé da Portela - Sérgio Fonseca ("Palavra de Um Preto Velho"), Julinho de Castro ("Exorcista") e Mita ("Admito Minha Culpa"). Alguns veteranos também estão presentes - como João Roberto Kelly ("Made In Mangueira"), Jair Amorim - Evaldo Gouveia ("Nota Dez"), Romeo Nunes ("Foi Assim" e "Devagar"), além do veterano Dunga ("Só Mesmo Louco"). REEDIÇÕES - Através do selo Coronado, a Odeon vem reeditando excelentes elepes de seu acervo magnífico . O setor comercial, dirigido pelo sensível Odair Primo, tem estimulado muitas destas reedições, inclusive, por nossa sugestão, fez o magnífico "Lúcio Alves Interpreta Dolores Duran". Agora três reedições indispensáveis da Odeon , destinado a faixas específicas de consumidores! O romantismo de Silvio Cesar (SC - 10098), com suas melhores composições ("O Moço Velho", "Eu Quero Que Você Morra", "Por Teu Amor", "A Minha Prece de Amor" e "Prá Você", entre outras) tem o sabor de novidade para quem há tempos não ouvir este excelente interprete - compositor, nome meio esquecido nos últimos anos . O melhor do compositor Lupiscinio Rodrigues ( 1014 - 1964) está na voz de Francisco Egydio , do lp gravado em 1961, acompanhado pelo conjunto de Walter Wanderley e agora, então boa hora reeditado. E, finalmente a reedição de "Água & Vinho", o lp que Egberto Gismonti fez há cinco anos passados, mas na época incompreendido. Agora, com Gismonti sendo melhor entendido , é um disco básico, mostrando toda a extraordinária criatividade deste instrumentista - compositor, sem dúvida ao lado de Milton Nascimento e Hermeto Paschoal, o tripé básico da música instrumental brasileira nos anos 70.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
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13/03/1977

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