Maestro Pugliesi, uma vida pelo melhor tango
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 20 de julho de 1986
Se Gardel, Piazzolla e mesmo Aníbal Troillo são conhecidos no Brasil, aqui tendo discos editados com maior ou menor regularidade, Osvaldo Pugliesi, aos 80 anos de idade - é, por incrível que pareça, ainda um nome pouco divulgado fora dos círculos mais ligados ao tango tradicional.
Pela primeira vez este pianista, regente e compositor vem ao Brasil - ele que há 26 anos passados já excursionava pela União Soviética e China Continental. É bem verdade que suas posições políticas - é membro do partido Comunista desde 1936 e, por duas vezes, foi candidato (simbólico) à presidência da República - prejudicou muito sua carreira.
Agora, quando vindo ao Brasil para uma excursão por cinco capitais - iniciada em São Paulo, prosseguiu em Brasília (15/16), seguiu no Rio (ainda hoje, Teatro João Caetano), amanhã, 21, no Guaíra e dias 23 e 24 em Porto Alegre - começa a merecer, afinal, uma justa cobertura, vão se conhecendo mais fatos de sua vida. Afinal, em 80 anos de vida, são mais de 60 de música, pois trocando ainda na infância o violino pelo piano, teve como primeiro mestre o professor Antonio D'Agostino, no conservatório Odeon e, ainda garoto de calças curtas ganhou seus primeiros trocados trabalhando como pianista do cinema mudo na Villa Crespo, bairro de Buenos Aires, onde nasceu em 2 de dezembro de 1905.
CARREIRA
Foi como pianista da orquestra do bandeonista Paquita Bernardo, no Café Iglesias, que Pugliesi iniciou sua carreira de tangueiro. Em 1925, ao falecer Roberto Goyeneche, o substituiu na regência do conjunto que se apresentava no café ABC - e, a partir de então, nunca mais parou.
Paralelamente ao trabalho de músico, nascia também o compositor e sua primeira obra - "Recuerdo", de 1924, já introduzia revolucionárias propostas musicais.
Como líder de sua orquestra começou a 10 de agosto de 1939, contratado do café Germinal. Já então mostrava sua extraordinária força de regente e arranjador.
Em 1948, Osvaldo Pugliesi participou do filme "Mis cinco hijos", de Oscar Caviglia, numa das poucas vezes em que chegou a ter sua imagem registrada pelo cinema.
Se devido as suas convicções políticas sofreu perseguições durante a ditadura de Peron e, mais especialmente, durante os regimes militares na Argentina - Pugliesi vem sendo, agora, com toda justiça, reconhecido pelo governo argentino. Em dezembro do ano passado foi recebido na Casa Rosada, sede do governo argentino, pelo presidente Raul Alfonsin, que fez questão de cumprimentá-lo pessoalmente pelo seu 80° aniversário. Como registrou a revista "Veja", nesta semana, Alfonsin deu então a Pugliesi o presente que o maestro vinha pedindo há anos - a cessão, por 50 anos, de um prédio do governo para que o pianista crie a Casa do Tango, destinada a recolher e preservar material sobre a história da música argentina. Os japoneses, que adoram Pugliesi (14 de seus lps foram editados naquele país) já doaram um piano Yamaha para a Casa do Tango. Dias depois de estar com Alfonsin, em 26 de dezembro, pela primeira vez na história do aristocrático Teatro Colon, de Buenos Aires, reverberaram os acordes do tango conduzidos pelo próprio Pugliesi no concerto em sua homenagem. Em apenas 2 horas, todos os 3.500 ingresos foram vendidos.
PUGLIESI NO BRASIL
Com sua orquestra de 12 figuras - e cujos membros tiveram dificuldades de aqui chegarem, devido a greve dos pilotos da Aerolineas Argentinas - o maestro Pugliesi, com seus 10 músicos e dois cantores, mostra o melhor do tango tradicional.
Embora com uma obra imensa gravada - a partir de 15 de julho de 1943 (quando fez na Odeon seu primeiro 78 rpm, com "El Rodeo" e "Farol"), autor de clássicos como "La Yumba", Pugliesi sempre preferiu divulgar a obra dos outros autores, razão pela qual, no programa que fez para sua temporada no Brasil incluiu apenas "La Yumba" e "Recuerdo", de sua autoria. Em compensação, teremos os grandes autores do tango, um gênero musical fascinante, riquíssimo e, ironicamente, pouco conhecido no Brasil através de seus melhores intérpretes. Tanto é que até hoje Osvaldo Pugliesi nunca teve seus discos aqui editados.
A EMI-Odeon promete, agora, suprir esta falha, lançando ao menos um de seus álbuns. O que já não será sem tempo.
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