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Aramis

Memórias em 35mm

Muita gente sem entnder o que acontece com o público de Curitiba. Apesar da fama de "Cidade Universitária", "Cidade Teste", "Alta Exigência do Publico"e outras bobagens, grandes espetáculos e ótimos filmes aqui têm fracassado, sem razão aparente. Hoje, pode-se alegar: falta de dinheiro! Mas não é de hoje que alguns filmes que fazem ótimas carreiras em várias cidades, acabam enterrando - como se diz na linguagem cinematografica - ao estrearem em nossos cinemas. xxx Há 21 anos passados, nos bons tempos do Cine Ópera, estréia uma elogiada fita de Michael Cacoyannis,primeiro cineasta grego a se tornar famoso intrnacionalmente: " Electra,A Vingadora ", com Irene Papas no auge de sua beleza mediterrânea e morena. Na primeira sessão vespertina do então elegante ( e hoje de saudosa memória ) cinema, nenhum espectador.Na segunda, quando operador e o porteiro pensavam em poder sair para jantar mais cedo, aparece um casal. Em respeito ao "distinto público" o filme foi exibido. Na primeira sessão da noite, novamente ninguém. O gerente já estava apagando as luzes quando alguns estudantes compraram os ingressos,e em algazarra, entraram no cinema 15 minutos depois de iniciado o filme, a policia teve que ser chamada : a garotada, sem entender a dimensão do belíssimo filme, não se limtaa aos gritos e vaias! Queria depredar a sala. No dia seguinte, Ismail Macedo, todo poderoso comandante de Orcopa, não teve dúvidas: tirou o filme de cartaz - visto, assim, por apenas 5 espectadores. xxx Maury Furtado ( 1940 -1964 ), inesquecivel poeta, amigo e então repórter de atuante sucursal de " Última Hora", não se conformou : foi entrevistar Ismail, procurou o presidente da Sociedade Helênica do Paraná, Theodocio Atherino ( que anos depois acabaria reitor da Universidade Federal ) e provocou um escândalo que obrigou o filme a retornar. Então, houve um grande sucesso e todas as vezes que foi reprisado em sessões especiais no cine de arte Riviera, que o idealismo de José Augusto Iwersen manteve, por anos, no antigo Colégio Santa Maria, lotava a sala. Ou seja : o filme teria ficado ignorado se não fosse a bronca que Maury Furtado deu atrvés da combativa "Última Hora". Mas uma das dividas que a cidade tem para com a memória deste tão admiravel poeta e jornalista, falecido no trágico 8 de dezembro do mais trágico ano de 1964, na praia de Caiobá. xxx No flash-back cinematografico, vamos par alguns anos antes: 11 de julho de 1957.Cine Palácio, confortável,com suas liminárias coloridas e cuidada com todo o carinho pelo velho Henrique Oliva e seu filho, Homero ( hoje dedicndo-se apenas ao seu haras ). A Warner Brothers havia imposto mil exigências para o lançamento de superprodução " Assim Caminha A Humanidade ( Giant ), realizado em 1955 por George Stevens, com base no romance de Edna Ferber que além de Rock Hudson e Elizabeth Taylor ( no auge e sua beleza ), estava superpromovido devido a morte de James Dean ( que aconteceu em setembro de 1955, mas os reflexos só chegaram ao Brasil dois anos depois ). xxx Assim, imgressos foram majorados mas a União Paranaense dos Estudantes, ativissima, não concordou. A exemplo do que havia ocorrido no Rio de Janeiro, pretendia promover "fila-boba" - ou seja estudantes permaneceriam na frente do cinema, impedindo que os espectadores dispostos a pagar o ingresso ( dificil de lembrar o preço, mas devia ser ao redor de Cr$ 5 ou Cr$ 10,00 ) pudessem aproximar-se das bilheterias. Só que a situação engrousou, vieram carros da PM, soldados, diabo! E discursos e mais discursos, que estendera, noite afora. O filme não estreou naquela quinta-feira,a copia foi devolvida e o dia seguinte, sem protestos, aos preços normal, era lançado um dos mais corajosos filmes denúncia sobre a televisão americana, " Um Rosto na Multidão " ( A Face in the Crowd ), que Elia Kazan realizou baseado no roteiro de Budd Schulberg, com Andy Griffith e Patricia Neal - ambos hoje desaparecidos da tela. " Um Rosto na Multidão" foi exibido sem sucesso - e nunca mais reprisado ( nem mesmo, ao que eu saiba, na tv ). xxx Alguns meses depois, "Giant" estreava no mesmo cine Palácio. xxx Entre os primeiros espectadores que pagaram ( os preços elevados ) estavam Rafael Iatauro, hoje conselheiro do Tribunal de Contas, e José Richa, hoje nosso governador. É ao menos o garante o astuto Zito Alves, gerente do cinema na época e que lamenta ter perdido as fotos dos protestos nos quais os jovens e virulentos Rafael e Richa,em cima do caminhão da UPE, faziam acalorados discursos contra "a exploração dos americanos e da empresa H.Oliva".Bons tempos, hein! xxx Mesmo cine Palácio, 1960, Uma noite de inverno, fria - daquelas que desestimularia até o conde Drácula a sair pelas ruas de nossa Curitiba se aqui fosse a Transilvânia. No cinema, toca o telefone e o gerente ( que não era o Zito ) atende. Bem, estamos aqui, o operador, a bilheteria, o porteiro e o guarda ( Nota: naquela época a Policia mantinha fiscalização nos cinemas ). Bem, e o público? Não há ninguem. Perplexo, diz: Tem certeza? Não ficou alguém da sessão da 20 horas? Ah! Talvez tenha ficado. Mas estou com medo de entrar na sala vazia.
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Nenhum
Nenhum
27/05/1984

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