Goodman no clássico com obras de quatro mestres
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 31 de maio de 1987
Com a morte de Benny (Benjamin David) Goodman (Chicago, 30.05.1909 - Nova Iorque, 13.06.1986) o jazz perdeu um de seus últimos grandes nomes. Compositor, clarinestista, maestro - e antes de tudo uma figura carismática, identificada à época das big bands, Goodman deixou milhares de gravações, participação em muitos filmes (além de ter sido biografado em "Musica Irresistível de Benny Goodman", 1955, que merecia [ser] relançado ao menos na televisão) e uma lembrança permanente da boa música criativa.
Entretanto, poucos conhecem o lado erudito de Benny Goodman, que, inúmeras vezes, fez concertos como solista de grandes orquestras. Por exemplo, sob a regência de Bernstein, Aaron Coopland, Gould e até o lendário Igor Stravinsky - em seu "Concerto Ebony", Goodman deixou registros históricos, reunidos no "Reunin em La Cumbre" (CBS, 5477), que conhecemos de uma edição argentina.
Justamente para mostrar esse lado erudito de Goodman, o incansável Maurício Quadrio concluiu num álbum maravilhoso (CBS Masterworks), três daqueles momentos, mais o "Contrasts" (1938), em três movimentos (Verbunkos/ Piheno/ Sebes) de Bé Bartock (1881-1945), com o próprio compositor húngaro o acompanhando ao piano, enquanto o histórico Joseph Szigeti (1892-1973), também de origem húngara, executa violino.
O musicólogo Edward Cole costumava dizer que Goodman sentia-se à vontade tanto quando interpretava o Quinteto para clarineta de Mozart como ao tocar "Honeysuckle Rose", de Fatz Waller. E justamente gravando peças de Aaron Coopland, Morton Gould, Bartok e Igor Stravinsky nesta gravação, testemunha a altíssima estima que eles dedicavam ao seu talento.
"Prelude, Fugue and Riffs" de Leonard Bernstein foi composta em 1949 para Woody Herman. Embora seu estilo tenha como fonte o jazz, em particular o swing, esta composição contém idéias que se assemelham à da improvisação em um quadro de estruturas estritas de forma quase clássica.
Já o "Concerto para clarineta e orquestra de cordas" (com harpa e piano) de Aaron Coopland foi encomendado por Benny Goodman em 1947 e terminado em Nova Iorque no ano seguinte. O movimento de abertura é uma pastoral langorosa de frases longas, trazendo a marca inimitável de Coopland. Elementos da música popular da América do Norte e do Sul - esta última baseada numa melodia brasileira que, segundo o compositor, "fixou-se" em seu espírito quando ele trabalhava nesta peça - entrecruzam-se no segundo movimento. Em outros pontos encontram-se passagens de improvisação quase "hot", aparentemente inspirados nos improvisos sofisticados pelos quais Benny Goodman se tornou célebre do domínio do swing.
O "Ebony Concerto" de Igor Stravinsky, para clarineta e orquestra de jazz, foi escrito em 1945 a pedido de Woody Herman. Durante seus movimentos - uma abertura Allegro moderato nervosamente ritmada, um Andante central brumoso, do tipo blues e um final Moderato trepidante - esta peça segue um curso inflexível de ritmos contrastados que se opõem fortemente uns aos outros para dar, no final, quase paradoxalmente, um efeito de pureza clássica de estrutura quase primitiva.
Finalmente, os "Contrastes" para violino, clarineta e piano foi encomendado por Goodman e pelo violinista Joseph Szigeti, um compatriota de Bartok. Esta suite, datada de Budapest, 24.09.1938, foi concebida como rapsódia em dois movimentos.
Um álbum importantíssimo tanto aos que se interessam pela obra de Benny Goodman, como homem do jazz - como aos cultores do erudito, na oportunidade de ver leituras diversas de 4 grandes autores eruditos através de um dos maiores clarinetistas do mundo.
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