Os Ritmos do Brasil com Carmelia Alves
Artigo de Aramis Millarch originalmente publicado em 10 de setembro de 1974
Para que se interessa pela nossa música popular não deixa de ser melancólico registrar - como aconteceu há algumas semanas - a presença de uma [intérprete] da dimensão de Carmélia Alves, fazendo shows em inferninhos de terceira categoria, cantando para um público insensível, incapaz de entender a dimensão desta artista que deveria merecer a produção de um show capaz de marcar a sua dimensão dentro de um certo período da nossa [música] popular, para ser apresentado em teatros e não fazer medíocres atuações em casas nortunas de indigna [freqüência]. Tal opinião pode ser comprovada ouvindo-se "Ritmos do [Brasil]" (RGE/Premier, 308.0005, agosto 74), em boa hora colocado no mercado brasileiro e onde Carmelia Alves demonstra que, aos 47 anos, 28 de carreira - começou no programa de calouros de Ary Barroso (1903-1964), na década de 40, se mantém uma cantora segura em seus ritmos, em especial no Baião da qual ela foi uma das (poucas) grandes vocalistas, mas também capaz de divulgar outros ritmos como Frevo, Maxixe e mesmo Carimbó. Evidentemente, "Ritmos do Brasil" está longe de se constituir num disco de dimensão folclórico/antropológica como é o caso, por exemplo, do "Canções da Minha Terra" com Ely Camargo (RCA, junho/74) ou as coleções (Música Popular do Nordeste/Música Popular do Centro-Oeste - Sudeste), editadas por Marcus Pereira. Mas é um lp de dignidade, produzido com cuidados por Toninho Palladino/Nelson Sampaio, com arranjos dos maestros José Toledo e Hecot Lagna Fietta e onde Carmelia [reúne] um [amplo] repertório - desde a embolada "Cabeça Inchada" e "Trepa no Coqueiro", seus grandes sucessos nos anos 50, num pot-pourri em que encontramos ainda "Asa Branca", "[Sabiá] Lá Na Gaiola", "Esta Noite Serenou", "Joazeiro", "Adeus, Adeus Morena", "Saia de Bico", "Que Nem Giló" etc. até uma "Oração de São Francisco", onde há um (dispensável) texto declamado pelo horoscopista Omar Cardoso.
De qualquer forma, como documentação do MPB e na valorização de figuras de nosso cancioneiro, "Ritmos do Brasil" com Carmelia Alves merece muito mais prestigiamento do que tanta [supérflua] [música] editada pelos nossos alienados record-men.
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No último suplemento da Odeon, um punhado de compactos interessantes, dos novos como Dalto ("Leila Ly" e "Flash Back", composições próprias) e veterana Doris Monteiro. Que reaparece (quando virá seu novo lp?) com um novo e bonito samba da dupla Cesar Costa Filho Walter Queiroz, "A Cigarra", trazendo no lado B, "Vontade É Coisa Que Dá e Passa" de Dora Lopes, Clayton e José Ricardo. Outro bom CS é o de Eduardo Gudin, mostrando suas novas composições: "Mordaça", com letra de Paulo Cesar Pinheiro e participação de Marcia e "É Melancolia", também com letra de Paulinho. Leny Andrade - que também merece um lp - vem com "Ingratidão" (Tom/Dito) e "Jazz do Nosso Amor" de Mutinho. Quem se lembra de João Dias, o cantor que em 1952, quando Francisco Alves morreu, foi anunciado como "herdeiro do Rei da Voz"? Pois João está gravando versões como "Eu Sei Que É Amor" (Vorrei che fosse amore) da Canfora/Amurri, numa versão de Romeu Nunes, complementada por "Adeus Amigo" (Adios Amigo) de Ray Girado, traduzido por Omar Navarro. Sobre os compactos do pessoal novo a gente fala depois, tá!
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