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Aramis

Um filme australiano e o "Jogo Duro" de Giorgetti

Seis filmes inéditos, da mais recente safra do cinema brasileiro, exibidos simultaneamente ao XVII Festival do Cinema Brasileiro de Gramado, registraram o ridículo bordeaux de 1.612 espectadores no Lido II. Lanterninha entre as nova capitais brasileiras escolhidas pela Embrafilme para a inédita experiência de mostrar nacionalmente os filmes em disputa ao Kikito no mais famoso festival do cinema brasileiro, Curitiba confirmou aquilo que há muito afirmamos: é tola a afirmação de que somos uma cidade de grande exigência cultural, cidade-teste para provar produtos culturais. Ao contrário: o curitibano só se anima a assistir algum filme se o mesmo chegar motivado de grande carga promocional. Daí sim, corre ao cinema. Prova disto é que nos seis primeiros dias, "Indiana Jones e a Última Cruzada" (Cine Condor) já teve 15.711 espectadores - motivo para permanecer no mínimo mais 7 semanas em cartaz. Aliás, um sucesso que apenas repete o que vem acontecendo há 45 dias, desde quando esta terceira aventura de Indiana, dirigida por Steven Spielberg, estreou nos Estados Unidos: já faturou mais de US$ 60 milhões e deverá ultrapassar os US$ 600 milhões no final - compensando em muito o investimento feito em sua realização (US$ 40 milhões). "Brinquedo Assassino", um dos piores filmes de horror explícito dos últimos anos, medíocre da primeira a última seqüência, entusiasma, entretanto, ao nosso público: depois de já ter ficado 4 semanas em exibição entre o Condor e o Lido II, ali devendo permanecer até o dia 29, quando estréia, nacionalmente, um novo desenho animado com muitos requintes, "De Volta ao Vale Encantado". xxx "A Princesa Xuxa e os Trapalhões", novo produto da linha de montagem que Renato Aragão e sua troupe vem realizando, semestralmente, e que tem como gerente o jovem José Alvarenga Júnior, está em cartaz nos Cines Lido I e Plaza. Com os Trapalhões e mais Xuxa - que, assim, preferiu a tranqüilidade do esquema de produção de Renato Aragão do que filmes autônomos (apesar das boas rendas obtidas por "Xuxa Contra o Baixo Astral"), este produto comercial, destinado a faixa infantil que adora os nomes mais populares da televisão, cumpre uma função até ideológica: ocupa um espaço nos cinemas que, em outro caso, seria reservado aos desenhos animados e comediotas dos estúdios de Walt Disney e assemelhados. Afinal, em época de férias é importante que haja programações de censura livre para as crianças, e Renato Aragão e Xuxa, hoje bilionários graças a empatia que conseguiram através do meio mais forte de comunicação - a televisão, aproveitam o subproduto de sua mídia, no caso o cinema na época das férias. Os filmes de Aragão seguem uma linha específica, não fugindo o esquema tradicional - como, no passado, se fazia com as chanchadas da Atlântida e, em São Paulo, Amâncio Mazzaropi, utilizava em suas comédias caipiras. Quando tentou dar um toque mais intelectualizado aos seus filmes - no caso, convocando Roberto Farias para roteirizar e dirigir a peça de Ariano Suassuna, "O Auto da Compadecida", o público reagiu mal: foi o filme de menor bilheteria. Portanto, Aragão exige que sua equipe faça exatamente aquilo que, dizem as bilheterias, o "seu" (sic) público quer. Mas convenhamos, que é triste ver uma novíssima geração receber um divertimento de tão baixo nível artístico. xxx Amor Australiano - O cinema [australiano] teve um boom há alguns anos mas esmoreceu. É verdade que seus diretores de maior fôlego acabaram emigrando para os Estados Unidos e fazendo boa carreira. Agora, inesperadamente, a distribuidora Alvorada nos traz um novo cineasta australiano, Michael Jenkins, em "Quando o Amor É mais Forte" (Cine Astor, 5 sessões). Ambientado em Sidney, 1942, é um drama sobre o relacionamento de um desertor americano, Rebel (Matt Dillon, ator revelado por Coppola em "Vidas sem Rumo" e "O Selvagem da Motocicleta") com uma cantora, Kathy (Debbie Byrne, nome de grande popularidade na Austrália), cujo marido está na frente de batalha. Michael Jenkins, desconhecido no Brasil, tem boa experiência na televisão e é definido como um autor de estilo por "suas longas tomadas cheias de ação" (sic). A verificar nesta semana de mínimas atrações. Boas Opções - Hollywood descobriu que gêmeos podem render na bilheteria: "Twins" (Irmãos Gêmeos) foi uma das melhores rendas da temporada e assim logo Jim Abrahams, um dos membros da trindade de amalucados diretores da série "Apertem os Cintos...", também partiu para o mesmo esquema: "Cuidado com as Gêmeas" (Big Bussiness) mostra o que acontece quando duas cantrizes - Lily Tomlin e Bette Midler - aparecem em papéis duplos. O filme oferece boas gargalhadas e está em cartaz no Bristol. Na linha de filmes de gêmeos, já se anuncia uma refilmagem de "Os Irmãos Corsos". Apesar da bilheteria desalentada dos filmes inéditos do Festival de Gramado, exibidos no Lido II, felizmente há duas produções nacionais que resistem "mesmo com todas as críticas negativas (e injustas), "Kuarup", de Ruy Guerra, tem seu público e continua em exibição no Cinema I. Um elenco de atores e atrizes expressivos, a bonita trilha sonora de Egberto Gismonti e o mergulho no Brasil descrito por Antônio Callado fazem com que "Kuarup" mereça ser visto. Claro que se esperava mais, mas assim mesmo é um filme digno e merecedor de atenção. Com um humor sintético, inspirado em Jacques Tati, a dupla de arquitetos-cineastas paulistas Isay Weinfeld e Márcio Kogan conseguiu bons momentos em "Fogo e Paixão", a produção rodada na cidade de São Paulo (com exceção de uma seqüência em Santos), no qual nomes famosos aparecem em curtíssimos personagens (Paulo Autran, atualmente em Curitiba, ensaiando "Galileu Galilei" aparece tão rapidamente que alguns nem notam sua presença), Giulia Gam, a ninfeta-projeção do cinema brasileiro, está linda numa composição em que lembra a Monalisa. O curitibano Mauro Alice fez a montagem desta comédia diferente, que acompanha um grupo de turistas num sight seeing pela capital paulista. Em terceira semana de exibição no Cine Ritz. Também em terceira semana, o denso "Minha Adorável Lavanderia" (My Beautiful Laundrette), 1985, de Sidney Frears ("Ligações Perigosas"), que recebeu o Tucano de Ouro no III FestRio. Abordando os conflitos entre imigrantes paquistaneses em Londres, com relações homossexuais, "My Beautiful Laundrette" é um filme de vigor, representativo do novo e inquieto cinema que se faz na Inglaterra da era Tatcher. E no Luz, inesperadamente, eis que chega "Jogo Duro", que Ugo Giorgetti realizou há quatro anos, disputou Gramado (sem obter premiações), mas teve seus méritos reconhecidos nos festivais de Brasília e Natal e foi levado ao Exterior. Agora, consagrado com 6 Kikitos que "Festa" recebeu em Gramado, no último sábado, (inclusive o de melhor filme), Ugo Giorgetti tem, finalmente, "Jogo Duro" programado em Curitiba. Chico Alves, oportunista como sempre, esperou até agora para exibir este filme que já mereceria ter sido lançado há mais de um ano. "Jogo Duro" é, a exemplo de "Festa", um filme huis clos, com ação concentrada em torno de poucos personagens - a exemplo de "Festa", também dropouts (marginalizados da sociedade capitalista) e numa ação introspectiva. Jessy James - o nome é uma autogozação deste ator de pornoproduções da Boca do Lixo - faz o papel central, ao lado de Cininha de Paula. Mas, em rápidas aparições, temos Antônio Fagundes e Cleyde Yaconis - ela irmã de Cacilda Becker, cujo 20º aniversário de morte transcorreu na semana passada. "Jogo Duro" é, sem favor, o lançamento mais interessante da semana. LEGENDA FOTO 1 - Sean Connery e Harrison Ford em "Indiana Jones e a Última Cruzada": recorde de público. LEGENDA FOTO 2 - Giulia Gam é a Monalisa, numa ponta rapidíssima em "Fogo e Paixão" (Cine Ritz).
Texto de Aramis Millarch, publicado originalmente em:
Estado do Paraná
Almanaque
Cinema
8
23/06/1989

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